Topo

Esse conteúdo é antigo

Amigo de Dom: Mortes mostram que Brasil não tem controle sobre território

Colaboração para o UOL, em Maceió

16/06/2022 13h08

As mortes do jornalista britânico Dom Phillips e do indigenista brasileiro Bruno Pereira no Vale do Javari, na Floresta Amazônia, evidenciou a ausência de atuação do Estado brasileiro, que cada vez mais tem menos controle sobre o território na região amazônica, segundo avaliou o jornalista inglês Sam Cowie, amigo de Dom, durante participação no UOL News de hoje.

Ao ser questionado sobre como esse crime afeta a imagem do Brasil a nível internacional, Cowie pontuou que "a imagem do Brasil lá fora está se degradando faz tempo", e que esse novo capítulo apenas aprofunda ainda mais a crise. O jornalista também destacou o fato de que a região amazônica já está praticamente "tomada" pelo crime organizado, que se "empodera" diante da inépcia do governo Jair Bolsonaro (PL), responsável por acelerar o processo de desmonte dos órgãos fiscalizadores na região.

"Esse triste capítulo agora é mais um exemplo de como o Estado brasileiro não tem controle sobre o próprio território, especificamente nessas regiões de fronteira. Claramente não é uma questão simples. Lá é um lugar de muito difícil acesso, a economia e o IDH [Índice de Desenvolvimento Humano] são muito baixos, é um lugar carente, mas, infelizmente, há ausência de Estado e, [diante desse cenário], quem entrou e está aproveitando essa ausência é o crime organizado, especificamente o narcotráfico", declarou.

Para Sam Cowie, Dom e Bruno foram assassinados por motivação política, a exemplo de Chico Mendes e Dorothy Stang, além de outras várias pessoas mortas por defenderam a preservação das terras e dos povos que habitam a região amazônica, todos vítimas dos criminosos que atuam na região.

"Infelizmente a gente está vendo que acelerou nos últimos três anos o avanço do crime organizado, especificamente na região Norte e, mais especificamente ainda, na região onde o Bruno e Dom foram mortos", ressaltou.

Cowie salientou que os cortes realizados nos órgãos responsáveis por fiscalizar a região amazônica, como a Funai, o Ibama e o ICMBio, que já vinham sofrendo com a falta de recursos na gestão de Michel Temer (MDB), ficaram ainda piores no atual governo de Jair Bolsonaro. Em meio a esse cenário de descaso por parte do poder público, quem lucra são os criminosos.

"O fato é que essa região do Vale do Javari está abandonada há muito tempo. Os cortes [realizados] na Funai durante o governo Temer, que foram acelerados no governo Bolsonaro, e a interferência política na Funai durante o governo Bolsonaro, deixaram esse lugar cada vez mais abandonado, numa época em que o crime organizado transnacional está cada vez mais forte nessa região. É preciso ter uma atuação maior do estado. É uma questão de segurança nacional", completou.

Crime

A Polícia Federal afirmou em entrevista coletiva na noite desta quarta-feira (15) que o pescador Amarildo da Costa Oliveira, também conhecido como "Pelado", confessou que matou e enterrou os corpos do indigenista Bruno Pereira e do jornalista britânico Dom Phillips, correspondente do jornal The Guardian, na região do Rio Javari (AM). A informação foi confirmada por Eduardo Alexandre Fontes, superintendente regional da PF no Amazonas.

Amarildo foi preso em flagrante no dia 7, por porte de munição de uso restrito. Segundo Fontes, o pescador confessou na noite de terça-feira (14), voluntariamente, a autoria do duplo homicídio, e contou com detalhes a dinâmica do crime. De acordo com o relato de Amarildo, Bruno e Dom Phillips teriam sido mortos por arma de fogo —informação que ainda precisa ser confirmada pela perícia.

Nesta quarta, com a ajuda do próprio Amarildo, as forças de segurança do Amazonas encontraram restos humanos enterrados em uma região remota, mais de três quilômetros mata adentro. A PF informou que o material orgânico será enviado para análise nesta quinta-feira (16), com o objetivo de confirmar a identificação.

A Polícia Civil não descarta a possibilidade de outras pessoas estarem envolvidas no crime. Além de Amarildo, o irmão dele, Oseney da Costa de Oliveira, está preso, e, segundo a PF, há um terceiro investigado. "Existe a possibilidade de decretação de outras prisões", afirmou o delegado Guilherme Torres.

Logo após as declarações da PF, Alessandra Sampaio, esposa de Dom Phillips, se manifestou sobre o caso. "Embora ainda estejamos aguardando as confirmações definitivas, este desfecho trágico põe um fim à angústia de não saber o paradeiro de Dom e Bruno. Agora podemos levá-los para casa e nos despedir com amor", afirmou.