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Malária e fome: quem são os garimpeiros que vivem em situação precária

12.dez.1989 - Pista de pouso clandestina para abastecer o garimpo em Paapiú, em território Yanomami - Charles Vincent/ISA
12.dez.1989 - Pista de pouso clandestina para abastecer o garimpo em Paapiú, em território Yanomami Imagem: Charles Vincent/ISA

Do UOL, em São Paulo

07/02/2023 12h22Atualizada em 09/02/2023 16h14

Apontado como uma das principais causas da crise que atinge o povo yanomami, em Roraima, o garimpo é uma atividade extrativista que acompanha a história do Brasil desde a colonização. No entanto, apenas na década de 1980, o regime de permissão de "lavra garimpeira" foi estabelecido no Brasil. De lá pra cá, o cenário mudou bastante e, com ele, o perfil dos trabalhadores.

Majoritariamente quem constitui um garimpo são homens, entre 20 e 40 anos. A pesquisadora Francilene dos Santos Rodrigues, que estuda o tema desde a década de 1990, afirma que, se no passado a maior parte deles eram nortistas ou migrantes do Nordeste, hoje os garimpeiros já são de todas as regiões do Brasil e até mesmo de países vizinhos.

Em 2015, eu encontrei até jovens que estavam trabalhando para conseguir captar dinheiro para estudos. Tinha uma influência muito grande de gente do Sul e Sudeste do Brasil, o que diferenciava, por exemplo, da minha pesquisa de 1996, em que basicamente eram garimpeiros da região Norte ou Nordeste. Francilene dos Santos Rodrigues

Segundo a pesquisadora, hoje quem está no garimpo é principalmente quem tem capital para investir: os empresários do garimpo. "A mudança é que você tem um perfil de pessoas com grau de instrução um pouco maior, com cada vez mais jovens e há mais entrada das mulheres", explica.

Garimpeiros podem tentar cooptar indígenas para o garimpo. O avanço do garimpo nas terras indígenas também muda a dinâmica das relações em um garimpo. Francilene explica que homens indígenas podem ser incentivados a trabalhar com a extração de minérios.

Os garimpeiros oferecem armas, ouro dentre tantas outras coisas na tentativa de cooptá-los e com promessa de enriquecimento. Além disso, na medida em que esse garimpo se aproxima dessas terras, meninas adolescentes, que andam desnudas na frente de não-brancos e cuja sexualidade está se desenvolvendo, acabam se tornando mais vulneráveis. O número de IST (Infecções Sexualmente Transmissíveis) nos indígenas, por exemplo, aumentou. Francilene dos Santos Rodrigues

A promessa de dinheiro fácil é um dos atrativos para estes trabalhadores. Com a reforma trabalhista e o aumento do trabalho precarizado no Brasil, o garimpo se torna uma atividade que promete oferecer dinheiro fácil e rápido para a população. No entanto, a realidade não é essa, como explica a pesquisadora Francilene.

As pessoas acreditam que vão ganhar mais rapidamente aquilo que demorariam anos para ganhar em um trabalho informal, como sendo motorista de aplicativo. Eles trabalham 10h a 12h horas por dia, em condições insalubres, mas quem ganha de fato não são os garimpeiros de maneira geral Francilene dos Santos Rodrigues.

Há falta de recursos em terras ilegais. Os garimpeiros que atuavam na Terra Indígena Yanomami, em Roraima, estão tentando deixar o local após atuação do governo. No entanto, há falta de transporte, de informações e de comida. À coluna de Carlos Madeiro, do UOL, um deles afirmou que muitos do que atuam na região também estão sofrendo com a malária, que igualmente assola os indígenas da região.

Sem aeronave, sem comida para o povo, se não tomar uma atitude, vai morrer muita gente. Tem de mandar [voo] em cada clareira para tirar os garimpeiros.

O deputado federal Stélio Dener (Republicanos-RR) disse que muitos do que estão nos garimpos ilegais também exercem outras funções.

Nossa preocupação é que existem milhares de pessoas que não são de fato garimpeiros: foram trabalhar como mecânicos, cozinheiras e outras profissões (...) A grande maioria das pessoas lá é de Roraima e vai para o garimpo para sustentar suas famílias que ficam nos municípios. Stélio Dener