Rio: MP cria órgão contra crime organizado, e violência policial perde foco
O MP-RJ (Ministério Público do Rio de Janeiro) publicou ontem (13) resolução que reformula sua atuação especializada na área de segurança pública. O órgão focará na articulação entre diversas áreas para combater milícias e tráfico, mas deixará de ter promotores dedicados a combater a violência policial.
Foi criada a CGSP (Coordenadoria-Geral de Segurança Pública), que ficará responsável por articular a atuação do MP fluminense em áreas como combate ao crime organizado, controle externo da atividade policial e monitoramento do sistema prisional —sendo proibida, contudo, de atuar como órgão de execução.
O promotor Reinaldo Lomba, que assumirá o comando da CGSP, explica que a principal tarefa do novo órgão é fazer a articulação entre as diversas promotorias e órgãos internos do MP, as forças policiais e demais órgãos públicos para o combate ao crime organizado —com ênfase nas milícias.
"Uma área ocupada pela milícia com exploração irregular do solo não vai demandar apenas atuação de ordem criminal", explica. "São áreas que demandam regularização administrativa por parte de municípios e essa ideia de integração passa também por isso."
O promotor também destaca que outro papel que o órgão deve desempenhar é a análise de dados —tanto estatísticas criminais quanto outras informações de caráter reservado em posse do MP— para auxiliar nas diretrizes de atuação sobre o crime organizado.
Um ponto considerado prioritário pelo coordenador em relação ao controle externo da atividade policial é atuar, junto à Polícia Civil, para entender os motivos por trás da baixa elucidação de crimes violentos no estado, inclusive homicídios. Segundo dados do ISP (Instituto de Segurança Pública), ao fim de 2018 —último número divulgado— apenas 17,6% dos homicídios no estado foram elucidados.
Processos contra policiais voltam para promotorias
A resolução também mantém outra mudança importante na estrutura do Ministério Público. Desde que Luciano Mattos tomou posse como o novo procurador-geral de Justiça, circulavam na instituição boatos sobre o fim do Gaesp (Grupo de Atuação Especializada em Segurança Pública).
O órgão, criado em dezembro de 2015, foi pioneiro ao concentrar uma equipe de promotores dedicados exclusivamente a apurar crimes cometidos por policiais em serviço —como homicídios e episódios de tortura.
A atuação do Gaesp sobre alguns batalhões da Polícia Militar conhecidos por sua atuação violenta —caso, por exemplo, do 41º BPM (Irajá) e do 7º BPM (São Gonaçalo)— resultou na redução da letalidade dessas unidades.
Com a nova resolução, fica estabelecido que os inquéritos envolvendo policiais serão conduzidos exclusivamente pelos promotores criminais das áreas onde os crimes ocorrem —além dos casos de violência policial, esses promotores também atuam em todo tipo de crime, de ações de traficantes e milicianos a roubos de rua.
"A atual gestão entendeu que devia promover uma mudança nesse modelo. Esse controle [da atividade policial] não vai acabar, até porque já existe toda uma estrutura dos promotores naturais para investigar esses casos pontuais", argumenta Lomba.
Ainda segundo ele, a CGSP terá o poder de criar grupos temporários para auxiliar esses promotores em casos de maior complexidade, como chacinas.
Violência policial: pesquisador vê mudança com ressalvas
Para o pesquisador Daniel Hirata, professor da UFF (Universidade Federal Fluminense) e coordenador do Geni (Grupo de Estudos Novos Ilegalismos), ainda é preciso mais tempo para avaliar os reflexos das mudanças internas no MP. Contudo, ele avalia que, se a articulação prometida de fato for posta em prática, pode haver avanços.
"Temos que ver como isso vai funcionar concretamente, mas parece ser uma boa notícia uma maior articulação de enfrentamento às milícias. Temos defendido que essa dimensão regulatória é uma maneira mais eficiente de enfrentar as milícias. Nessa área imobiliária, por exemplo, é fundamental ter essa articulação com esses órgãos que dão autorização das obras, regularização dos terrenos. Tudo isso pode ajudar a ter um enfrentamento mais efetivo que a visão meramente repressiva", avalia.
Contudo, o pesquisador vê com ressalvas o retorno dos crimes cometidos por policiais civis e militares para as mãos de promotores sem especialização.
"O enfrentamento da letalidade policial no que diz respeito ao MP, que é o controle externo, é visto como um pepino, algo que poucos promotores querem fazer. Não é uma área em que os promotores gostem de atuar, isso é algo muito conhecido. Daí a importância de ter um grupo especializado, porque gera acúmulo de conhecimento e memória institucional", critica.
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