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Sérgio Cabral é preso pela Operação Lava Jato

Do UOL, no Rio

17/11/2016 06h35Atualizada em 17/11/2016 14h49

O ex-governador do Rio de Janeiro Sérgio Cabral (PMDB) foi preso pela Polícia Federal na manhã desta quinta-feira (17) em seu apartamento, no Leblon, zona sul. Ele é alvo de dois mandados de prisão, sendo um deles expedido pelo juiz Sérgio Moro, responsável pela Operação Lava Jato na primeira instância. Esta foi a 37ª fase da operação que investiga um esquema de corrupção na Petrobras.

O outro mandado é do juiz Marcelo Bretas, da 7ª Vara Criminal do Rio, e faz parte da Operação Calicute, um desdobramento da Operação Lava Jato, deflagrada pela PF junto com o MPF (Ministério Público Federal) e a Receita Federal. Segundo as investigações, Cabral liderava um grupo de pessoas que recebiam propina de empreiteiras que tinham contratos com o governo estadual. Uma das obras investigadas é a reforma no estádio do Maracanã. O prejuízo estimado é de R$ 224 milhões, de acordo com o MPF.

A mulher de Cabral e ex-primeira dama, Adriana Ancelmo, também foi levada para a Polícia Federal, a fim de cumprir mandado de condução coercitiva (quando a pessoa é encaminhada para prestar esclarecimentos em sede policial). O casal deixou o prédio onde mora sob gritos de "bandido" e "ladrão", por volta das 7h. Os policiais federais usaram spray de pimenta para dispersar um grupo de manifestantes, que se colocou em frente ao carro da PF.

O UOL entrou em contato com a assessoria de imprensa do ex-governador, que ainda não se pronunciou. A reportagem também ligou para o celular de um advogado de Cabral, mas ninguém atendeu. Foram enviadas mensagens para esse celular assim como e-mails para o advogado, mas nenhuma resposta foi enviada. O UOL continua tentando ouvir a defesa do ex-governador.

Cabral é o segundo ex-governador do Rio preso em menos 24 horas. Ontem, a PF prendeu Anthony Garotinho (PR) em uma investigação sobre esquema de compra de votos em Campos dos Goytacazes (RJ) comandada pelo Ministério Público Eleitoral.

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Segundo a PF, 230 policiais federais cumprem 38 mandados de busca e apreensão, dez mandados de prisão --sendo oito preventivos (sem prazo) e dois temporários (com prazo determinado)-- e 14 mandados de condução coercitiva expedidos pela 7ª Vara Federal Criminal do Rio de Janeiro. As dez ordens de prisão decretadas pela Justiça fluminense foram cumpridas.

Além disso, mais 14 mandados de busca e apreensão, dois mandados de prisão preventiva e um mandado de prisão temporária foram expedidos pela 13ª Vara Federal de Curitiba, de Moro.

O MPF informou que a Justiça ainda determinou o sequestro e arresto de bens de Cabral e outras 11 pessoas físicas e 41 pessoas jurídicas.

São investigados os crimes de pertencimento a organização criminosa, corrupção passiva, corrupção ativa, lavagem de dinheiro, entre outros. Também participam das diligências dezenove procuradores do MPF e cinco auditores fiscais da Receita Federal.

Segundo o MPF, a partir de delações de executivos das empreiteiras Andrade Gutierrez e Carioca Engenharia descobriu-se um esquema de pagamento de propina a Cabral e a pessoas do seu círculo para que fossem garantidos contratos de obras com o governo do Rio.

"As investigações apontam para a prática de corrupção na contratação de diversas obras conduzidas no governo de Sérgio Cabral, entre elas, a reforma do Maracanã para receber a Copa de 2014, o denominado PAC Favelas e o Arco Metropolitano, financiadas ou custeadas com recursos federais", diz o MPF.

Durante a prisão de Sérgio Cabral, muitas pessoas se reuniram na porta do edifício do ex-governador - Kevin David/A7 Press/Estadão Conteúdo - Kevin David/A7 Press/Estadão Conteúdo
Durante a prisão de Cabral, pessoas se reuniram na porta do edifício do ex-governador
Imagem: Kevin David/A7 Press/Estadão Conteúdo

No primeiro semestre, executivos da empreiteira Andrade Gutierrez relataram em delação premiada o acerto de propinas sobre obras de urbanização do conjunto de favelas de Manguinhos, além da cobrança de um percentual na obra de reforma do estádio do Maracanã.

