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Thaís Oyama

Bolsonaro dá cavalo-de-pau na Coronavac movido pelo medo da concorrência

Colunista do UOL

16/12/2020 13h15

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Parecia outro presidente.

No discurso de hoje de manhã em que anunciou o que o governo chamou de "plano de vacinação contra a covid-19", Jair Bolsonaro usou belas palavras e magnânimas expressões, todas ausentes de seu repertório tradicional.

Defendeu a "a união" para combater "algo que nos aflige há meses" (a "gripezinha"), ensaiou um mea culpa ao dizer que alguns podem ter "extrapolado ou mesmo exagerado no afã" de combater a pandemia e incluiu-se na corrente dos que, "irmanados", lutam para que depois da "tempestade venha a bonança".

Ao citar "os 27 governadores com um só propósito", Bolsonaro não deixou de fora nem mesmo o inimigo João Doria, o governador tucano por ele mencionado como "o da calça apertada" em discurso feito ontem a comerciantes do Ceagesp, em São Paulo.

Bolsonaro já vinha sinalizando que iria dobrar-se à inclusão no Plano Nacional de Imunização da Coronavac, a aposta do governo de São Paulo e alternativa de imunizante mais à mão para os brasileiros.

O presidente sinalizou a mudança tática quando seu ministro da Saúde e também o secretário executivo da pasta passaram a chamar a "vachina" — como se referem os bolsonaristas nas redes sociais ao imunizante de patente chinesa— de "vacina do Butantan".

Coronavac dobra esquina em direção ao Brasil: oportunidade à vista

O secretário Élcio Franco, número 2 da Saúde, fez ainda questão de lembrar em vídeo gravado e divulgado no YouTube anteontem que o instituto ligado ao governo de São Paulo fornece mais de 70% das vacinas distribuídas à população pelo governo federal.

A guinada de Bolsonaro acontece às vésperas da iminente aprovação da Coronavac pela agência de vigilância sanitária da China. A "Anvisa chinesa" é uma das quatro referências globais para a avaliação de novos medicamentos — o que, pela lei brasileira, a torna capaz de validar o uso de uma vacina em território nacional mesmo sem o exame da Anvisa aqui no Brasil.

Caso mantivesse o pé fincado na recusa em comprar a "vacina do Doria", Bolsonaro se arriscaria a ver ruir sua popularidade a partir do momento em que as imagens de paulistas sendo vacinados começassem a circular pelo país.

Bolsonaro não cedeu à razão, cedeu à política.

O presidente que discursou hoje de manhã só parecia outro, mas continua o mesmo.