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Nunca houve fraude comprovada nas eleições com urna eletrônica no Brasil

Do UOL, em São Paulo

08/07/2021 15h48Atualizada em 20/07/2022 21h26

Nunca houve fraude comprovada nas eleições brasileiras desde a adoção das urnas eletrônicas, ao contrário do que voltou a insinuar hoje, sem base em qualquer prova ou indício, o presidente Jair Bolsonaro (sem partido).

Em declarações publicadas no YouTube pelo canal Foco do Brasil, Bolsonaro disse a apoiadores em Brasília que se as eleições de 2022 não forem "limpas", elas não acontecerão. A fala do presidente foi em resposta a uma pessoa não identificada que afirmou: "Se não tiver roubo nas urnas, a maioria está com o senhor." Pesquisas de intenção de voto recentes têm mostrado Bolsonaro atrás do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) na preferência do eleitorado.

O presidente defende a implementação do voto impresso — ou seja, da impressão de um comprovante do voto nas urnas eletrônicas — e costuma colocar em dúvida a lisura das eleições no Brasil caso não haja a mudança de sistema. No entanto, as suspeitas são infundadas. Até hoje, nunca houve qualquer prova ou mesmo denúncia relevante de fraude nas urnas eletrônicas.

Como mostrou reportagem do UOL publicada em junho, o histórico de votações desde a adoção da urna eletrônica —usada parcialmente em 1996 e 1998, e integralmente a partir de 2000— mostra que o sistema é confiável.

A constatação não é apenas do TSE (Tribunal Superior Eleitoral), que organiza as eleições, mas também de investigações do MPE (Ministério Público Eleitoral) e de estudos matemáticos e estatísticos independentes. Mesmo especialistas em segurança que defendem a adoção do voto impresso e o aprimoramento do voto eletrônico reconheceram ao UOL que ataques bem-sucedidos às urnas brasileiras são improváveis e dependeriam de uma combinação muito específica de fatores para ocorrerem.

Histórico de contestações sem provas

Além de levantar suspeitas infundadas sobre supostas fraudes no futuro, o presidente também alega há mais de um ano, sem apresentar qualquer prova ou indício, que as eleições de 2018 foram fraudadas. O próprio governo federal já admitiu que não possui provas das acusações feitas pelo presidente.

Em setembro daquele ano, antes mesmo do pleito que o elegeu, Bolsonaro disse — sem mostrar nenhuma prova — que existia um programa capaz de inserir votos a favor do PT, partido do candidato rival Fernando Haddad. O TSE determinou que o vídeo fosse retirado do ar.

No mês passado, Bolsonaro também contestou o resultado da eleição presidencial de 2014 e afirmou que o candidato do PSDB, o hoje deputado federal Aécio Neves, teria sido eleito em vez de Dilma Rousseff (PT). O tucano questionou o resultado da disputa na época, mas uma auditoria feita pelo próprio PSDB constatou que não houve fraude.

Aécio disse hoje ao UOL não acreditar que tenha havido fraude em 2014, mas defendeu a modernização do sistema eleitoral.

Em entrevista à Folha publicada hoje, o então candidato a vice na chapa com Aécio, Aloysio Nunes Ferreira, rebateu as suspeitas levantadas por Bolsonaro e afirmou: "A eleição foi limpa, nós perdemos porque faltou voto".

Em entrevista à BBC Brasil, o cientista político do Insper Carlos Melo avaliou as declarações de Bolsonaro como uma forma de contestar o resultado das eleições de forma antecipada. As falas do chefe do Executivo brasileiro seguem a cartilha do ex-presidente dos Estados Unidos, Donald Trump, que colocou a eleição norte-americana de 2020 em suspeição antes mesmo de ela acontecer.

Voto impresso e pesquisas eleitorais

A insistência de Bolsonaro em levantar suspeitas infundadas de fraude eleitoral ocorre no momento em que o presidente aparece atrás de Lula em pesquisas de intenção de voto divulgadas nos últimos três meses: Datafolha, em maio; Ipec, em junho; e CNT/MDA e PoderData/Band, em julho. Na semana passada, o presidente disse — mais uma vez sem provas — que uma eleição sem voto impresso favoreceria o petista.

Em paralelo, a Câmara discute uma PEC (Projeto de Emenda à Constituição), que torna o voto impresso obrigatório. O projeto é da deputada federal Bia Kicis (PSL-DF), aliada do presidente.

Políticos bolsonaristas pleiteiam a adoção integral do sistema já para 2022. Para eles, só o registro do voto em papel garantiria a auditoria da eleição.

Em junho, o TSE afirmou ao UOL que o voto no Brasil é auditável antes, durante e depois das eleições:

  • Antes: "os sistemas da urna eletrônica são devidamente assinados e lacrados com a participação de todos os interessados"
  • Durante: "dezenas de urnas são sorteadas em todos os estados para um teste de integridade no dia da votação"
  • Depois: "é possível conferir os boletins impressos pelas urnas ao final da votação com a totalização divulgada pelo TSE". Nessa última etapa, disse o tribunal, qualquer cidadão pode fazer a própria conferência.

Críticos do voto impresso alegam que a mudança pode impor dificuldades a pessoas com deficiência visual e analfabetos, além de colocar em risco o sigilo do voto. Outra questão apontada é a possibilidade de falha na impressão, como o travamento do papel.

As falhas nas impressoras ocorreram em um teste feito em 2002 pelo TSE no Distrito Federal e em 150 pequenas cidades. A adoção do voto impresso foi considerada mal-sucedida pelos técnicos do tribunal na ocasião, tanto pelo problema com as impressões, como pela quantidade de filas provocadas durante a votação.

Mesmo que a medida seja aprovada pelo Congresso este ano, tanto o TSE como especialistas consultados pelo UOL consideram inviável que o modelo seja adotado integralmente a tempo das próximas eleições. O presidente do TSE, ministro Luís Roberto Barroso, alega que a compra de impressoras terá um custo elevado (R$ 2 bilhões) e exige uma licitação complexa.

"A introdução do voto impresso seria uma solução desnecessária para um problema que não existe, com um aumento relevante de riscos", afirmou Barroso no mês passado.

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