Mortes por covid-19 aumentam, mas aglomerações resistem na periferia de SP
Resumo da notícia
- Periferia de SP já chama a atenção pelo número de mortes devido à covid-19
- Comércios abertos e aglomerações são vistos em 4 bairros visitados pelo UOL
- Entrevistados contra o isolamento citam falta de dinheiro, entre outros motivos
A população da periferia da capital ignora o isolamento social, mesmo com casos do novo coronavírus registrados até o extremo sul da cidade de São Paulo.
Comércios abertos, moradores nas ruas, filas em bancos e supermercados e aglomerações em pontos de ônibus são cenas comuns nos bairros do Grajaú, Parelheiros, Jardim Varginha e Cidade Dutra, em quatro semanas de isolamento oficial. A cidade de São Paulo tem 50% da sua população cumprindo a quarentena, segundo dados do SIMI-SP (Sistema de Monitoramento Inteligente do Estado de São Paulo).
Esses bairros são ligados pelas avenidas Teotônio Vilela e Dona Belmira Marin. Ambas possuem grande movimentação de veículos e pedestres diariamente. Os bairros estão entre os mais movimentados, segundo monitoramento de celulares, autorizado pelo governo do estado de São Paulo.
A auxiliar de enfermagem Natália de Andrade, 35, fez o seu primeiro teste há 15 dias, quando teve o resultado positivo para coronavírus. Um segundo teste foi feito, mas ela ainda aguarda o resultado. A auxiliar mora no Jardim Iporanga, comunidade da Cidade Dutra.
"Tenho um pai que faz parte do grupo de risco. Ele tem trombose e diabetes, teve uma perna amputada. Depois que eu tive o diagnóstico da covid-19, me isolei da minha família. Só nos vemos por vídeo e falamos por telefone", contou Natália.
"Eu acho o cúmulo. Vejo muita gente nas ruas, as pessoas estão fazendo festas. Muitos estão duvidando, mas só vão acreditar quando algum familiar ou eles mesmos estiverem infectados. É complicado. As pessoas dizem que isso é só mídia, que o PT (Partido do Trabalhadores) está causando isso tudo. Gente, não é. Quem puder se cuidar, se cuide. Só quem passa por isso sabe", disse a auxiliar, ao UOL.
Ela também relatou que teve muito medo durante seu tempo em isolamento. "Parece que você tem uma mochila pesada nas costas, muita falta de ar. Você anda dentro da sua casa e já está com cansaço, indisposição. É muito ruim."
Isolamento x falta de dinheiro
Na entrada do terminal Grajaú os ambulantes tomam conta das calçadas e das plataformas. A reportagem tentou conversar com alguns dos vendedores, mas nenhum deles quis dar entrevista. Apesar da baixa demanda de passageiros, filas se formam à espera de ônibus.
Moradora do Grajaú, Camila Leite, 26, relatou à reportagem do UOL que está saindo de casa pois não vê necessidade de isolamento. Ela é autônoma, mas está fazendo trabalhos como auxiliar de cozinha, pois estava sem emprego.
"Eles dão R$ 600 para o povo achando que vão ajudar, pelo contrário. Se não morrer de covid-19, todos morrem de fome. Eu saio de casa, sim, não posso esperar as coisas caírem do céu. Eu sou mãe. Para quem tem dinheiro é muito fácil lidar com essa situação, mas e as comunidades? E as pessoas pobres? Como ficam? Não é assim que funciona", relatou Camila.
Isolamento social com "cara" de férias
Em uma praça no Jardim Varginha em frente ao terminal de ônibus, rodas de amigos, crianças brincando com seus pais e operários da prefeitura fazendo manutenção no local são vistos pela reportagem.
À espera de um companheiro de trabalho estava Kleber Soares, 47, sentado em um dos bancos da praça. Morador de Araraquara, interior de São Paulo, ele trabalha no ramo de construção civil.
"Lá na minha cidade estamos cumprindo o isolamento. Tem de ser assim. Mas vendo isso tudo aqui, parece que deram férias para todo mundo. A população acha que é brincadeira, um brinde, só pode. Eu só estou aqui porque sou obrigado, vim ver uma obra, que é meu trabalho. Mas você vai num banco, está cheio. Vem na praça, também é cheia", disse o mestre de obras.
Não muito longe dali, em Parelheiros, a maioria dos comércios funcionam normalmente. Muitos idosos e poucas máscaras são vistos nas ruas.
Aposentado, Milton Souza, 67, sabe da sua condição de risco, mas não consegue respeitar a quarentena em casa. Ele estava acompanhado de Antônio Feliciano, 67, favorável ao isolamento.
"Sei que não posso sair, sou do grupo de risco, mas não temos outra opção. Se for pegar esse vírus, a gente pega até dentro de casa, imagina quem tem a família grande? Eu tenho de fazer minhas comprinhas, seu eu não for ninguém vai. Os comércios fechados não ajudam em nada, só atrapalham a vida do pobre", disse Milton ao UOL.
Na Cidade Dutra, também na zona Sul, pontos de ônibus seguem cheios, como ocorria em dias anteriores à pandemia.
Periferia tem maior número de mortes por covid-19 em SP
Segundo dados divulgados pela Prefeitura de São Paulo, 46 mortes suspeitas ou confirmadas como sendo pela covid-19 foram registradas até o dia 13 deste mês nas subprefeituras de Capela do Socorro e Parelheiros, que administram os bairros citados na matéria.
22 dessas mortes foram no Grajaú e no Jardim Varginha, 17 na Cidade Dutra e 7 em Parelheiros, segundo mapa divulgado pela Secretaria Municipal de Saúde. Com base nos números, a periferia da capital concentra mais óbitos que bairros mais centralizados. Brasilândia tem 33 mortes, e Itaquera, 27.
Outros 44 óbitos são divididos entre Capão Redondo, Jardim Ângela e Jardim São Luís. Já na Cidade Tiradentes são 22.
No início da tarde de ontem (15), eram 563 mortes confirmadas na capital, segundo boletim publicado no site oficial da prefeitura. O estado contabiliza 778 mortes devido à virose.
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