'Perderemos nossas raízes': a luta para salvar registros de cartório no RS
As enchentes do Rio Grande do Sul, que afeta mais de 2 milhões de pessoas, une o Brasil em uma grande corrente de solidariedade, onde cada um ajuda como pode.
A gaúcha Nátali Lazzari, 35, especialista em genealogia é um exemplo disso, ela trabalha com recuperação de documentos e assessoria de cidadanias estrangeiras.
Com vasto conhecimento em documentação antiga, ela se dispôs a auxiliar na recuperação de documentos de um cartório que utilizava frequentemente e que foi devastado com as enchentes.
"Postei nas redes sociais que me dispunha a ajudar e a dona do cartório entrou em contato pedindo minha ajuda", lembra Lazzari.
O que aconteceu?
As fortes chuvas e alagamentos causaram um deslizamento de terra que destruiu o cartório de Galópolis em Caxias do Sul.
Os registros do local partem de 1914, todos os quase 400 livros de registros ficaram sob os escombros e chuva.
Em uma sala alugada temporariamente pela responsável do cartório, a genealogista uniu forças com os 12 funcionários do local e com uma colaboradora de sua equipe para organizar os documentos e iniciar a recuperação dos que estavam molhados.
Correndo contra o tempo para salvar registros
"Depois de seis horas o mofo já pode aparecer e os danos depois são irreversíveis, por isso é importante colocar os livros em lugares arejados e deixar que sequem naturalmente", conta Lazzari.
"A luz solar faz com que as fibras do papel se retraiam e ele fique torcido. Nem o vento direto é bom, por isso, a orientação é usar desumidificadores ou ventiladores voltados contra o chão, ou para as paredes e deixar secar naturalmente", continua.
Lazzari conseguiu reunir ventiladores emprestados que ajudaram os registros a secarem o mais rápido possível.
"Chegamos lá com luvas, pincéis, espátulas e panos. Pegamos os livros que estão no chão da sala e abrimos para checar o tipo do dano, começamos limpando a capa, tirando o pior. Tem muito barro e o impacto no chão e os escombros por cima fez com que muitas capas fossem amassadas e o papel de dentro rasgado", diz a voluntária.
"Aqueles que estavam muito molhados, a solução era colocar papel toalha entre as folhas. Um dos livros que limpamos tinha ainda a marca de um sapato na capa, sinal que foi pisoteado durante a emergência".
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Quero receberHD e documentos perdido nos escombros
Em dois dias de trabalho todo o grupo conseguiu revisar, organizar e restaurar cerca de quatro mil documentos.
Tem coisas que os documentos te contam que a família não te conta. Tem história só contada nos livros. Eram certidões de 1910 e 1920, tinham papéis de 100 anos intactos, perfeitos, Nátali Lazzari, especialista em genealogia.
"O cartório tinha tudo digitalizado em HDs, mas um deles não foi encontrado nos escombros", completa.
Apesar de documentos físicos terem se misturado aos escombros, assim como componentes dos computadores, o cartório não teve nenhuma perda de dados, pois detêm um extenso backup de todos os itens em um servidor.
Voluntários podem ajudar
Quem deseja atuar e tem familiaridade com documentos, pode se inscrever no Cadastro de Voluntários/as S.O.S. Memória e Patrimônio RS, que convoca cidadãos com disponibilidade de carga horária e interesse em atuar no auxílio aos arquivos, museus, bibliotecas e centros de documentação de municípios do Estado do Rio Grande do Sul.
"A ideia surgiu em função das áreas alagadas concentrarem um grande número de arquivos, seja na capital ou interior, além disso,as equipes dos arquivos costumam ser reduzidas e ações de resgate precisam ser imediatas, tão logo as águas baixem", conta Aerta Moscon, 58, diretora no APERS (Arquivo Público do Estado do RS) e arquivista há 30 anos.
A diretora afirma que já reúnem 740 voluntários cadastrados. "Os interessados vão das áreas da ciência da informação a cidadãos no geral que se identificam com a causa", conta.
De acordo com a arquivista, ainda não é possível quantificar os danos pela cheia das águas, mas reforça que a ajuda de voluntários é essencial.
Sem o apoio da sociedade perderemos grande parte dos acervos que registram ações que tratam da nossa sociedade ao longo do tempo, das nossas raízes, origens e povo, Aerta Moscon, diretora do Arquivo Público do Estado do RS.
Em nota, o cartório de Galópolis informa que: "O acervo do cartório está todo digitalizado, não trazendo prejuízo aos atos praticados na Serventia. Apesar da destruição da sede e da grande perda material, o acervo está salvo".
Como ajudar?
Para se inscrever no Cadastro de Voluntários/as S.O.S. Memória e Patrimônio RS basta clicar aqui.
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