O STF deve intervir para reduzir as mortes pela polícia no Rio de Janeiro?
Uma boa encrenca jurídica tramita no Supremo Tribunal Federal. Acusado de judicializar a política ao tomar decisões sobre temas não apreciados pelo Congresso Nacional _ como no reconhecimento da união homoafetiva ou na autorização de interrupção da gravidez de feto anencéfalo _ deve o STF romper outra barreira e cobrar padrões de política de segurança dos governos estaduais em defesa da vida dos cidadãos?
Termina nesta quinta-feira, dia 12, o prazo que o ministro Edson Fachin concedeu ao governador do Rio de Janeiro, Wilson Witzel (PSC), para que se manifeste sobre duas ações ajuizadas por PSOL e PSB que o acusam de "estimular o conflito armado" e "expor moradores de áreas conflagradas a profundas violações de seus direitos fundamentais".
Por meio da chamada Arguição de Descumprimento de Preceito Fundamental, os partidos pediram no STF, por exemplo, a suspensão de decretos que permitem o uso de helicópteros como plataformas de tiros em operações policiais e a expedição mandados de busca e apreensão coletivos e genéricos.
Pleiteiam ainda que o STF determine ao governo do Rio que, em 90 dias, apresente plano para a redução da letalidade policial e para o controle de violações de direitos humanos pelas forças de segurança fluminenses. Tal plano deve conter "medidas objetivas, cronogramas específicos e previsão dos recursos necessários para a sua implementação".
No despacho em que pede a manifestação de Witzel, Fachin cita afirmação do relator especial da ONU sobre Execuções Extrajudiciais, Sumárias ou Arbitrárias, Philip Alston: "As execuções extrajudiciais [no Brasil] são generalizadas. Quase nenhuma medida foi tomada para resolver o grave problema de confrontos no exercício das atividades policiais, ou para reduzir o alto número dos chamados autos de resistência. Boa parte dos homicídios ainda nunca é investigada de maneira significativa".
Em sua defesa, Witzel reafirmará que cumpre a Constituição ao liderar a repressão ao crime organizado, ao tráfico de drogas, ao roubo de cargas e ao que chama de "terrorismo urbano". Refutará ainda que seu discurso sobre segurança pública sirva de estímulo à violência e reclamará de que proibir sua manifestação a respeito da criminalidade seria censura.
Os dados mais recentes sobre a insegurança pública no Rio revelam que a polícia matou 18% mais de janeiro a outubro deste ano (1.546 pessoas) do que no mesmo período do ano passado (1.310).
A queda de 20,9% do número de homicídios dolosos no Estado _ celebrada pelo governador _ torna mais grave a participação oficial nas estatísticas de letalidade. Em 2018, as forças do Estado foram responsáveis por 22% das 5.733 mortes registradas de janeiro a outubro. Em 2019, os policiais já respondem por 30,8% destas mortes. Nas circunscrições de 12 delegacias do Rio, este percentual passa dos 50%.
Se Fachin aceitar as demandas de PSB e PSOL, tomará medida inédita de intervenção direta na questão da insegurança pública. Se recusar, sua decisão poderá ser lida como validadora da política de Witzel de "atirar na cabecinha". De tão polêmica, qualquer que seja a decisão final de Fachin, deve provocar recurso para a manifestação dos 11 ministros do STF em plenário. E o tamanho da encrenca só vai aumentar.
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