Raul Juste Lores

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Opinião

Um balanço da gestão Ricardo Nunes, que concorreu sem oposição

Ricardo Nunes não vai demolir o Minhocão. Nem transformá-lo em parque. O prefeito prestes a se reeleger não deve parar de construir piscinões de concreto em áreas alagáveis em vez de parques esponja, ressuscitando córregos canalizados. Não deve conseguir controlar, nem reduzir o número de moradores em situação de rua.

Ao contrário dos grandes prefeitos pelo mundo, até o paulistano atento não vai se lembrar de uma única iniciativa poderosa do alcaide para reduzir o número de carros em circulação, poluindo o irrespirável ar de São Paulo. Ao contrário: como um legítimo malufista de 1970, esbanjou em asfalto.

Mesmo assim, Nunes deve ganhar fácil a eleição de domingo. Pois Nunes está na prefeitura há 45 meses. A oposição descobriu que a prefeitura existe há dois meses. Não dá pra culpar apenas a bagunça frenética promovida por Pablo Marçal. Na campanha do segundo turno, a enferrujada oposição continuou usando o cardápio retórico de temporadas passadas.

O MINISTÉRIO DE NUNES

E olha que o prefeito é bem frágil. Entregou entre 2021 e o final de agosto meras 10.348 unidades habitacionais, um número ainda inferior às gestões Kassab, Haddad e Bruno (que já tinham decepcionado muito nessa área, nunca superando as 13 mil por gestão, em contraste com as 40 mil que todos prometem a cada quatro anos). Nunes nem pode culpar o antecessor de não ter deixado nada engatilhado: é do mesmo grupo político que chegou à prefeitura com Doria em 2017.

O terreno do prédio que desabou no Largo do Paissandu, em 1º de maio de 2018, continua vazio. A prefeitura ainda não conseguiu colocar de pé um projeto habitacional para honrar a causa das vítimas do lugar. O secretário municipal da Habitação é o deputado federal e pastor da Igreja Universal Milton Vieira, que mora em São José dos Campos. Sua agenda oficial é tão vazia que deve estar morrendo de tédio no cargo. A notícia mais recente de alguma atividade em seu site oficial é de outubro de 2023.

Nunes nunca conseguiu ter um secretariado com nomes ministeriáveis, na linha das gestões Eduardo Paes, Marta Suplicy ou José Serra. Suas pastas principais são comandadas por semianônimos. Quatro secretários de Nunes concorreram a vereador, com campanhas riquíssimas. E nenhum conseguiu se eleger. Em termos de secretariado, só não foi pior que Bruno Covas, que nomeou amigos de balada, academia ou da juventude tucana, com currículos magrinhos, mas de confiança total. E ninguém ligou. Nem oposição, nem a mídia paulistana. As redações são lotadas de militantes pró-Boulos, mas que não fizeram reportagens, nem se debruçaram sobre a política municipal nos anos sem campanha. Não conhecem o nome de um único secretário municipal, do mesmo jeito que desconheciam o significado de Operação Urbana Água Branca. Em termos de ignorância sobre a própria cidade, a imprensa paulistana tem nível Pablo Marçal. Nunes deve agradecer a eles.

O CENTRO ANDA DE LADO

A melhoria do Centro, promessa de 10 entre 10 prefeitos dos últimos 48 anos em São Paulo, continua a se arrastar. Tirando as pequenas bolhas hipsters de sempre, boa parte do Centro continua a definhar, do Glicério ao Largo São Francisco, da Duque de Caxias aos calçadões do Centro Novo. O Parque Dom Pedro continua como zona de guerra.

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Os progressos surgiram mais pela iniciativa privada, com menos de 20 retrofits, comércios, casas de shows e prédios novos. De quem se arrisca a apostar em um futuro incerto. A prefeitura continuou tímida. Da reforma dos calçadões ao novo Anhangabaú, as entregas são meia-boca. Incluindo as medíocres entregas do Arouche, o Adoniran Barbosa-baby na esquina da Ipiranga com a São João, o "mirante" da Praça Roosevelt. Mas como a oposição poderia fazer essa distinção se, em sua retórica, todo empresário é malvadão e só o que é estatal presta?

