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Fernández repete Kirchners com posse no Congresso, e não na Casa Rosada

27.out.2019 - Cristina Kirchner e Alberto Fernández na comemoração em Buenos Aires da vitória de sua chapa na eleição presidencial da Argentina - Martin Zabala - 27.out.2019/Xinhua
27.out.2019 - Cristina Kirchner e Alberto Fernández na comemoração em Buenos Aires da vitória de sua chapa na eleição presidencial da Argentina Imagem: Martin Zabala - 27.out.2019/Xinhua

Luciana Taddeo

Colaboração para o UOL, em Buenos Aires

10/12/2019 04h00

Resumo da notícia

  • Passagem da faixa e do bastão presidencial para Fernández será no Congresso
  • A cerimônia do ex-presidente Mauricio Macri foi realizada na Casa Rosada
  • A Constituição argentina nada diz sobre o local onde os atributos devem ser entregues
  • Cristina acabou não participando da cerimônia de posse de Macri
  • A faixa e o bastão foram entregues, na Casa Rosada, por Federico Pinedo, presidente do Senado que assumiu interinamente a presidência da Argentina

Parte da cerimônia de posse do presidente eleito da Argentina, Alberto Fernández, e de sua vice, Cristina Kirchner, nesta terça-feira (10), será diferente da realizada quando Mauricio Macri chegou ao poder. Há 4 anos, a passagem da faixa e o bastão presidencial para ele foi realizada na Casa Rosada, sede do governo argentino e motivo de briga.

Desta vez, a transferência dos atributos presidenciais – faixa e bastão – será feita no próprio Congresso, após o juramento de Fernández e de Cristina, e do discurso do novo presidente. Alegando respeito à tradição, Macri voltou a levar, em sua posse, essa parte da cerimônia para a Casa Rosada, onde ocorreu tradicionalmente até a chegada de Néstor Kirchner ao poder em 2003.

A ex-presidente, no entanto, queria que a passagem da faixa e do bastão fosse realizada como nas três posses anteriores, com a entrega no próprio Congresso, onde o juramento e o discurso presidencial são realizados. Diante da divergência, Cristina disse na época que Macri gritou com ela no telefone. “O que está acontecendo com algo tão simples como uma transmissão do poder?”, questionou.

"Tentei lhe explicar que depois que ele jura eu não sou mais presidenta e que por isso tenho que entregar a faixa e o bastão para ele assim que ele terminar de jurar, de forma simultânea, e é aí que me diz, muito bravo, que eu tenho que acompanhá-lo – e volta a repetir para mim – porque é ‘sua cerimônia’", descreveu a então presidente como parte da ligação.

A discórdia sobre o local da faixa e do bastão ocorre porque a Constituição argentina somente regula que o juramento deve ser conduzido pelo presidente do Senado diante dos legisladores, porém nada diz sobre o local onde os atributos devem ser entregues.

Cristina acabou não participando da cerimônia de posse de Macri e a faixa e o bastão foram entregues, na Casa Rosada, por Federico Pinedo, presidente do Senado que assumiu interinamente a presidência da Argentina na meia-noite anterior para passar poder para Macri.

"A presidente não é obrigada a entregar o bastão, é um gesto de cortesia protocolar, mas não tem uma lei a respeito disso", diz Raúl Aragón, diretor do programa de Estudos de Opinião Pública da Universidade Nacional de La Matanza. Para ele, no entanto, Cristina "não queria entregar o bastão, ela não podia tolerar que fosse para ele".

Em seu livro de reflexões “Sinceramente”, publicado em abril, a ex-presidente afirmou que pensou muitas vezes na possível foto, no Congresso, entregando os atributos a Macri. “Eu pensava e meu coração apertava”, revelou, contando como imaginou que faria nesta situação, porém sem descrever que colocaria a faixa nele, como é o costume: “Eu tirava a faixa e a depositava suavemente, com o bastão, sobre o estrado da presidência da assembleia, o cumprimentava e me retirava”, escreveu.

O historiador Luis Alberto Romero concorda que a ex-presidente “queria evitar que fosse ela quem entregasse a faixa presidencial para o Macri”. E lembra da posse de 2011 de Cristina que acabava de ser reeleita, e em vez de receber a faixa do integrante de alguma instituição, recebeu da filha, Florencia Kirchner. Para ele, isso “saía de qualquer protocolo republicano e entrava no campo do monárquico” e evidencia que ela tinha questões em relação a quem passaria a faixa.

Aragón ressalta, porém, que Macri também temia que o Congresso se enchesse de militantes kirchneristas que o insultassem e que preferia que esta parte da cerimônia fosse realizada na Casa Rosada, onde o público é mais reduzido. Ao mesmo tempo que Fernández optou por realizar novamente a passagem dos atributos no Congresso, “porque é um presidente peronista, que representa o setor popular e o Congresso representa o povo”, Macri acabou aceitando “para se diferenciar de Cristina”, avalia Aragón.

Outro episódio que marcou a tensão da transição entre o governo da ex-presidente para o de Macri foi o perfil oficial da Casa Rosada no Twitter, à época com mais de 300 mil seguidores. Como o usuário e a senha nunca foram entregues para os membros no novo governo, a administração que assumiu em 2015 acabou tendo que criar um novo perfil.

Para mostrar diferença em relação à gestão anterior, após as 23h desta segunda-feira, que foi o último dia do mandato de Macri, essa nova conta, hoje oficial, publicou uma postagem informando: “A partir deste momento, a conta oficial da Casa Rosada passa a ser administrada pela nova gestão”.