Wálter Maierovitch

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Opinião

STF x Congresso: o real motivo da queda de braço que envolve caso Marielle

Toda a cautela é pouca. Os senadores e deputados engolem em seco. Temem uma reação negativa da sociedade caso venham a estrilar no sentido de haver o ministro Alexandre de Moraes cassado a imunidade parlamentar prevista no artigo 53 da Constituição.

O artigo diz o seguinte, no seu parágrafo primeiro: " Desde a expedição do diploma, os membros do Congresso Nacional não poderão ser presos, salvo em flagrante de crime inafiançável".

Qualquer protesto quanto a ter ocorrido violação à imunidade, na avaliação dos congressistas, seria prejudicial à imagem do Legislativo.

Isso, frise-se, no momento em são apontados, depois de seis longos anos, os mandantes do assassinato de Marielle Franco. O corporativismo favorece o deputado federal Chiquinho Brazão, preso preventivamente por decisão de Moraes.

Chiquinho Brazão, atualmente sem partido político, é apontado como um dos mandantes, autores intelectuais, dos consumados assassinatos de Marielle Franco e de seu motorista, Anderson Gomes, e do tentado homicídio de Fernanda Chaves, assessora da vereadora.

Regra X exceção

O referido artigo 53 estabelece, como regra, a impossibilidade de prisão cautelar de deputados e senadores. Há apenas uma exceção: a hipótese de prisão em flagrante por crime inafiançável.

O crime imputado a Chiquinho Brazão é inafiançável. Só que a modalidade de prisão imposta não foi em flagrante delito. Trata-se de prisão preventiva.

Algemas e comunicação

Para piorar, dois outros "extras" irritam senadores e deputados.

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Primeiro: imagens e fotos da saída do avião revelam que Chiquinho Brazão foi algemado.

O próprio Supremo Tribunal Federal, segundo os parlamentares, legislou ilegitimamente sobre o uso de algemas. E, ao legislar, estabeleceu a regra de só admitir emprego de algemas quando necessário, o que não seria o caso de uso em Chiquinho Brazão.

Segundo: o STF enviou comunicação à Câmara a fim de deliberar sobre a manutenção ou não da prisão, equiparando a prisão em flagrante com a custódia cautelar.

A respeito, vale transcrever o artigo 53 supracitado e o seu parágrafo terceiro: " No caso de flagrante de crime inafiançável, os autos serão remetidos, dentre de vinte e quatro horas, à Casa respectiva, para que, pelo voto secreto da maioria de seus membros, resolva sobre a prisão e autoriza, ou não, a formação de culpa.

Na CCJ (Comissão de Constituição e Justiça) da Câmara, houve pedido de vista por três deputados. Nenhum invocou violação à imunidade parlamentar.

Todos sabem, diante do clamor público, o escândalo que representaria um parecer da CCJ pela soltura de Chiquinho Brazão.

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Quando da consumação dos covardes assassinatos, ele era vereador da Câmara Municipal do Rio de Janeiro. Na Câmara federal, não goza de prestígio. E, pela jurisprudência do STF, não conta com foro por prerrogativa de função. Mas Alexandre de Moraes, que recebeu o inquérito e o mantém no STF, entende o contrário.

Defender a imunidade a essa altura e para beneficiar Chiquinho Brazão representaria, volto a repetir, um pantagruélico desprestígio à Câmara. Em outras palavras, seria o popular "tiro no próprio pé".

A motivação de Moraes

Caso envolvesse um comum mortal sem imunidade, a decisão impositiva de prisão preventiva lançada por Moraes, custodiando preventivamente Chiquinho Brazão, o irmão Domingos Brazão e o delegado de polícia estadual Rivaldo Barbosa, não seria questionada. É que estão presentes os requisitos legais autorizadores da decretação da prisão preventiva. Prisões necessárias, portanto.

Embora Moraes tenha sustentado em livro, artigos e palestras a impossibilidade de prisão cautelar de parlamentares, salvo em flagrante de crime inafiançável, a sua decisão merece reflexão.

Efetivamente, a imunidade decorre, como o foro especial, da função. Deputados são órgãos do poder Legislativo. A imunidade é necessária e representa, numa democracia, uma garantia fundamental. Agora, não existe imunidade para matar, e a Constituição defende a vida.

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Como bem observa Moraes, os assassinatos não guardavam nenhuma correlação com a função e atividade parlamentar do então vereador Chiquinho Brazão.

Com efeito, a decisão de Moraes levanta polêmica silenciosa a respeito da imunidade, mas conta com rigor lógico e não destoa da Constituição..

Opinião

Texto em que o autor apresenta e defende suas ideias e opiniões, a partir da interpretação de fatos e dados.

** Este texto não reflete, necessariamente, a opinião do UOL.

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