Raul Juste Lores

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Opinião

Emergência respiratória exige medidas insanas, mas a dirigência é bundona

Imagina que louco seria se tivéssemos um prefeito rápido e corajoso que, deixando a campanha para reeleição um pouco de lado, agisse para dar alguma resposta à emergência respiratória na cidade? Que decretasse um rodízio mais draconiano até semana que vem, tirando 50% dos carros e caminhões da cidade até a qualidade do ar melhorar? Que obrigasse todas as camionetes, utilitários e 4x4 ficarem na garagem até segunda ordem?

Mais pirado seria um governador determinando que todas as fábricas do cinturão do ABC parassem a produção por cinco ou seis dias? Pontos facultativos, fechar escolas por uma semana, já estariam em pauta.

Ou que insano um presidente —ainda zero ligado a qualquer pauta do século 21— que determinasse que as Forças Armadas (as três) atuassem já no combate a todas as queimadas? E que colocasse toda a Polícia Federal para descobrir se as queimadas no interior do estado, especialmente em Ribeirão Preto, têm a ver com o crime organizado, aquele da sigla de três letrinhas?

Tudo isso só aparenta ser desvario, devaneio ou radicalidade ambiental no alienado Brasil de 2024. Mas essa é a maior guerra que o país deveria enfrentar desde a Guerra do Paraguai, há quase 160 anos.

Medidas adotadas mundo afora

Madri, Paris, Londres e Lisboa têm determinado, regularmente, a retirada de veículos de grandes áreas das cidades por conta da qualidade do ar. Com pouquíssima oposição, seja de direita ou de esquerda.

Queimadas e incêndios nas matas, intencionais ou não, são o novo normal na Califórnia e na Europa Ocidental. Várias medidas dos três primeiros parágrafos muito loucos deste texto são decretadas nessas democracias. Jamais se contentariam com um aviãozinho com mangueiras sem pontaria tentando conter incêndios.

Alguém acredita que os palácios do Planalto ou dos Bandeirantes contataram alguma autoridade na Califórnia ou na Alemanha para aprender as melhores práticas de choque para conter incêndios?

Eu já fui testemunha de líderes que não titubearam em adotar medidas impopulares. Quando o metrô de Nova York foi inundado pela tempestade Sandy, o prefeito nova-iorquino Michael Bloomberg (empresário, liberal, pró-mercado) não hesitou em proibir a entrada, na ilha de Manhattan, de carros que não tivessem quatro passageiros (sim, 4!) a bordo. O carro que viesse do Brooklyn, do Queens, do Bronx ou de New Jersey carregando apenas um passageiro folgado tinha que voltar antes de atravessar qualquer ponte —a polícia mandava voltar.

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Imagina um governador e um prefeito corajosos o suficiente para fazer isso HOJE nas Marginais, no Minhocão, na 23 de Maio e na Bandeirantes (para citar alguns exemplos pedagógicos)?

Os candidatos em São Paulo

Gente adulta percebe quando a fumaça entra pelas narinas. Mas é impossível visualizar um Ricardo Nunes fazendo qualquer pronunciamento de urgência à sociedade.

Guilherme Boulos já afirmou que não implementaria nenhuma redução de velocidades "porque a sociedade rejeitou". O líder que segue, não lidera (Boulos já se tornou Doria antes de chegar ao poder).

Tabata ainda continua postando vídeos fofos sobre o namorado, a mãe, a família e sua extremamente explorada e longa carreira.

Nada, nada mesmo, pode se esperar das campanhas de Marçal ou Datena. Estamos muito ferrados e merecemos.

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Governantes são reflexos da sociedade

Quando morei em Pequim, há mais de dez anos, a ditadura chinesa não hesitava em mandar paralisar todas as fábricas por três dias quando o ar ficava ruim demais. Durante os meses do verão, ar condicionado só era autorizado a partir dos 27 ºC. O presidente e o primeiro-ministro apareciam de manga curta em atividades oficiais e mandavam que todo o mandarinato comunista seguisse o exemplo.

Imagina o caretérrimo governo federal aparecendo de manga curta? Não dá pra imaginar. Até nossos progressistas são conservadores. Quem passar meia hora conversando com Rui Costa, o ex-governador da Bahia que é braço direito de Lula, verá que o desenvolvimento a qualquer custo não é pauta apenas de Ricardo Salles.

Nenhum governo consegue deixar de refletir o que é a sociedade. No meu canal de YouTube chamado São Paulo nas Alturas, onde faço reportagens sobre cidades e urbanismo, meus vídeos sobre a inexistência de parques na periferia, de Heliópolis a Paraisópolis, são fracassos de audiência. Mas quando falo de tretas no Parque do Povo, Jardins ou Pinheiros, a audiência explode. Isso, entre gente "educada".

Lembro vividamente de muitos empresários do circuito Jardim América-Morumbi defendendo em abril de 2020, no auge da pandemia de covid, que o confinamento fosse abrandado porque "a economia precisava girar". Enquanto, é claro, levavam suas famílias e se refugiavam em condomínios fechados fora de São Paulo ou até na Suíça.

Hoje, debatem com muito mais paixão o debate Trump-Kamala do que sobre qualquer plataforma de políticas públicas para São Paulo.

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A ansiedade climática já se impôs, cada ano é mais quente que o anterior, cada garoa é mais curta que a do ano passado, mas temos uma dirigência despreparada para lidar com qualquer tema.

Opinião

Texto em que o autor apresenta e defende suas ideias e opiniões, a partir da interpretação de fatos e dados.

** Este texto não reflete, necessariamente, a opinião do UOL.

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