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Caso Moïse: Família do congolês desiste de quiosque na Barra, diz advogado

Ivone Lotsove lolo, mãe de Moïse, ao lado do prefeito Eduardo Paes - Daniele Dutra/UOL
Ivone Lotsove lolo, mãe de Moïse, ao lado do prefeito Eduardo Paes Imagem: Daniele Dutra/UOL

Daniele Dutra

Colaboração para o UOL, no Rio

11/02/2022 14h59Atualizada em 11/02/2022 21h01

A família do congolês Moïse Kabagambe, espancado até a morte em um quiosque na Barra da Tijuca, zona oeste do Rio, desistiu dos dois quiosques na praia —cedidos pela Prefeitura do Rio de Janeiro— por medo de represálias, segundo informou a defesa.

A prefeitura anunciou na última segunda-feira (7) a cessão imediata do quiosque Tropicália até 2030, mas admitiu pendência judicial em relação ao Biruta. De acordo com o representando legal da família, o advogado Rodrigo Mondego, o fato de o dono do Biruta não desistir do ponto, como o UOL revelou, pesou na decisão.

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"A família desistiu por medo, principalmente, porque um dos donos disse que não sairia do local. Isso causou pânico na família e ela não quer ocupar aquele local por medo. Eles sabem de outros quiosques vazios, agradeceram à [concessionária] Orla Rio e [dizem] que aceitariam outro quiosque na orla", disse Mondego, integrante da Comissão de Direitos Humanos da OAB-RJ (Ordem dos Advogados do Brasil do RJ).

"Inclusive já se sabe que, na orla da zona sul, tem quiosques vazios, e lá eles não teriam conflito com ninguém. Lá eles poderiam trabalhar e conseguir o próprio sustento", completou o advogado.

Procurada, a Orla Rio informou que ainda não foi oficialmente comunicada da decisão e que "aguardará a reunião com a família na semana que vem para esclarecer dúvidas e receios, além de conversar sobre as melhores alternativas". A prefeitura não comentou o assunto até a publicação da reportagem.

Vizinhos, os dois quiosques ficam colados um ao outro, na altura da avenida Ayrton Senna. O Biruta —hoje administrado por um policial militar e sua irmã— é alvo de ação judicial de reintegração de posse por parte da Orla Rio, que administra 309 quiosques.

A concessionária afirmou nesta semana que primeiramente começaria a estruturar o projeto oferecido à família de Moïse no quiosque onde funcionava o Tropicália. "A concessionária só dará início à segunda fase [no Biruta] junto à família de Moïse, quando tiver conseguido reaver a posse." "Enquanto isso, a empresa aguarda o andamento do processo na Justiça."

No entanto, em entrevista ao UOL, o aposentado Celso Carnaval, 81, dono do Biruta, disse que não pretende ceder o espaço. Em julho, a Orla Rio entrou com uma ação de reintegração de posse na Justiça, mas ainda não houve decisão no processo.

"Não vou sair. Estive conversando com algumas pessoas, e a orientação que tive é deixar rolar. Estou naquele ponto desde 1978 e não vou abandoná-lo", afirmou Carnaval.

Djodjo Baraka Kabagambe, irmão de Moïse, disse contudo não ter conhecimento da decisão. "A escolha de aceitar ou não é da minha mãe, mas eu não estou sabendo de nada, de nenhuma decisão", disse ao UOL.

Cessão do quiosque

A cessão do quiosque foi feita pelo próprio prefeito do Rio, Eduardo Paes (PSD).

A mãe de Moïse, Ivone Lotsove Lolo, e os irmãos Djojo, Samir, Kevin e Maurice Kabagambe, receberam publicamente uma carta compromisso —documento que autoriza a concessão para a família— e já podiam assumir o Tropicália.

Segundo a Orla Rio, o contrato do Tropicália foi suspenso com as investigações da morte do congolês e, caso seja comprovado que o operador do quiosque não teve envolvimento com o crime, ele será devidamente indenizado ou realocado em outro restabelecimento. Até agora não há indícios de que ele tenha relação com a morte de Moïse. Três homens que trabalham nos quiosques da região foram presos na semana passada.

De acordo com Paes, o quiosque Biruta seria passado futuramente para a família. "Já existe uma causa judicial para tirar o quiosque do dono do Biruta, que é um sublocatário e está fora das normas da Orla Rio", disse o prefeito na ocasião.

O PM Alauir Mattos de Faria —apontado por agressores de Moïse como dono do Biruta— não é o operador responsável pelo quiosque, e sim um ocupante irregular, segundo a Orla Rio.

Esse é um dos fatos que motivaram a abertura de processo judicial contra o ex-operador Celso Carnaval para reintegração de posse do quiosque. A Orla Rio explica que o contrato para operação do Biruta foi celebrado com Celso Carnaval, que, sem o consentimento da empresa, entregou a operação do quiosque a Alauir.

Espancado até a morte

Moïse foi espancado a pauladas até a morte após cobrar do gerente pagamentos em atraso. O rapaz, que chegou ao Brasil em 2011 fugindo da violência na República Democrática do Congo, morreu no dia 24 de janeiro à noite no Tropicália, onde trabalhava por diárias.

Além da prisão dos três agressores, a Delegacia de Homicídios da Capital tenta identificar outras pessoas que passaram pela cena no crime.