O alívio de Bolsonaro
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No dia da sua grande fala, Sergio Moro, o ministro símbolo do combate à corrupção, surgiu na TV com o semblante amargurado dos que se dobram a um engano. O "engano", nesse caso, atendia pelo nome de Jair Messias Bolsonaro. Com um discurso quase sem emoção nem adjetivos, porque ciente de que sua autoridade dispensava as duas coisas, o ex-juiz apresentou ao país o presidente que ele havia conhecido no governo: um mandatário desprovido de grandeza e disposto ao arbítrio para defender interesses pessoais e familiares. A fala de Moro chocou a plateia, constrangeu generais, emudeceu bolsonaristas e provocou uma inédita debandada de seguidores do presidente nas redes sociais.
O depoimento divulgado ontem foi o contrário de tudo isso. Não que Moro tenha recuado um milímetro do que disse na sua "grande fala". Pelo contrário, ao repeti-la ponto a ponto, acrescentando a ela detalhes e provas, mostrou que nada escondeu no dia em que acusou Bolsonaro na TV. Com o cálculo de praxe, cuidou para proteger a si mesmo de acusações criminais ("nunca disse que o presidente havia cometido um crime" — se dissesse estaria afirmando que fechou os olhos para um ilícito, definição para o crime de prevaricação) e presenteou os seus inquisidores com um completo roteiro de investigação infalível. Mesmo assim, frustrou boa parte da plateia que esperava ver sair do depoimento do ex-juiz a "bala de prata" que acertaria Bolsonaro na testa.
Impossível, já que o duelo mal começou.
Mas, para alívio do presidente, agora ele se dará no terreno bem mais árido da investigação policial, que nem de longe poderá repetir o impacto da primeira e momentosa fala de Moro.
Por isso, ontem, no Palácio do Planalto, o clima era de alívio. A avaliação de assessores era de que, no plano da batalha por corações e mentes, o pior passou. Quem tinha de debandar no episódio já debandou e, diante dos seus apoiadores fieis, o presidente poderá manter o discurso de que nunca, jamais, em tempo algum tentou interferir em investigações da Polícia Federal - Moro "exagerou' e ele, presidente, "apenas atuou para melhorar o desempenho da polícia".
O ex-capitão sabe que tudo o que a sua turma precisa para continuar ao seu lado é de um galhinho retórico onde possa se agarrar. Mesmo porque, para o núcleo duro de apoiadores do presidente, o inimigo principal nunca foi a corrupção, mas a esquerda e tudo o que ela representa (aos olhos dos bolsonaristas-raiz: a "ideologia de gênero", a ameaça a Deus e a família, a defesa das drogas, do aborto, dos bandidos e do "globalismo").
O presidente está convencido de que, ao menos diante da sua claque, sobreviveu a Moro. A partir de agora, a guerra é de advogados.
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