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Maduro usurpa poder e está com dias contados, diz general que apoiou Chávez

Clíver Alcalá, general chavista reformado - Juan Barreto/AFP
Clíver Alcalá, general chavista reformado Imagem: Juan Barreto/AFP

Talita Marchao

Do UOL, em São Paulo

10/02/2019 04h00

O general chavista reformado Clíver Alcalá foi um dos homens de confiança de Hugo Chávez até a morte dele, em 2013, e aposta que Nicolás Maduro tem seus dias contados no comando da Venezuela. Em entrevista ao UOL por telefone, Alcalá afirma que, exceto os cúmplices de Maduro nas altas cúpulas militares, integrantes das Forças Armadas divergem do líder venezuelano --daí o grande número de deserções e presos militares no país.

"Nos últimos seis anos, Maduro se dedicou a desmontar as Forças Armadas que Chávez armou. Para ter apoio, promoveu generais por populismo, e não por merecimento. Hoje, a situação das Forças Armadas venezuelanas nas mãos de Maduro é degradante. Elas estão desarmadas, sem munição. Ele desmoralizou o estado básico social dos militares, tanto que isso tem motivado deserções a granel e muitos pedidos de baixa", afirma Alcalá. Ele diz que Maduro atualmente só revista soldados sem munição.

Segundo o antigo apoiador de Chávez --para quem Maduro não representa o chavismo, e sim um "madurismo"--, o líder venezuelano não confia nas Forças Armadas e desconfia completamente da juventude militar. "Tirando os cúmplices do Maduro, os integrantes das Forças Armadas têm uma visão distinta do manejo do país e das próprias Forças Armadas, que é bem diferente do que Maduro faz. O problema é que hoje usam o terror, o medo e a morte como ferramenta de pressão", diz Alcalá. 

Na entrevista, ele lembra ainda que o número de militares acusados pelo governo de conspiração e traição só aumenta --inclusive ele próprio, que não revela onde vive atualmente. "Maduro tem hoje muita gente dentro das Forças Armadas contra ele. Lamentavelmente, os que estão vinculados a ele estão sujeitos à mesma sorte que Maduro."

Em janeiro, em uma carta aberta ao presidente interino, o opositor Juan Guaidó, Alcalá manifestou apoio ao seu governo de transição e pediu que ele liberte os presos políticos venezuelanos, entre eles os quase 200 militares detidos por Maduro, com base na anistia defendida pelo próprio Guaidó. "Os militares foram acusados, sem fundamento, de serem conspiradores, terroristas e traidores do país, quando os únicos a quem tais imputações podem ser feitas são os usurpadores de posições que reivindicam poderes que não foram legitimamente conferidos", diz Alcalá.

A "salada ideológica criada por Chávez"

Em inúmeras ocasiões, Alcalá afirmou que Chávez se equivocou em escolher Maduro, que era ministro de Relações Exteriores, para ser o seu sucessor.

Tanto Chávez quanto Guaidó são personagens que conseguiram grande mobilização no país. Guaidó com o ressentimento social, enquanto Chávez e Maduro usaram a ideia de que ser rico era errado. Só que todos os apoiadores desse regime enriqueceram e viraram milionários. Para eles, ser rico não é ruim. Agora, para a direita hoje ser rico é sinal negativo. A Venezuela virou uma salada ideológica em que o grande responsável, lamentavelmente, foi o próprio Chávez

Para o militar, a saída da crise é que o eventual governo de transição que deve substituir Maduro ouça todos os lados --esquerda, direita e centro. "Maduro usou o discurso de Chávez, a figura de Chávez e de Simón Bolívar, e o discurso da esquerda para acabar com o país mais rico da região", acusa o dissidente chavista.

Nesta semana, o próprio Alcalá se viu envolvido em mais uma acusação de Maduro: segundo o governo, ele seria um dos envolvidos no suposto atentado contra o líder venezuelano durante um ato militar no ano passado --dois drones teriam explodido perto do palanque em que o então presidente estava. Na ocasião, ele acusou a oposição e o governo colombiano.

O general reformado, segundo o governo de Maduro, seria parte de um plano para dar um golpe de estado com a ex-procuradora-geral Luisa Ortega Díaz (que fugiu do país após fazer inúmeras denúncias contra o ditador) e o ex-ministro do Petróleo, Rafael Ramírez (que comandou a estatal petrolífera PDVSA por 12 anos e rompeu com Maduro afirmando que ele deturpou o chavismo).

O governo Maduro não faz discussões políticas, e afirma que todos que têm visões distintas são traidores da pátria. Mas se a pátria é Maduro, ela é o saque, o roubo, a expulsão, o assassinato, a violação aos direitos humanos. A esta pátria eu não sou leal. A pátria é o povo venezuelano e o decoro. A esta pátria eu sou leal.

O desertor afirma que Maduro tem seus operadores de terror psicológico, que tentam converter a mentira em verdade para manipular. "Vão ficar falando da CIA [o serviço secreto dos EUA]. Nós, venezuelanos, estamos nesta situação hoje por causa da insanidade de Maduro. Ele é um usurpador do poder e um violador da Constituição. Para Maduro, nós somos traidores. Mas é Maduro quem representa a ilegalidade."

Para Alcalá, Maduro não chega ao fim do ano no comando da Venezuela. "A queda dele ainda está em processo, mas ele tem os seus dias contatos no poder", diz. "Maduro deve sair do governo que ele usurpa. O que o mantém no poder são as máfias do ouro, do diamante, o tráfico de combustível e de alimentos e os grupos armados que o apoiam por todo o país. Ele segue tirando ouro e riquezas para seu usufruto, e no futuro deve ser um milionário no exterior. Ele não pode ficar no país em que suas decisões causaram tantas mortes pela violência, pela fome, por doenças", afirma.

Ao final da entrevista, ele prevê que a reconstrução do país será difícil. "Mas vai ser rápida. E os responsáveis por ela devem ser justos. Não há Justiça com impunidade."

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