Wálter Maierovitch

Wálter Maierovitch

Siga nas redes
Só para assinantesAssine UOL
Opinião

Com dois indiciamentos, Bolsonaro veste camisa de sete varas dos condenados

Giordano Bruno, frade dominicano, teólogo, poeta e matemático, foi condenado à morte na fogueira pela Inquisição romana por heresia. Uma de suas heresias foi não aceitar o dogma da trindade, do Deus uno e trino: pai, filho e espírito santo.

Como todos os condenados à morte na Inquisição, Bruno foi vestido, naquele 17 fevereiro de 1600, com uma longa camisa escura, cortada em pano rústico e com sete varas de cumprimento. A camisa era o único traje, a peça de realce do ritual. Uma vez vestida, só uma anistia de último momento salvaria o condenado.

Bolsonaro em camisa de sete varas

Com dois indiciamentos, a Polícia Judiciária federal acaba de colocar uma camisa de sete varas no ex-presidente Bolsonaro.

Das investigações, pode-se aportar às imputações formais, ou seja, aos indiciamentos.

Antes do indiciamento, existe apenas a figura do suspeito de autoria de crime. Com ele, passa a haver imputação de crime, indicação de pessoa certa e determinada como autor, coautor ou partícipe.

Os dois referidos inquéritos, joias e vacinas, vieram lotados de provas inconcussas da responsabilidade criminal de Bolsonaro. Até ele produziu prova contra si próprio. E as delações do ex-ajudante de ordens Mauro Cid, partícipe de todas as tramas delinquenciais, restou comprovada até pelo relato e pela foto tirada pelo seu próprio pai, um militar de patente de general.

Bolsonaro ficou nu e foi, usando uma imagem, vestido com uma camisa de sete varas. Isso aconteceu quando ele foi indiciado e, logo depois, quando a autoridade de Polícia Judiciária federal, a quem competiu a presidência do inquérito, respondeu, item por item e com provas induvidosas, àquilo que Bolsonaro relacionou como falhas e inconsistências.

Trocando em miúdos, o capitão Bolsonaro foi desnudado na investigação. Como está inelegível e prestes a ser processado e condenado, pode vestir a camisa de sete varas, reservada aos criminosos e aos condenados à morte política.

Repetindo. Depois do indiciamento e das precisas respostas aos questionamentos feitos pelo ex-presidente imputado, Bolsonaro pode ser visto como vestido numa camisa de sete varas para, no devido processo legal e sob o crivo do contraditório e da garantia de ampla defesa, ser conduzido a uma decisão condenatória.

Continua após a publicidade

Provas materiais, como por exemplo troca de conversas com registros telemáticos e recibos de venda e compra de joias no exterior, algumas delas transportadas em avião da FAB (Força Aérea Brasileira), serão jurisdicionalizadas (do inquérito para validade e confirmação processual). Bolsonaro, como se diz jocosamente nos tribunais italianos, estará "infarinato e frito", como bife à milanesa.

Recusa de remédio

Como sabe todo operador do direito, depois do indiciamento, passa a ter cabimento o uso do remédio constitucional chamado habeas corpus.

Bolsonaro falou aos quatro ventos e escreveu nas redes sociais que está sendo vítima de perseguição. Disse que não há justa causa para ele ser investigado e processado.

Mas Bolsonaro é uma espécie de doente que não quer fazer uso do remédio para a cura.

O habeas corpus é o único e eficaz remédio para indiciados trancarem inquéritos policiais e até processos criminais, pela ausência de justa causa, perseguição e inexistência de prova da autoria e materialidade delitivas.

Continua após a publicidade

Para Bolsonaro, só interessa fingir-se de vítima de arbitrariedades e abusos. Com isso, passa falsa imagem àqueles que ainda acreditam nele.

Porque sabe da legalidade dos atos oficiais e da presença de justa causa para ser imputado e até denunciado pelo Ministério Público, Bolsonaro prefere, para os da sua bolha, desvestir-se da camisa de sete varas e colocar-se em panos falsos de injustiçado, de perseguido.

Opinião

Texto em que o autor apresenta e defende suas ideias e opiniões, a partir da interpretação de fatos e dados.

** Este texto não reflete, necessariamente, a opinião do UOL.

Deixe seu comentário

Só para assinantes