Mulher de chefe da FDN nega ter ordenado massacre de Manaus: "Entrei na prisão para evangelizar"
Denunciada por supostamente ter levado a carta com a ordem para o massacre de Manaus, Luciane Albuquerque de Lima, casada com o chefe da facção FDN (Família do Norte), José Roberto Fernandes Barbosa, nega ter qualquer participação nos eventos que culminaram na morte de 56 presos do Compaj (Complexo Penitenciário Anísio Jobim), no primeiro dia deste ano.
"Jamais eu faria isso. Eu estive no Compaj uma única vez, no dia 11 de novembro de 2016, junto com uma equipe de missionários. Nosso objetivo era levar a palavra do Evangelho aos presos", afirma Luciane, em entrevista ao UOL.
"Minha defesa pediu que a direção do presídio entregue à Justiça as gravações da câmera de segurança que mostrarão que estou falando a verdade. Em nenhum momento fiquei sozinha com qualquer preso no único dia em que estive lá. Participei da evangelização. Nunca recebi qualquer carta com essa ordem", diz Luciane.
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A Justiça do Amazonas analisa um pedido de prisão preventiva da denunciada, feito pelo MPE (Ministério Público Estadual).
"O fundamento do pedido é cortar a ligação entre o comando externo e os internos da FDN. Segundo a apuração da Policia Civil, ela é uma ligação fundamental", afirma o promotor Edinaldo Medeiros, autor da denúncia contra 213 pessoas, inclusive Luciane, por participação no massacre.
"É necessário cessar a linha de contato do comando com os comandados", afirma o promotor.
Processo de divórcio
Luciane afirma que nunca se envolveu em qualquer atividade criminosa nem sabia que seu marido, também conhecido como "Zé Roberto da Compensa", era chefe do crime organizado de Manaus, quando o conheceu.
"Esse homem, que a mídia e as autoridades apontam como autor desses crimes, nunca existiu para mim até o momento em que ele foi preso. Nunca soube nem me envolvi em qualquer crime."
Zé Roberto foi transferido para o presídio federal de Campo Grande (MS), no dia 22 de novembro de 2015, já no RDD (regime disciplinar diferenciado), o mais rígido de todo o sistema penitenciário brasileiro, por ser réu da Operação La Muralla --processo criminal resultante da investigação da Polícia Federal que revelou a estrutura da FDN.
"Desde essa data até agora eu nunca tive contato com ele. Ele só recebeu visitas da mãe dele em 2016. Nossa filha de nove anos só tem contato com o pai por meio de videoconferência", diz Luciane. Ela afirma ainda estar em processo de divórcio do marido.
"Todas as cartas que saem do presídio federal são monitoradas. Gostaria que o Ministério Público investigasse melhor quem faz visita em presídio federal. Eu nunca estive lá."
Documento entregue pela defesa de Luciane Albuquerque de Lima
A defesa de Luciane enviou ao UOL documentos que, segundo eles, provariam a inocência da denunciada. Entre eles, um ofício assinado pela direção do presídio federal de Campo Grande que afirma que as correspondências dos detentos são analisadas e que é proibido troca de cartas entre presos de outras unidades.Outro documento é um ofício da Seap (Secretaria de Administração Penitenciária) do Amazonas em que afirma que Luciane foi uma visitante do Compaj "de tipo religioso" na manhã do dia 11 de novembro durante duas horas e meia.
"Tenho também bilhetes de passagens de avião que mostram que eu estava visitando parentes em Fortaleza, juntamente com minha filha, no dia em que aconteceu o massacre", diz Luciane. "Minha família tem sofrido ameaças depois que tudo aconteceu."
Testemunhos apontam que acusada levou carta, diz MP
De acordo com a denúncia do MP, testemunhos confidenciais apontam a acusada como "responsável por introduzir no Compaj carta escrita por seu companheiro, na qual continha a ordem para que a rebelião deflagrada". O UOL teve acesso a um desses relatos (veja abaixo).
O MP ainda acrescenta: "Assentou-se que 'Luciana' entregou a carta diretamente ao líder local alcunhado 'Caroço' e estava presente na unidade prisional quando o conteúdo foi lido em voz alta por 'Marabá' diante dos líderes da FDN na unidade prisional".
Testemunho confidencial à Polícia Civil do Amazonas
No inquérito da Polícia Civil, não é informada a data em que teria ocorrido a entrega e leitura da carta, mas a força-tarefa afirma que a ordem de Zé Roberto partiu cerca de dois meses antes do dia 1º de janeiro. "A fase de instrução processual serve justamente para produzir as provas dos fatos contidos na denúncia", afirma Medeiros.Nas conclusões do inquérito, a força-tarefa optou por não pedir à Justiça do Amazonas a prisão da ainda mulher de Zé Roberto, por considerar que a medida não era cabível neste momento da investigação.
"O pedido de prisão preventiva do Ministério Público não atende os requisitos previstos na lei para a decretação da prisão preventiva", afirma a advogada Kelli Hilário, que defende Luciane. Ela também representa Zé Roberto da Compensa no processo criminal do massacre de Manaus. Ela nega que seu cliente tenha ordenado a morte dos presos, quase metade deles integrantes do PCC (Primeiro Comando da Capital), facção que disputa com a FDN o controle dos presídios e da rota de tráfico na região Norte.
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