A riquíssima Secretaria de Cultura de Nunes não conseguiu dar um mísero uso aos estatizados Cine Marrocos e Art Palacio. Faltou dinheiro ou projeto para concluir o restauro da Vila Itororó. Conseguiu fazer a Virada Cultural mais cara do mundo (R$ 60 milhões, em um efêmero fim de semana), com artistas de cachês gordos, mas atraindo público mais modesto que qualquer amador junta na Paulista aos domingos. Mas, tirando as viradas de Bethania e Caetano, nossos iluminados não dão a mínima para política cultural fora dos editais. A Virada Cultural é até um resumo da prefeitura hoje: dinheiro sobrando, escassez de ideias, impacto nulo.

Nunes jogou parado por quase quatro anos. O eleitorado nem o conhecia. Mas, de Marçal a Boulos, os adversários só apareceram às vésperas da campanha eleitoral. Foi um governo sem oposição (vide as votações mais importantes na Câmara Municipal no quadriênio, quando a bancada do PT votou muitas vezes com Milton Leite). Não acompanhou? Você é parte do problema, então.

Quando a licitação para a concessão de ônibus exigiu dos concorrentes a posse de diversas garagens na cidade, para impedir qualquer desafio ao oligopólio de sempre, onde estava Marçal? Quando os desastres urbanísticos do Minha Casa Minha Vida em Pirituba foram aprovados e construídos, onde estava Boulos? Onde estavam quando o Residencial Espanha foi autorizado em área de proteção ambiental, na região dos mananciais? Ter um Ministério das Cidades nas mãos do Centrão não ajuda a demonstrar que a esquerda tenha qualquer interesse em urbanismo. Passar pano para corrupção, rachadinhas ou conluio com empreiteiras tira a veracidade da indignação com a máfia das creches. Para o eleitor, é tudo igual.

Na última gestão petista que os paulistanos viveram, as filas da saúde e das creches se multiplicaram, a educação foi entregue a Gabriel Chalita e a habitação ao então PP de Maluf. Até contratos de varrição dos parques municipais não foram renovados por esquecimento. O então estatal estádio do Pacaembu exigia "comprovante de residência na região" para quem frequentasse sua piscina gratuita. Como conhecedor da máquina, Nunes não tem brilhantismo, mas não sucateou os serviços públicos como na última gestão petista. Quem não usa nenhum serviço municipal não deve ter mesmo memória da cidade em 2016. E se surpreendeu com os efeitos do último Plano Diretor por não acompanhar nada.

Nossa oposição afônica às vésperas da eleição passou anos preocupada apenas com temas nacionais. Ou internacionais. Muitos doadores de Boulos, Tabata e Marçal acompanham apaixonadamente a disputa Kamala-Trump, mas jamais pisaram no Tatuapé ou na Freguesia do Ó. Não fazem ideia do que seja o projeto da ponte de Pirituba. Não é só o californiano que descobre dolorosamente que o morador do Kentucky não pensa como ele.

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Nunes, assim, deve ser reeleito sem esforço. O que essa não disputa diz sobre a maior cidade do Brasil? Que não temos gestores ou visionários melhores que Nunes? Nem uma oposição com um mínimo plano que supere o ex-vereador de Interlagos? E que depois de ser derrotada com diferença de 20 pontos para um debilitado Covas, a esquerda não tinha ninguém mais competitivo que Boulos? Apesar dos lamentos chorosos de última hora, a elite paulistana, da artística à econômica, tem pouquíssimo a contribuir. Disputando com alienados e cúmplices, Nunes não tem como perder.

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Texto em que o autor apresenta e defende suas ideias e opiniões, a partir da interpretação de fatos e dados.

** Este texto não reflete, necessariamente, a opinião do UOL.

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