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Olga Curado

REPORTAGEM

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O Império contra-ataca: Congresso ensaia derrubar veto do STF às emendas

Colunista do UOL

09/11/2021 18h37Atualizada em 09/11/2021 20h09

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No mundo do imponderável tudo pode acontecer.

No fogareiro da criatividade parlamentar, está sendo cozida uma alternativa para a derrota infligida pelo STF (Supremo Tribunal Federal) nos despachos obscuros do dinheiro público feitos com a batuta do presidente da Câmara dos Deputados, Arthur Lira, na forma de emendas parlamentares. O nome do prato em preparo é PDL (Projeto de Decreto Legislativo).

Na prática, funcionaria assim: a Câmara dos Deputados e o Senado Federal votam, numa sessão conjunta, proposta para sustar decisão do Poder Judiciário, alegando que houve exorbitância na sua decisão. Isso para explicar que a ministra Rosa Weber e nenhum togado pode discutir o que o Lira define como sendo atribuição específica do Legislativo: a normatização das emendas parlamentares.

O mesmo argumento, distribuído pelo Lira para enfrentar de corpo e alma o STF, está sendo cozido em fogo adequado - na pressa de ver a sua PEC (Proposta de Emenda Constitucional) da reeleição ser aprovada. Mas não contava com o Novo, com o seu destaque ao artigo 167, que, vitorioso no plenário, impede o furo no teto de gastos, que faz parte dos sonhos bilionários das emendas de relator.

O tal PDL - que nos acuda o santo protetor das siglas - já foi utilizado pelo Congresso para conter a sanha do Executivo. Um exemplo é o PDL que derrubou o decreto do capitão sobre flexibilização do porte de armas.

Nunca antes na história desse país houve um PDL para neutralizar deliberações do Judiciário. Mas, dizem os feiticeiros do subclero, haveria uma primeira vez.

A votação, mais simples que a requerida para uma PEC - de novo a sigla - que exige maioria absoluta da Câmara, em dois turnos, e do Senado, parece mamão com açúcar para os arquitetos do fura-teto, agora, ressalve-se, contidos por 5 votos no plenário da Câmara.

A solução do PDL, considerada radical, e nem por isso descartada, teria um atalho: a criação de mais um RP2, no lugar do RP9. A conversa cifrada é como tramitam na obscuridade os recursos públicos nas mãos de suas excelências. Os RP são os resultados primários que, no orçamento, identificam as emendas parlamentares. No popular, é quanto de dinheiro público vai para a mão de cada deputado fazer benemerência de oportunidade no seu reduto eleitoral.

Ocorre que hoje, pela criatividade de Lira, o tal orçamento secreto - invisível para quem não percorre os descaminhos de uma linguagem orçamentária esotérica - está contido na tal emenda de relator, o RP9.

Funciona assim: todo dinheiro do orçamento destinado para emendas parlamentares era antes dividido em dois grupos - uma parte em emendas do relator, que o Congresso gerencia, e outra em emendas aprovadas pelas comissões temáticas e de bancada, que eram gerenciadas pelo Executivo.

Lira unificou o guichê. Tudo virou emenda de relator. Deputado e deputada, senador e senadora, não precisam fazer romaria no Executivo para liberação de recursos. Quem cuida é o Lira. Não tem mais o guichê na Secretaria de Governo. E disso ele não abre mão.

Se agora não pode furar o teto, tem duas saídas para o governo do capitão, digo, do Lira. Os deputados e deputadas cedem alguns milhões de suas emendas para gerar caixa para o Bolsa Família do capitão. E, claro, para evitar constrangimentos aos nobres deputados e deputadas, tentar manter no escondidinho o quanto cada um recebe, impedindo que seja conhecido para quem vai o rico dinheiro do povo brasileiro. E tem o tal PDL. Ou o governo arranja outra fonte de recursos para pagar o Bolsa Família.

Se é difícil entender, mais difícil é explicar.

O Lira que o diga.