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Igreja em local de ato de Bolsonaro fecha após intimidação de apoiadores

27.out.2022 - Ato de Jair Bolsonaro na praça da Paróquia Nossa Senhora do Desterro em Campo Grande, na zona oeste do Rio - Marcelo Ferraz/UOL
27.out.2022 - Ato de Jair Bolsonaro na praça da Paróquia Nossa Senhora do Desterro em Campo Grande, na zona oeste do Rio Imagem: Marcelo Ferraz/UOL

Thiago Ferreira

Colaboração para o UOL, no Rio

27/10/2022 16h52

Uma denúncia ao Ministério Público do Rio de Janeiro e uma carta aberta de fiéis da Paróquia Nossa Senhora do Desterro relatam atitudes de intimidação de apoiadores de Jair Bolsonaro (PL), em Campo Grande, na zona oeste do Rio de Janeiro, onde hoje ocorre um comício do presidente.

A paróquia —que é a igreja mais antiga do bairro, fundada em 1755— está fechada desde segunda-feira (24) para evitar vinculação ao ato de campanha de Bolsonaro. Três pessoas ligadas à paroquia relataram ao UOL que, desde sábado (22), apoiadores do candidato à reeleição acamparam na praça Dom João Esberard e intimidaram funcionários para entrar na igreja.

O UOL procurou a assessoria de imprensa da campanha de Jair Bolsonaro, mas ainda não obteve retorno.

Apoiadores de Bolsonaro quiseram conhecer o local para que este fosse um espaço de apoio ao evento de campanha.

Integrantes daquela comunidade religiosa —que preferiram não ter suas identidades reveladas— contam que simpatizantes de Bolsonaro tentaram, sem autorização, visitar o espaço interno da paróquia para conhecer a infraestrutura e usá-la no ato de hoje. Além disso, relatam que os bolsonaristas coagiram funcionários da paróquia para fazer uma reunião não agendada com o padre.

No domingo (23), o padre não permitiu o uso da igreja como base para o ato de hoje, alegando que ela deve se manter neutra na campanha eleitoral. Ante a negativa, os apoiadores continuaram intimidando padres residentes da paróquia e funcionários.

Temendo pela segurança dos fiéis e da paróquia, a igreja fechou as portas durante toda esta semana.

A carta dos fiéis ainda denuncia que grades que circundam a praça onde fica a igreja foram retiradas e árvores, derrubadas. Segundo o prefeito Eduardo Paes (PSD), não houve autorização da prefeitura para essa intervenção urbana.

"Se tivessem pedido autorização para retirar as grades, teriam tido desde que recolocassem depois. Nós somos democratas e respeitamos a livre manifestação. Claro que vamos buscar identificar quem levou as grades. Não custa lembrar o que diz o Código Penal. Civilidade e respeito às regras não fazem mal a ninguém. Mas é o estilo deles: vão atropelando", criticou o prefeito no Twitter e incluiu imagem do artigo 163 do Código Penal, que diz ser crime destruir ou deteriorar coisa alheia.

Carta ao TSE e a arcebispo do Rio

O José Francisco Alves —morador da região que participa das atividades da paróquia— denunciou o caso ao MP-RJ. Ele se disse perplexo.

"Tudo tem limite, até se apropriar de forma indevida do nome das pessoas e das instituições. Nunca vi algo parecido em nossa comunidade e em nenhuma paróquia de nossa região", afirma ele.

Por meio das redes sociais o padre João Lucas, da Congregação dos Sagrados Corações, falou sobre o evento político e desvinculou a atividade do espaço religioso.

"Gostaria de esclarecer que a praça Dom João Esberard, situada em frente à Paróquia Nossa Senhora do Desterro, em Campo Grande, não pertence à paróquia, mas à Prefeitura Municipal do Rio de Janeiro. Desta forma, qualquer evento a ser realizado nesta referida praça, a autorização deverá ser requerida ao órgão responsável na prefeitura."

Imagens da campanha de Bolsonaro que convocam para o ato mostram ao fundo a fachada da igreja —o que também foi motivo de uma fala do padre no Instagram da paróquia. "Sobre o uso de imagens —vídeo e fotos— das igrejas no território da arquidiocese, a autorização deverá ser solicitada ao Vicariato da Comunicação Social, por e-mail e com antecedência", disse o pároco.

A Arquidiocese do Rio de Janeiro, por meio de sua assessoria de comunicação, diz que não recebeu nenhum pedido de autorização para uso da imagem da paróquia pela campanha de Bolsonaro.

A carta aberta dos paroquianos, que há possui adesão de mais de 2.500 pessoas, será entregue ao TSE (Tribunal Superior Eleitoral) e ao cardeal Dom Orani, arcebispo do Rio.

Segundo um dos envolvidos, o objetivo é mostrar a insatisfação da comunidade ante o uso indevido da imagem da Igreja Matriz e o assédio que relatam ter sofrido para utilização do espaço sagrado.

Em um dos trechos da carta, os paroquianos reforçam a mensagem do pároco de que, "pela fé, já conhecemos e defendemos: Igreja não é palanque!".

Enquanto a candidatura do Sr. Jair Messias Bolsonaro alega constantemente que seu adversário político vai promover o 'fechamento de igrejas', é efetivamente a ação de sua campanha eleitoral, que aqui denunciamos, que acarretou fechamento temporário do templo religioso, que existe há quase 270 anos e se localiza na região central do bairro de Campo Grande."
Trecho da carta aberta de fiéis da Paróquia Nossa Senhora do Desterro

Eles relatam ainda que paroquianos bolsonaristas ficaram descontentes com a não acolhida ao evento do presidenciável. Contaram ainda que alguns deles foram contra a carta e contra a postura dos padres de terem fechado a igreja nesta semana.

Alves afirma que não havia outra opção, senão fechar as portas da paróquia.

"Foi uma ação prudente dos sacerdotes para preservarem a integridade dos fiéis, mediante a organização, montagem, evento. Mas nós fomos privados nesta semana das missas, confissões, das ações das pastorais e dos movimentos e também das ações sociais que realizamos com o povo de nossa comunidade", reclamou.

Em nota, a Arquidiocese do Rio diz que sempre orientou a não-utilização de imagens de igrejas para fins que não sejam da evangelização e assistência ao povo. Também afirmou que a Praça Dom João Esberard é de responsabilidade da Prefeitura do Rio e que a paróquia não possui nenhuma participação na gestão da mesma.