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O que é Talibã e por que tomaram o poder no Afeganistão 20 anos depois

Carolina Marins

Do UOL, em São Paulo

15/08/2021 15h23

O grupo fundamentalista Talibã tomou hoje a capital do Afeganistão, Cabul, em sua maior movimentação em quase 20 anos. A tomada foi feita sem muita resistência, indicam relatos vindos do país, depois de uma semana inteira de avanços em direção a Cabul.

Até ontem, o grupo vinha conquistando províncias nos arredores da capital, na estratégia de formar um cerco. A conquista de Cabul ocorreu na manhã de hoje (horário de Brasília), com o atual presidente do Afeganistão, Ashraf Ghani, e seu vice, Amrullah Saleh, fugindo para o Tajiquistão.

Esta é a primeira vez desde outubro de 2001 que o grupo volta à capital. O risco de tomada de Cabul já era alertado por especialistas, que viam com apreensão a saída total das tropas americanas do Afeganistão depois de 20 anos de ocupação.

O que é o Talibã?

A formação do Talibã remonta aos anos 90, quando mujahideens afegãos e guerrilheiros islâmicos se uniram para combater a ocupação soviética no Afeganistão. A própria CIA (Agência de Inteligência Central) dos Estados Unidos é apontada como uma das apoiadoras da formação do grupo na época.

Entre 1992 a 1996, os combatentes lutaram contra outros grupos mujahideens rivais, até a tomada de Cabul, do então presidente Burhanuddin Rabbani. A partir de então, o grupo controlou 90% do país até 2001.

A queda se deu na esteira dos atentados de 11 de setembro nos EUA. Na época, o governo americano enfrentava outro grupo extremista, a Al-Qaeda, do então líder Osama bin Laden.

Em 1999, o Conselho de Segurança da ONU (Organização das Nações Unidas) adotou uma resolução que vinculou Al-Qaeda ao Talibã como entidades terroristas e impôs diversas sanções contra os grupos.

Em 11 de setembro de 2001, membros da Al-Qaeda sequestram quatro aviões, jogando dois no World Trade Center em Nova York, um no Pentágono em Washington DC e o último em um campo em Shanksville, na Pensilvânia.

O então presidente americano, George W. Bush, declarou "guerra ao terror", prometendo caçar Osama bin Laden no Afeganistão. O republicano falou diretamente ao Talibã, ao pedir que o grupo "entregasse às autoridades dos Estados Unidos todos os líderes da Al-Qaeda que se escondem em sua terra", ameaçando com "o mesmo destino" a eles, caso não o fizessem.

Suspeitando que o Talibã estivesse abrigando Bin Laden, forças americanas e britânicas bombardearam o país em outubro do mesmo ano. Logo em seguida, em uma incursão terrestre, forçaram a retirada dos talibãs das grandes cidades. Bin Laden, no entanto, conseguiu fugir. A ONU convidou depois as principais facções afegãs para formarem um governo provisório.

O grupo se refugiou nas fronteiras do país com o Paquistão e passou os últimos 20 anos buscando formas de retomar o poder.

Por que conquistaram Cabul agora?

Após os atentados, a presença das tropas americanas no Afeganistão só aumentou, causando reprovação da população do país, que foi cada vez mais abandonando o apoio à "guerra ao terror".

Com a saída de Bush e entrada do democrata Barack Obama ao poder, a retirada das tropas do Iraque e Afeganistão foi ganhando apoio popular. O governo Obama foi marcado por tentativas de acelerar a retirada do Exército do Afeganistão, mas com temores sobre o vácuo de poder que poderia deixar. Ao mesmo tempo, acordos com o Talibã avançavam e regrediam, com diversos ataques ocorrendo nas regiões de fronteira com o Paquistão.

O republicano Donald Trump, quando foi eleito, em 2016, fez a promessa de acabar com "as guerras infinitas" e de tirar as tropas americanas do Iraque e do Afeganistão. Enquanto isso, os ataques do Talibã em Cabul se intensificaram.

Foi a época em que os EUA fizeram o maior avanço no sentido de um acordo de paz com as forças afegãs. Assinado no início de 2020, tinha, dentre vários termos, uma completa retirada das forças americanas em troca de o país não mais se tornar um refúgio de terroristas.

Havia um grande obstáculo: fazer o Talibã e o governo afegão concordarem. A retirada precoce das tropas americanas causava o temor em analistas e no povo afegão de uma nova escalada da violência. Além disso, o histórico de nunca ter cumprido promessas jogava suspeitas sobre o Talibã.

Em 14 de abril de 2021, o presidente Joe Biden, do exato mesmo lugar onde Bush havia declarado a guerra ao terror 20 anos, anunciou a retirada das tropas até o fim deste mês.

Agora sou o quarto presidente dos Estados Unidos a presidir a presença de tropas americanas no Afeganistão: dois republicanos e dois democratas. Não vou passar essa responsabilidade para um quinto.
Joe Biden em 14 de abril

Ainda restavam cerca de 3.500 soldados americanos no Afeganistão, que deveriam ser retirados independentemente de um progresso nas negociações de paz. Ontem, porém, o presidente anunciou a chegada de mais tropas para tentar conter o avanço do grupo terroristas. Somando aos mais de 3 mil no local, chegariam mais mil enviados dos EUA e outros mil deslocados do Kuwait.

Hoje, conforme o grupo avançava sobre Cabul, o corpo diplomático americano foi retirado às pressas por helicóptero.