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Violência no Rio: "É preciso coragem", diz médica de emergência da Cidade de Deus

Taís Vilela

Do UOL, no Rio

27/09/2017 04h00

Diante de mais uma crise de violência no Rio, com invasões, perseguições a traficantes pelas comunidades e tiroteios, a reportagem do UOL conversou com profissionais que lidam diretamente com vítimas dessa dolorosa realidade para mostrar como isso afeta a rotina de muitas pessoas. Médicos, psicólogos e coordenadores de projetos de combate ao crime falam das consequências de estar na linha de tiro e dão voz ao sentimento que ecoa em toda a sociedade.

Neste primeiro vídeo da série, a médica Flávia L. Rocha, que trabalha há nove meses na emergência da UPA (Unidade de Pronto Atendimento) de Cidade de Deus, na zona oeste do Rio, diz que chegam cada vez mais casos de baleados e amputados no local. "De janeiro a julho deste ano, houve um aumento de 120% no número de feridos por bala se comparado a todo o ano passado."

De acordo com ela, não há mais um perfil definido de quem é internado por ter sido ferido por tiro: "Antes era um paciente masculino, um jovem entre 20 e 30 anos. Hoje não existe mais isso. Há desde crianças até idosos, homens e mulheres, que chegam com lesões por arma de fogo".

Segundo Flávia, os baleados são maioria dos atendimentos na UPA e os moradores conseguem identificar quem pratica a agressão, se é de milícia ou traficante. "Cada um tem seu método."

Ela conta que aprendeu a lidar com naturalidade com a violência, mas que isso não deixa nunca de impressionar. Ela ainda dá uma dica a quem quer trabalhar na emergência: "Coragem, ajude a enfrentar esse momento tão difícil".

Nesta quinta, o UOL publicará entrevista com Zeca Borges, coordenador do Disque Denúncia fluminense - órgão que recebe ligações sobre a ocorrência de crimes e informações sobre procurados. Na sexta, será a vez de dar voz a Reginaldo Franklin, diretor do Instituto Médico Legal Afrânio Peixoto, para onde vão alguns dos corpos de vítimas desta violência.

Disputa entre facções

O medo no Rio de Janeiro se espalhou e se intensificou por conta de uma sangrenta disputa entre Antônio Bonfim Lopes, no Nem da Rocinha, e Rogério Avelino da Silva, o Rogério 157, que têm métodos diferentes para atuar na Rocinha. Ambos lutam pelo controle do tráfico e tiveram reforços de facções rivais.

Enquanto Nem era conhecido por seu perfil assistencialista, de ajuda à comunidade, Rogério 157 cobra "taxas de serviço", com tributos para quem atua com mototáxis, distribui botijões de gás ou vende água, fornecimentos importantes numa comunidade em que esses produtos têm dificuldade de serem entregues.

E isso não acontece apenas na Rocinha. Trabalho de inteligência das polícias e Forças Armadas aponta que em 850 das 1.025 comunidades da capital há traficantes ou milicianos (policiais ou bombeiros que exploram serviços e oferecem "segurança privada").