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Wilson Levy

OPINIÃO

Texto em que o autor apresenta e defende suas ideias e opiniões, a partir da interpretação de fatos e dados.

Eventos climáticos, gerenciamento de risco e as cidades inteligentes

Vídeos mostram momento de deslizamento de terra em Ouro Preto (MG) - Reprodução/Twitter @eutiagomiranda
Vídeos mostram momento de deslizamento de terra em Ouro Preto (MG) Imagem: Reprodução/Twitter @eutiagomiranda

Colunista do UOL

14/01/2022 15h26

Entre o final de 2021 e o início de 2022, mais de 70 cidades na Bahia e 370 em Minas Gerais tiveram situação de emergência decretada em razão das chuvas torrenciais que atingiram os estados no período. Dezenas de pessoas morreram e mais de 1000 perderam suas casas.

Variações no regime de chuvas são comuns e podem ocorrer em razão de diversos fenômenos meteorológicos, em geral causados pela própria dinâmica da natureza. A ocorrência de eventos extremos, no entanto, tem relação direta com o aquecimento global, que acelera e radicaliza mudanças climáticas. Não resta dúvida que a ação humana é o seu principal gatilho.

De acordo com o relatório "Groundwell" do Banco Mundial, publicado em setembro de 2021, o número de refugiados climáticos - pessoas sujeitas a deslocamento forçado por consequência desses eventos - poderá chegar a 216 milhões de pessoas até 2050. Na América Latina, o número de potencialmente atingidos é de 17 milhões de pessoas.

Trata-se de um cenário dramático que impacta de maneira direta a vida das cidades, vitimando pessoas e gerando prejuízos econômicos incalculáveis. Seu enfrentamento impõe que as nações cumpram as metas planetárias de preservação ambiental, pactuadas em organismos internacionais.

Enquanto isso, é fundamental que o Poder Público estabeleça estratégias de redução dos efeitos catastróficos desses eventos. No Brasil, a Política Nacional de Proteção e Defesa Civil - PNPDEC, instituída pela Lei Federal nº 12.608/2012, estabelece as competências da União, dos Estados e dos Municípios e as premissas de sua atuação neste campo.

É um marco importante, que traz, entre outros, claro estímulo à regularização fundiária nos assentamentos informais em municípios com áreas suscetíveis à ocorrência de deslizamento. Ela não resolve, contudo, o desafio decorrente das grandes assimetrias regionais e locais que dificultam que cidades menores cumpram suas responsabilidades.

Enquanto os entraves institucionais persistem, diversas cidades têm apostado em formas de aliar a tecnologia à prevenção e alarme em situações de risco.

Na cidade do Rio de Janeiro, soluções baseadas em internet das coisas (IoT) estão na base do Centro de Operações (COR) que cuida da prevenção de inundações por meio de sensores espalhados em diversos locais do município. O COR permite identificar antecipadamente, por exemplo, os locais que serão afetados, de modo a viabilizar medidas de alerta e de apoio das equipes da Defesa Civil.

Em Campinas, no interior de São Paulo, um projeto do Centro de Pesquisa e Desenvolvimento em Telecomunicações (CPQD) que contou com financiamento do Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES) adota estratégia semelhante: estações meteorológicas e sensores de nível de rios permitem que o Poder Público se antecipe à ocorrência de desastres ambientais.

Para avançar, é preciso percorrer alguns passos. O primeiro é compreender a tecnologia como meio para se alcançar uma cidade inteligente, e não um fim em si mesmo. O segundo é ampliar o reconhecimento das universidades e centros de pesquisa como espaços de produção de inovação na forma de conhecimento aplicado à solução de problemas práticos, assegurando-lhes recursos para ampliar sua atuação.

Além desses, é preciso que se discuta mais e mais o lugar da inovação no âmbito das compras públicas. Muitas soluções consistentes para problemas urbanos são produzidas com base em software livre, que pode apresentar vantagens em relação às soluções proprietárias. A maneira como a aquisição de tais soluções será avaliada pelos órgãos de controle externo, notadamente os tribunais de contas, é decisiva para estimular a produção nacional no campo da inovação.

Wilson Levy é advogado, doutor em Direito Urbanístico pela PUC-SP com pós-doc em Urbanismo pela Universidade Presbiteriana Mackenzie e em Direito pela Universidade do Estado do Rio de Janeiro. É diretor do programa de pós-graduação em Cidades Inteligentes e Sustentáveis da Universidade Nove de Julho (UNINOVE). E-mail: wilsonlevy@gmail.com