De acordo com os ex-executivos, Cabral teria recebido R$ 60 milhões de propina na reforma do estádio que recebeu a final da Copa. O consórcio da obra teria sido definido em 2009, antes mesmo da licitação. O custo foi de R$ 1,2 bilhão.

Os investigadores constataram que outras empreiteiras também podem ter participado do esquema durante a gestão Cabral. "Foi identificado que integrantes da organização criminosa de Sérgio Cabral amealharam e lavaram fortuna imensa, inclusive mediante a aquisição de bens de luxo, assim como a prestação de serviços de consultoria fictícios", apontou o MPF.

 O nome da operação (Calicute) é uma referência às tormentas enfrentadas pelo navegador português e descobridor do Brasil, Pedro Álvares Cabral, a caminho das Índias.

Na mira da Lava Jato

Em Curitiba, o desdobramento das investigações da Operação Lava Jato revelaram, de acordo com o MPF, que houve pagamento de propina diretamente a Cabral em razão de um contrato firmado entre a Petrobras e a empreiteira Andrade Gutierrez. O acordo diz respeito a obras de terraplanagem no Comperj (Complexo Petroquímico do Rio).

Cabral teria recebido, entre os anos de 2007 e 2011, ao menos R$ 2,7 milhões da empreiteira Andrade Gutierrez "por meio de entregas de dinheiro em espécie", informou o MPF, com repasses realizados por executivos da empresa para emissários do ex-governador, inclusive na sede da empreiteira em São Paulo.

Além disso, os investigadores descobriram evidências do crime de lavagem de dinheiro. Apenas dois investigados, entre os anos de 2009 e 2015, teriam efetuado pagamentos em espécie, de diversos produtos e serviços, em valores que se aproximam de R$ 1 milhão. O crime de lavagem prevê pena entre três e dez anos de reclusão; o crime de corrupção, entre dois e 12 anos, e o crime de integrar organização criminosa, pena entre três e oito anos.

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Agentes da PF foram à casa de Cabral para prendê-lo
Imagem: Kevin David/A7 Press/Estadão Conteúdo

Quem é Sérgio Cabral

Liderança do PMDB no Rio, Cabral foi eleito governador do Estado em 2006 e reeleito quatro anos depois. Antes, havia sido deputado estadual --chegou a presidir a Assembleia Legislativa do Rio-- e senador fluminense.

Ganhou força à frente do Executivo principalmente pela implementação das UPPs (Unidades de Polícia Pacificadora), a partir de 2008, projeto que consiste na ocupação policial das comunidades dominadas pelo tráfico de drogas. O programa cresceu e se expandiu, mas começou a enfrentar problemas na metade do segundo do mandato do ex-governador.

Além do constante cenário de crise na segurança pública, Cabral teve sua imagem seriamente afetada por sucessivas denúncias e escândalos de corrupção. A relação dele com empresários do ramo da construção civil, sobretudo o dono da Delta Construções, Fernando Cavendish, foi investigada --em julho desse ano, o empreiteiro acabou sendo preso pela Polícia Federal na Operação Saqueador.

Outro duro golpe que arranhou a reputação de Cabral foi o sumiço do pedreiro Amarildo de Souza, em 2013, após ter sido levado por PMs da UPP Rocinha, favela da zona sul carioca, à base da unidade. O desparecimento e morte presumida do morador da comunidade virou uma bandeira das manifestações contra a gestão do político.

Em 2014, seu último ano de mandato, Cabral renunciou ao cargo a fim de abrir espaço para o então vice, Luiz Fernando Pezão (PMDB). Na época, seu nome chegou a ser cogitado pra disputar a Presidência.

Apesar da impopularidade do antecessor, Pezão foi reeleito governador do Rio em 2014, ano no qual o Estado já enfrentava reflexos da crise financeira que chegaria ao ápice nos anos seguintes.

Atualmente, dada a agonizante situação das finanças fluminenses, o Executivo tenta aprovar um conjunto de medidas de austeridade por meio de um projeto de lei, que foi apelidado de "pacote das maldades". Entre as propostas, estão cortes de gastos, extinção de programas sociais, aumento de impostos e elevação na contribuição previdenciária dos servidores públicos.