Texto em que o autor apresenta e defende suas ideias e opiniões, a partir da interpretação de fatos e dados.
Bolsonaro é candidato a réu por abrir porteiras para genocídio yanomami
Receba os novos posts desta coluna no seu e-mail
O termo genocídio foi criado pelo jurista e humanista polaco Raphael Lemkin, de origem hebreia.
Por dominar mais de dez línguas, Lemkin juntou a palavra grega yévoc à latina cidio. E a final latina é bem conhecida no Brasil, como homicídio e feminicídio.
O vocábulo grego significa etnia, raça, família. Passa a ideia de grupo protegido pelo direito natural. Pode, como alertou o próprio Lemkin, englobar até uma nação quando o objetivo é destruir todos as pessoas: os nacionais. Quanto ao latino "cídio" quer dizer assassinato.
A junção aponta para o extermínio, para a destruição intencional, ativa ou omissiva, odiosa, a grupos específicos ou contra o povo de uma nação. Lemkin colocou o termo genocídio no seu livro Axis Rule Occupied Europe, publicado em 1944.
Quando da criação do Tribunal de Nuremberg (Tribunal Penal Militar), para os crimes do nazismo, adotou-se o conceito de Lemkin como elemento tipificador do crime de genocídio.
Em 1946, no processo contra o militar alemão Hermann Goring, ex-primeiro ministro prussiano e líder nazista do Partido Nacional Socialista, ocorreu a condenação por genocídio, a vitimar o povo judeu, hebreu.
Convém recordar que os nazistas focaram nos judeus. Mas, também, eliminaram, dentro do absurdo conceito de superioridade racial, negros, ciganos, homossexuais, comunistas e religiosos.
A luta de Lemkin não parou na contribuição pós-Segunda Guerra e com as cortes de Nuremberg e Tóquio. Logrou ele envolver o direito internacional e o genocídio foi reconhecido como crime internacional.
No Brasil, e como vem sendo noticiado e mostrado, parte do povo yanomami foi vítima de genocídio. No particular, o ministro da Justiça, Flávio Dino, bem caracterizou os fatos acontecidos em Roraima como genocídio yanomami.
Na ONU, em dezembro de 1948, restou aprovada a Convenção sobre Prevenção e Punição dos Crimes de Genocídio. E houve participação fundamental de Lemkin, aliás, dez vezes indicado para o Nobel da Paz.
Como estabeleceu a essa convenção, subscrita pelo Brasil, o genocídio pode ser consumado em tempo de paz ou de guerra. Sem perder de vista as mortes em terra yanomami e à luz do direito internacional e da lei brasileira 2889, de outubro de 1956 (governo Juscelino Kubitschek), a responsabilização criminal pode recair no próprio Estado, também por omissão e dolo eventual do governante e ministros.
Vários governos de presidentes brasileiros descuidaram do trato do povo yanomami. Uma vergonha. Mas, e sob a ótica jurídica, o genocídio contra a etnia yanomami consumou-se no governo Bolsonaro.
Pelo então ministro do Meio Ambiente, Ricardo Salles, foram abertas as porteiras para a selvageria ambiental e as desumanidades. Bolsonaro incentivou o garimpo e, seguindo os passos do chefe, o seu ministro do Gabinete de Segurança Institucional, general Augusto Heleno, baixou ato administrativo, de discutível legalidade, a autorizar garimpos.
O garimpo ilegal em terras yanomami despejou mercúrio em abundância. Contaminou os rios e, ato contínuo, as águas bebidas pelas crianças e adultos yanomamis. Peixes morreram, a pesca e a alimentação ficaram prejudicadas.
Os garimpeiros, invasores e desmatadores trouxeram e difundiram as doenças. Os desmatamentos afugentaram os animais caçados para alimentação. Aportou a desnutrição. Médicos e remédios pararam de chegar à área indígena. E até um posto de saúde foi incendiado pelos invasores.
Num trágico resumo, as porteiras foram abertas pelo governo em reunião ministerial, presente Bolsonaro e o estrategista do mal Ricardo Salles. Partiu daí, o inicial sinal verde para os crimes de genocídios contra os yanomamis.
Volto ao direito internacional e à Convenção das Nações Unidas, de dezembro de 1948. Ela enumera, no seu segundo artigo, as condutas a tipificar os crimes de genocídio, com intenção de destruir um grupo nacional, étnico, social ou religioso.
Abro parêntese, os yanomamis representam uma etnia indígena. E a intenção de destruir está bem caracterizada, com a conduta condescendente do governo Bolsonaro. O presente dolo eventual, aquele onde se assume o risco do resultado, salta aos olhos.
Prossigo na enumeração de algumas outras condutas anunciadas pelo segundo artigo da Convenção da ONU e que calçam como luva ao casos dos yanomamis:
- "atentado grave à integridade física ou mental de membros do grupo";
- "submissão deliberada do grupo a condições de existência que acarretarão a sua destruição física, total ou parcial".
Os países subscritores da Convenção da ONU, e o Brasil foi um deles, cuidaram de editar as suas leis.
Todas praticamente copiaram a convenção, na tipificação dos crimes. Em especial o seu artigo terceiro: "serão punidos os crimes de genocídio, acordos para o seu conhecimento, o incitamento direto, a cumplicidade ao genocídio".
O previsto na convenção foi usado por dois tribunais internacionais, nos genocídios na ex-Iugoslávia e Ruanda.
Pela Convenção de Roma, de julho de 1998, foi criado um permanente Tribunal Penal Internacional (TPI). Ficaram fora da sua jurisdição apenas EUA, China, Índia, Israel, Filipinas, Turquia e Sri Lanka.
O TPI tem competência para processar e julgar os crimes de genocídio, de guerra, contra humanidade e de agressões internacionais.
A tragédia dos yanomamis comove internacionalmente. E, não tenham dúvidas, o Ministério Público junto ao TPI não ficará de braços cruzados diante dos crimes de genocídios consumados em Roraima.
ID: {{comments.info.id}}
URL: {{comments.info.url}}
Ocorreu um erro ao carregar os comentários.
Por favor, tente novamente mais tarde.
{{comments.total}} Comentário
{{comments.total}} Comentários
Seja o primeiro a comentar
Essa discussão está encerrada
Não é possivel enviar novos comentários.
Essa área é exclusiva para você, assinante, ler e comentar.
Só assinantes do UOL podem comentar
Ainda não é assinante? Assine já.
Se você já é assinante do UOL, faça seu login.
O autor da mensagem, e não o UOL, é o responsável pelo comentário. Reserve um tempo para ler as Regras de Uso para comentários.