Mais armas não defendem ninguém, diz mãe de vítima do massacre de Realengo
Passava das 10h no Rio de Janeiro quando o telefone de Adriana Silveira começou a tocar freneticamente. Eram suas colegas pedindo que ela ligasse a televisão para que visse as notícias. A 450 quilômetros dali, em Suzano (SP) dois jovens entraram em uma escola e mataram oito pessoas. Segundo autoridades, o atirador matou comparsa e se suicidou ao ver a polícia.
Adriana não conhecia nenhuma das vítimas. Mesmo assim, entrou em choque. "Voltou tudo na minha cabeça. Aquele filme terrível voltou na minha cabeça", disse.
Em 2011, a filha de Adriana, Luiza, então com 14 anos, foi uma das vítimas do massacre de Realengo, quando um ex-aluno de uma escola do bairro carioca invadiu o local e matou 12 pessoas. Em frente à televisão, Adriana disse que não parava de chorar.
Eu comecei a chorar sem parar. É uma tristeza incrível. Ver uma tragédia dessa se repetindo tantos anos depois é horrível
Adriana Silveira, mãe de vítima do massacre de Realengo
Adriana preside a associação Anjos de Realengo, que reúne familiares das vítimas da tragédia no Rio de Janeiro. Em breve entrevista ao UOL, ela criticou as autoridades pela falta de segurança nas escolas, mas disse que a solução para esse tipo de crime não passa pelo maior acesso a armas de fogo. "Mais armas não defendem ninguém", afirmou.
Confira os principais trechos da entrevista:
UOL - Como você ficou sabendo do massacre em Suzano?
Adriana Silveira - Eu estava em casa e meu telefone começou a tocar. Ficou tocando, tocando e, quando eu vi, era o pessoal da associação me avisando para ligar a televisão. Quando eu liguei, era isso.
Como você ficou ao receber a notícia?
Eu levei um choque quando eu vi. Eu comecei a chorar sem parar. É uma tristeza incrível. Ver uma tragédia dessa se repetindo tantos anos depois é horrível. Voltou tudo na minha cabeça. Aquele filme terrível voltou na minha cabeça.
Desde a tragédia em Realengo, você tem feito críticas às autoridades. Como você se sente vendo algo semelhante acontecer novamente?
Eu venho lutando desde 2011 não para que as pessoas não se esqueçam do que aconteceu em Realengo. Mas é para que a gente se lembre do que houve. É preciso lembrar que as nossas escolas continuam abandonadas, não têm segurança e não há trabalho de prevenção a esse tipo de coisa.
Mas o que você acha que poderia ser feito para evitar esse tipo de tragédia?
É preciso implementar uma política de prevenção e de segurança. As escolas estão abandonadas. Qualquer um entra. Mas também é preciso que se faça a prevenção, com palestras sobre o bullying, sobre violência. Nada disso vem sendo feito.
Desde a tragédia em Suzano, como vem acontecendo em relação a quase todos os assuntos no país, dois grupos vem utilizando o caso para defender posições antagônicas. De um lado, há os que defendem que facilitar o acesso legal a armas poderia diminuir esse tipo de crime. Do outro, há os que defendem que uma das soluções para evitar esse tipo de situação é restringir o acesso legal a armas. De que lado você está?
Eu sou contra facilitar o acesso a armas. Mais armas não defendem ninguém. É muito fácil alguém ver o que aconteceu e dizer que, se alguém tivesse uma arma lá dentro, a situação poderia ter sido evitada. Eu acho que poderia até ser pior. Imagina se tem alguém lá com uma arma e começa um tiroteio generalizado? Só sabe isso quem vive na pele. Armas não foram feitas para defender ninguém.
No início do ano, o presidente Jair Bolsonaro (PSL) assinou um decreto flexibilizando a posse de armas de fogo no país. Qual sua opinião em relação a essa medida?
Eu sou contra. Uma arma de fogo nas mãos erradas é tragédia na certa. Não temos maturidade para segurar uma arma de fogo. Se antes, quando o acesso a uma arma legal era mais difícil, tragédias aconteceram, imagina agora.
Você teme que uma maior quantidade de armas circulando possa aumentar a quantidade de tragédias como essa?
Sim. Isso vai vai causar mais tragédias. Como eu disse, arma não defende ninguém. Se alguém te chama de feio na rua e você está desarmado, você engole e vai embora para casa. Mas, se você estiver armado, você não vai recuar.
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