Texto em que o autor apresenta e defende suas ideias e opiniões, a partir da interpretação de fatos e dados.
A agenda ESG e as cidades inteligentes
Um dos temas do momento é a agenda ESG e sua aplicação em diversas cadeias produtivas. Seu conceito remete à adoção de três pilares - na língua inglesa, environmental, social and governance - como eixos estruturantes para o planejamento e para a atuação de empresas e organizações.
Tais eixos, por sua vez, estão ancorados nas metas da Agenda 2030 da Organização das Nações Unidas (ONU), documento que é fruto de uma pactuação global em prol da erradicação da pobreza, proteção do meio ambiente e do clima e promoção da paz e da prosperidade, e que se materializa na forma de 17 Objetivos do Desenvolvimento Sustentável (ODS).
A implantação da agenda ESG pressupõe a incorporação de compromissos de responsabilidade social, ambiental e de governança que produza impacto tanto no interior das corporações quanto em sua existência no mundo.
Não basta, nesse sentido, que a organização da empresa incorpore a separação de itens recicláveis do lixo comum ou que ela adote políticas de igualdade em relação a gênero entre seus colaboradores, por exemplo. É preciso que ela passe a exigir condutas assim de seus fornecedores e parceiros, e que pondere o impacto que gera no mundo e na vida das pessoas.
Há muitos benefícios para quem agrega tais valores. Nos dias de hoje, preocupações ambientais e sociais não despertam a atenção apenas de nichos de consumidores que buscam experiências mais sustentáveis nos produtos e serviços que adquirem. O acesso a crédito e a negociação de papeis na Bolsa de Valores também tem olhado a questão de uma outra maneira.
É o caso, por exemplo, do Banco de Desenvolvimento de Minas Gerais, que, de acordo com o jornal Folha de S. Paulo, em notícia de 29 de janeiro de 2022, teve 60% dos financiamentos feitos em 2021 vinculados a algum dos 17 ODS. É crescente, ainda, o número de produtos vinculados à agenda ESG nas principais corretoras de valores do país.
Este é um tema que precisa entrar de vez no radar de gestores públicos ligados ao planejamento urbano e agentes privados do mercado imobiliário, pois é na cidade que serão vividos os principais benefícios da agenda ESG. Esse, aliás, é um dos temas que está no conhecimento de fronteira das cidades inteligentes que, como se sabe, não são somente cidades tecnológicas.
O conteúdo do ODS nº 11 é, nesse sentido, o melhor roteiro. Tal ODS visa "Tornar as cidades e os assentamentos humanos inclusivos, seguros, resilientes e sustentáveis", a partir das seguintes metas: garantir o acesso à habitação segura, serviços básicos e urbanização de favelas; melhorar a segurança viária, com prioridade para o transporte público de massa e o transporte ativo, focalizando, ainda, na acessibilidade; proteger o patrimônio cultural e natural; mitigar os efeitos dos desastres naturais; reduzir o impacto ambiental e melhorar a qualidade do ar e a gestão dos resíduos sólidos; proporcionar acesso a espaços públicos seguros, inclusivos, acessíveis e verdes, em especial para os mais vulneráveis; fortalecer a integração e o planejamento de áreas metropolitanas; investir em medidas para adaptação e resiliência a mudanças climáticas; ampliar o apoio técnico e financeiro a construções sustentáveis.
Esse esforço não pode, no entanto, incorrer no equívoco de enxergar o espaço urbano como um conjunto aleatório de prédios e equipamentos públicos que, se adotarem práticas sustentáveis, conduzirão a uma cidade mais sustentável e inteligente. É por isso que o olhar do planejamento urbano deve incorporar as premissas da agenda ESG quando a cidade for definir (ou revisar) as leis que instituem o Plano Diretor e a lei de zoneamento.
Mais do que isso, é preciso ampliar os espaços de diálogo e convergência em prol desse objetivo comum. Incorporadores imobiliários devem entender que sua atuação importa em assumir um dever que é acima de tudo ético: cooperar com o Estado e a sociedade para construir uma cidade mais amigável e generosa para as pessoas, para os encontros e para os negócios.
Cidades insustentáveis, nas quais se demora até 15 minutos para o cidadão sair da garagem de seu prédio, não interessam a ninguém: nem a quem vive seus perrengues, nem para quem deseja nela se estabelecer e prosperar.
Wilson Levy é advogado, doutor em Direito Urbanístico pela PUC-SP com pós-doc em Urbanismo pela Universidade Presbiteriana Mackenzie e em Direito pela Universidade do Estado do Rio de Janeiro. É diretor do programa de pós-graduação em Cidades Inteligentes e Sustentáveis da Universidade Nove de Julho (UNINOVE). E-mail: wilsonlevy@gmail.com
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