A praga do Oxxo, o pobre Ibirapuera e a dureza para escolher vereador
Tem candidato a vereador do PSB, socialista, querendo proibir shows no Ibirapuera "porque incomoda os vizinhos". Nunca deve ter ouvido falar dos shows no Central Park novaiorquino ou no Hyde Park de Londres. Tem candidata da Rede Sustentabilidade usando Alto de Pinheiros como exemplo "verde". Um bairro com zoneamento que proíbe comércio e onde tudo só se faz de carro (e mora pouquíssima gente e só de alta renda, também por desejo dos moradores).
Há os supostos liberais que só falam de aborto e transgêneros (temas nada municipais), adeptos de intervencionismo legal quando convém ao neobeatismo. A candidata governista que se orgulha das capengas Viradas Culturais recentes. E candidata do Novo que só reclama de postes porque os fios de alta tensão incomodam. Sobre o breu noturno na maior parte da metrópole, nem um piu.
Ah, e muitos, muitos deles, zangados com a exploração comercial do Ibirapuera. Não entram nesses radares seletivos os parques que continuam na mão da prefeitura, mas sem um único banheiro funcionando, como o histórico Parque Dom Pedro.
Detalhe: todos esses candidatos não são pastores mal-intencionados, ex-coronéis prometendo porrada, nem pertencem às dinastias que exploram a zona sul de São Paulo. Essas prioridades são da bolha mais educada da cidade. Você acha que está um horror escolher prefeito? É que você ainda não se deteve nos candidatos à Câmara Municipal. Parece que nenhum jamais estudou Jane Jacobs, Jaime Lerner, Ed Glaeser, Jan Gehl.
Apesar de meses e meses de vídeos patrocinados e engraçadinhos em todas as redes sociais (haja orçamento de campanha!), o urbanista Nabil Bonduki, relator do último Plano Diretor, só chamou atenção ao prometer criar leis contra as lojas de conveniência Oxxo. Que ele chama de "praga". Para ele, o Oxxo estaria matando os pequenos comércios e tem comida ruim. Sabemos que o que mata pequenos comércios é aluguel caro, competição do delivery, poucos pedestres e muito shopping center, mas para quê estudar a raiz do problema?
Se Nabil estivesse realmente interessado em combater a má alimentação do paulistano, começaria pelos quiosques das estações de metrô e dos grandes terminais rodoviários da cidade. Nesses locais, milhões de pessoas transitam, com fome depois do trabalho, só tendo frituras e ultraprocessados como opção de alimento. Mas nossos Vila Madaleners mal pisam no terminal Tietê, no Dom Pedro ou no da Barra Funda. Será que o próximo alvo serão os carrinhos que servem café com leite quente na saída dos trens da CPTM? Parece que eles vendem produtos que são gordura pura. Vai combater padarias, supermercados, bombonieres dos cinemas de shopping??
Na Vila Madalena, Pinheiros ou Perdizes, os abonados sempre terão outras opções anti-Oxxo. Cafés gourmet da Etiópia, saladas a 100 reais em imóveis alugados prestes a ser tombados. Porém o estudante, o porteiro, o motorista da Uber, a faxineira, só conseguem pagar pelo café nos Oxxo no perímetro da zona oeste reclamona.
(Se você quer se fazer o favor de conhecer necessidades fora do mundo privilegiado, postei um vídeo esta semana em meu canal no YouTube sobre uma área em profunda transformação. Mais de 18 mil apartamentos novos, com pouquíssima infraestrutura pública e a mais de uma hora de distância de qualquer grande polo de empregos na cidade. Os candidatos a vereador que não têm uma bandeira ainda poderiam ir lá conversar)
Diante da repercussão muito negativa de combater essas lojas de conveniência sem nenhum glamour, mas que empregam, são 24 horas e não têm vagas de garagem, Nabil já disse que vai repensar a proposta. Ou seja, não passou dez minutos refletindo sobre a mais nova vilã da cidade. Aliás, falando da "praga" do Oxxo (que, de fato, não tem suco de cupuaçu no cardápio, nem espuma de pupunha): Tóquio tem mais lojas da rede 7-Eleven (2.800 delas) e Londres tem mais lojas de conveniência da Tesco (320), do que a cidade de São Paulo tem Oxxo. Nabil critica os "mexicanos" do Oxxo, mas esquece de citar a sócia da rede de conveniência, a brasileiríssima Raízen/Cosan, do empresário Rubens Ometto, amigão de Lula, de seu partido.
Históricos por conveniência
No leque de hipocrisias, também tem candidata do PSB (pois é, o partido da Tabata Amaral reúne alguns dos maiores defensores de privilégios da bolha) que quer o tombamento de mais de 700 imóveis de Pinheiros. De todo aquele casario colonial, capelas barrocas e edifícios modernistas projetados por Artigas e Rino Levi na Henrique Schaumann e na Teodoro Sampaio (mentira, os Pinheirers jamais deram bola para arquitetura ou história até a chegada de mais prédios, tão feios quanto os em que eles moram).
Lucraram com a valorização dos imóveis pela chegada de quatro estações de metrô, pagas pelo ICMS de todos os paulistanos; adoraram ver as ruas dos Pinheiros e Cardeal Arcoverde deixarem de ser, em apenas uma década, dois corredores de inferninhos, mas queriam que o bairro continuasse "bucólico". Palavra usada por candidatos que moram em prédios de 20 andares nos Jardins, mas que brincam de defender a Paraty que não existe por lá.
Não darei publicidade para gente que não merece, mas o pior de todos postulantes à vereança é o neobolsonarista que participou da maior baixaria desta campanha até agora para ter alguns segundos de fama ao lado de Pablo Marçal. Provavelmente será eleito vereador, mas sua reputação é irrecuperável.
Como escolher?
- Recebo diariamente um pedido, de amigos a seguidores no meu Instagram. "Me indica um vereador?", perguntam, querendo terceirizar o trabalho de ser um munícipe ativo. É claro que não vou isentar ninguém de exercer sua cidadania. Mas há algumas lições de casa obrigatórias:
- O candidato a vereador teria condições de redigir leis, votá-las, sobre desenho urbano, zoneamento, revisões do Plano Diretor, orçamento municipal? Ou ele/ela só é bem intencionado e, a um mês da eleição, não estudou.
- Seu candidato tem uma única causa na vida e você jamais o/a ouviu falar sobre a cidade? Fuja! O candidato que recolhe cães abandonados na rua, a candidata trans que sofreu muito, o guru que ensina como enriquecer, o apresentador de TV que pede mais segurança podem parecer muito bacanas, mas não dá para esperar um ou dois anos de mandato até ele ou ela aprender o que é uma Câmara Municipal. Valorizar apenas boas intenções ou um perfil inédito sem medir os resultados é trágico para as políticas públicas. Celso Pitta e Dilma Rousseff são exemplos inesquecíveis de que representatividade sem talento só causa prejuízo.
- Cheque agora o site oficial das candidaturas do TSE para ver quem são os maiores doadores de seu candidato, quanto ele está gastando e a sua declaração de bens. Se o patrimônio (ou a ausência dele) é suspeito, desconfie.
Por último
Você se lembra em quem votou para vereador há quatro anos? Acompanhou como ele votou nesses anos? Foi um vereador muito ativo? Se seu vereador foi uma decepção, hora de trocar. Se você não acompanhou, você é a maior parte do problema.
Opinião
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