PSDB mingua no Congresso e tenta se reinventar após acúmulo de derrotas
O PSDB viu nas urnas a sua maior derrota quatro anos depois. Somente na Câmara, nesta eleição, o número de parlamentares despencou de 22 para 13 — uma queda de 41%. No Senado, a bancada terá dois representantes a menos — caiu de 6 para 4 (mas pode chegar a 5, dependendo das eleições estaduais).
Por esse motivo, há uma ala entre os tucanos que defende a ideia de repaginação da sigla a partir do ano que vem, segundo apurou o UOL.
Ressaca eleitoral. A derrocada nas eleições deste ano é interpretada como o resultado de um processo de estagnação do PSDB no cenário eleitoral. Daniel Trzeciak, deputado federal eleito no Rio Grande do Sul, afirma que a legenda precisa "voltar a se conectar" com a população.
O PSDB precisa se reinventar e voltar a estar conectado com os anseios e desejos da sociedade
Daniel Trzeciak (PSDB-RS)
Fim da hegemonia em SP. Uma das derrotas mais amargas para o PSDB em 2022 foi o fim da hegemonia de 28 anos à frente do governo do estado de São Paulo.
Ex-vice de João Doria, Rodrigo Garcia tentou renovar o mandato por mais quatro anos, mas acabou ficando atrás de Tarcísio de Freitas (Republicanos) e Fernando Haddad (PT), que vão disputar o segundo turno.
Rodrigo assumiu o governo após Doria se afastar com a intenção de participar da corrida presidencial pelo PSDB. No entanto, ele acabou desistindo da disputa por falta de apoio e competitividade no cenário nacional. Os tucanos apoiaram a candidatura da emedebista Simone Tebet —em um esboço do que seria a chamada "terceira via".
Outro trauma que ainda não foi totalmente superado pelos tucanos é a derrota de Aécio Neves em 2014. Em uma disputa voto a voto, o ex-governador de Minas Gerais (e atual deputado federal) ficou atrás de Dilma Rousseff (PT), à época concorrente à reeleição. A diferença entre os dois foi de cerca de 3,5 milhões de votos.
Sem perspectivas. Além da redução na Câmara e no Senado e da derrota em São Paulo, o partido não elegeu nenhum governador em primeiro turno e, nos estados em que um filiado disputa a eleição no segundo turno, não é favorito a ganhar o pleito — é o caso do Rio Grande do Sul, com Eduardo Leite (PSDB).
Auditoria do resultado de 2014. A avaliação de políticos do PSDB é que o partido vem se despedaçando desde 2014. Naquele ano, o partido, derrotado pelo PT nas eleições presidenciais, pediu uma "auditoria especial" do resultado.
"Após recebermos centenas de denúncias e questionamentos sobre problemas que teriam ocorrido com as urnas eletrônicas, em respeito aos eleitores do PSDB e ao nosso sistema eleitoral, a executiva nacional do partido — e não eu — decidiu por unanimidade contratar um grupo de especialistas que pudesse fazer uma análise do funcionamento das mesmas. O resultado do trabalho, público, como já foi divulgado inúmeras vezes, mostrou que, naquele momento, as urnas não eram passíveis de serem auditadas", declarou Aécio Neves, após a publicação da reportagem.
A atitude do partido inaugurou um movimento de questionamento das urnas e de posições mais "radicais" de políticos do PSDB, avaliam tucanos ouvidos pela reportagem.
A partir de 2015, Doria viu seu nome ganhar força no partido, o que possibilitou sua candidatura e vitória para a Prefeitura de São Paulo no ano seguinte. Doria teve o apoio do então aliado Geraldo Alckmin — hoje filiado ao PSB e vice na chapa do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT), adversário histórico do PSDB.
BolsoDoria. Até as eleições de 2018, Doria projetou novos passos, foi lançado como candidato ao governo de São Paulo e, para vencer, se indispôs com Alckmin, seu padrinho político.
No segundo turno contra Márcio França (PSB), Doria anunciou apoio a Jair Bolsonaro (PL), então candidato pelo PSL à Presidência. Com slogan "BolsoDoria", capturou o votos dos bolsonaristas e sentou na cadeira do Palácio dos Bandeirantes.
Nos anos seguintes, o então governador de São Paulo começou a dar os sinais de que rivalizaria com Bolsonaro, eleito presidente, em uma futura eleição presidencial.
Entrou em um conflito com o capitão reformado que tomaria proporções ainda maiores a partir de março de 2020, quando a pandemia de covid-19 foi decretada. Doria e o governo Bolsonaro travaram brigas públicas.
Em entrevista ao UOL News, em outubro, Doria afirmou que o mau desempenho do PSDB nas eleições de 2022 pode levar ao desaparecimento da sigla.
"O PSDB é um partido perdedor neste momento", disse Doria, relembrando o atrito que teve com os dirigentes da legenda por causa das prévias. "Venci [as prévias] e não levei porque a ponderação feita pela executiva nacional é de que comigo não haveria nem a manutenção, nem o aumento da bancada federal na Câmara e no Congresso."
"Houve uma redução de 41% da bancada, ou seja, o PSDB ficou muito menor", destacou o tucano.
Migração para o bolsonarismo. Na avaliação de políticos do partido, esse movimento de aproximação e, depois, racha com Bolsonaro fez com que os eleitores que um dia foram tucanos virarem público fiel do presidente.
O recente apoio do governador Rodrigo Garcia a Bolsonaro no segundo turno contra Lula seria mais um exemplo da falta de direção do partido.
No limbo. "O PT foi ocupando espaço do centro e empurrou o PSDB para a direita. E o PSDB, em vez de disputar com o PT esse espaço de centro, entendeu melhor ir para direita. Começou a discutir pautas de segurança pública, políticas sociais, e foi se descaracterizando neste processo", afirma Eduardo Grin, cientista político da FGV (Fundação Getúlio Vargas).
Se é para disputar a direita com bolsonaristas, o bolsonarismo é muito mais competente. PSDB foi se reduzindo a nada Eduardo Grin, cientista político
Grin também vê esse processo como consequência da mudança geracional no comando do partido. "As principais cabeças-brancas do partido foram perdendo força no processo, como FHC e José Serra. Foram sendo substituídos por uma geração muito mais formada pelo discurso da técnica, surfando na onda da antipolítica", afirma.
Mudar de cara. Os tucanos ouvidos pela reportagem defendem uma "repaginação" do partido.
Uma das propostas, em um primeiro momento, é uma reformulação de posicionamentos da legenda, deixando claro o que pensam sobre questões de gênero e saúde pública — como liberação de drogas e aborto, por exemplo. A mudança de nome do partido é ideia também já lançada entre tucanos.
Para Eduardo Grin, "a única alternativa" para o PSDB se repaginar seria unificar com outro partido, como o MDB. "Sozinho, o PSDB não se reconstrói", afirma.
Olhando mais à frente, não há nada tão ruim que não possa piorar, na visão do cientista político. "A possibilidade de perder prefeituras em 2024 é muito grande porque o partido terá pouco fundo partidário dado o tamanho da bancada", diz.
A reportagem tentou entrar em contato com o presidente do PSDB, Bruno Araújo, porém não obteve resposta.
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