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Olga Curado

OPINIÃO

Texto em que o autor apresenta e defende suas ideias e opiniões, a partir da interpretação de fatos e dados.

Bolsonaro vira jacaré, tenta, mas não convence arrependidos

Jair Bolsonaro durante participação no "JN" - Reprodução/TV Globo
Jair Bolsonaro durante participação no "JN" Imagem: Reprodução/TV Globo

Colunista do UOL

22/08/2022 22h51

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Se alguém virou jacaré no Brasil foi o ex-capitão na sua entrevista ao Jornal Nacional. Vacina não faz ninguém virar jacaré. Fica a dúvida se presidente da República que não toma e desestimula a ciência como resposta à pandemia não vira ele mesmo jacaré.

O ex-capitão é o ex-capitão. Muita dificuldade em se expressar além da conversa de padaria.

Mas deixa o vácuo na ambiguidade com que se refere ao respeito ao resultado das eleições, "se as eleições forem limpas". Deixa uma margem de manobra para contestar o resultado que lhe será desfavorável e convoca as Forças Armadas como fonte de sustentação do processo, referindo-se ao encontro programado entre o presidente do TSE, ministro Alexandre de Moraes, e o ministro da Defesa.

Se pudesse apostar, diria que o ex-capitão vai correr da raia de entrevistas ou debates e sabatinas. Nem o mais ardoroso defensor do candidato à reeleição vai encontrar uma razão para ele se mostrar ao venerável público.

Nada de novo. Apenas um jejum de palavrões. A mesma limitação vocabular e a repetição de falas já ditas e desmentidas. Não faltou oxigênio em Manaus. O Brasil foi um sucesso de pandemia. Não tem incêndio e devastação na Amazônia. Deu o Pix ao país. Negociou fertilizantes com Putin.

A tentativa de ser bonzinho, porém, demonstrou que o candidato à reeleição não atualizou o próprio repertório. Na argumentação e na organização lógica do discurso ficou devendo.

A fala do atual presidente provoca vergonha alheia, comparando os incêndios na Amazônia e os incêndios na Europa. A autocombustão defendida pelo ex-capitão demonstra, além do desconhecimento sobre fenômenos naturais, o funcionamento dos órgãos de fiscalização como o Ibama. A defesa de desmatadores e dos equipamentos utilizados, e que não há "destruidores de floresta" - mentira, segundo ele.

Além de Rivotril - o esforço concentrado para amansar a si mesmo - o candidato se beneficiaria de uma intensivão de fonoaudiologia, porque a dificuldade de organizar o raciocínio se junta ainda à própria articulação das palavras. E poderia se beneficiar de uma consulta com dermatologista, ou talvez alergista. Evidentemente talvez se beneficiasse de outros apoios profissionais. Não é o caso de aprofundar nas recomendações.

A linguagem não verbal mostrou uma pessoa tentando se controlar, jogando a cabeça para trás - com furor de fera ferida que não encontra a saída, mas se beneficia da própria raiva - os pés cruzados embaixo da mesa ensaiando uma corrida para fora.

Foi de dar dó. Não do entrevistado. Dos eleitores, do Brasil que elegeu aquela pessoa para ocupar o cargo mais importante do país. Tanto pelas limitações cognitivas quanto pelo seu tamanho como político. A desarticulação mental só permite que ele se conecte com aqueles que estão dentro de um mesmo mundo imaginário.

Tinha treinado que Centrão é exemplo de prática democrática - ora direis - nem o poeta para arranjar uma fala tão desconectada da realidade. A tentativa de criar a realidade paralela.

O que se viu foi mais do mesmo, com palavrões editados e apropriação de uma verdade pessoal. Só dele.

Se tem mais voto ou menos voto? Os arrependidos que votaram no ex-capitão em 2018, na credulidade de propostas oferecidas na campanha, ficaram sabendo que têm motivos, de sobra, para se arrepender. Esses votos não voltam.