'Não sei se volto vivo': brasileiro morto na Ucrânia revelou medo em áudio
Aliado das tropas ucranianas, o combatente brasileiro Douglas Búrigo, 40, disse ter perdido um colega de farda em combate e revelou medo em áudio enviado a um amigo pelo WhatsApp dias antes de morrer.
Ele estava dentro do alojamento do seu pelotão na cidade de Kharkiv com Thalita do Valle, que também morreu após bombardeio russo na tarde de quinta-feira (30). Já são três casos de brasileiros mortos na guerra da Ucrânia —André Hack foi morto em um combate na madrugada de 5 de junho.
Procurado pelo UOL, o Itamaraty (Ministério das Relações Exteriores) não se manifestou sobre o relato das mortes de Douglas e Thalita até a publicação desta reportagem. O órgão levou quatro dias para confirmar a morte de André. A família de Douglas disse ter sido procurada pela embaixada brasileira na Ucrânia.
Tô apavorado aqui já. Abateram um colega nosso aqui. Meu Deus do céu, cara! O cara se foi... Rapaz, eu vou te falar bem a verdade. Não sei se eu volto vivo pro Brasil. Mas, se eu não voltar vivo, eu quero que vá a bandeira [do Brasil] pra mim. Não tem quem aguente, é muita bala."
Douglas Búrigo, em áudio enviado a um amigo
Em outro registro, feito em vídeo e repassado a amigos, Douglas registrou a solidariedade do povo ucraniano, mostrando os combatentes se alimentando. "A cada parada que a gente faz, o pessoal doa alguma coisa pra gente. Agora, doaram morango, batata e repolho."
Como foi ação que matou Douglas e Thalita
Segundo relato repassado ontem por chamada de vídeo à família de Douglas, a tropa conseguiu fugir do alojamento após os primeiros bombardeios atingirem o local. No entanto, Douglas retornou ao perceber que Thalita não havia saído. Foi nesse momento, ainda de acordo com a família, que mísseis atingiram a unidade.
"O comandante do pelotão nos informou que a tropa conseguiu escapar depois do primeiro bombardeio. Mas o Douglas voltou para buscar a companheira de farda, que ficou para trás. Foi quando os mísseis atingiram em cheio o alojamento. Explodiu tudo", lamentou o empresário Carlos dos Reis, cunhado de Douglas.
Natural de Uruguaiana (RS), Douglas foi militar do Exército brasileiro. Nos últimos anos, passou a morar com os pais na cidade de São José dos Ausentes, também no Rio Grande do Sul, onde era dono de uma borracharia.
Ele deixou o Brasil ao embarcar em um voo no aeroporto internacional de Guarulhos (SP) em 24 de maio. No dia seguinte, pisou pela primeira vez no país invadido. O combatente brasileiro tinha uma filha de 15 anos.
Cunhado de Douglas, o empresário Carlos dos Reis diz que a família tentou convencê-lo a não se alistar junto às tropas ucranianas. "Mas não adiantou. A ideia dele era ir à Ucrânia para ajudar na reconstrução do país", relata.
Segundo o relato de combatentes, os caminhos de Douglas e Thalita se cruzaram na Ucrânia, quando ele ainda buscava uma oportunidade para se alistar junto às tropas ucranianas.
"A Thalita levou um dinheiro para ele e o indicou para o pelotão [onde ele se alistou]. Depois, ela foi para um batalhão da Geórgia [país do Leste Europeu]. Não deu certo, e ela passou a integrar a mesma unidade de Douglas", disse o ex-militar Fabio Júnior de Oliveira, 42, que também esteve na Ucrânia.
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