Votos de hispânicos, negros e outros grupos podem garantir vitória de Obama

M. Á. Bastenier

  • Tony Dejak/AP

    O presidente Barack Obama discursa durante evento de campanha no aeroporto de Burke Lakefront, em Cleveland, no Estado de Ohio

    O presidente Barack Obama discursa durante evento de campanha no aeroporto de Burke Lakefront, em Cleveland, no Estado de Ohio

Em todos os processos políticos há assuntos dificilmente mencionáveis, mas nem por isso irrelevantes. No confronto Obama-Romney pela presidência dos EUA são a cor do presidente democrata e a religião do aspirante republicano. E o manto de silêncio foi aplicado em ambos os casos com razoável disciplina.

Na semana passada o republicano John Sununu se atreveu a dizer que as eleições de 6 de novembro levarão em conta o fator racial, e as demonstrações de santa indignação foram imediatas.

Mas as estatísticas não enganam: o último candidato democrata a ganhar com uma maioria de votos da população branca foi o presidente Johnson em 1964, quando os eleitores de outras raças eram muito menos numerosos.

Eleições 2012 nos EUA
Eleições 2012 nos EUA

John Kerry só obteve 41% do voto euro-americano, apesar de que o democrata ter por acréscimo a ousadia de falar francês. E nas eleições que ganhou há quatro anos Barack Obama teve de se contentar com 47% do voto branco, contra 53% de seu adversário, John McCain. Mas o que fez a diferença foram os 69% de eleitores hispânicos que optaram pelo presidente. Em uma pesquisa publicada por "The New York Times" na última segunda-feira (22), 51% dos americanos se declaravam racistas. E apesar de as pesquisas darem a Obama unicamente 41-42% desse voto, contra os 58% do mórmon, novamente a soma de hispânicos, negros e outras etnias poderia lhe bastar para repetir a vitória.

O fato de Romney ser um bispo mórmon é algo que não se comenta, mas que tampouco ninguém ignora, e uma parte de católicos e protestantes evangélicos abriga sérias dúvidas de que a Igreja Mórmon faça parte do cristianismo. Ninguém que não seja cristão tem facilidade para chegar à Casa Branca. A hostilidade das igrejas evangélicas em relação ao catolicismo diminuiu com o passar do tempo, o que parece corroborado pela designação dos candidatos à vice-presidência, o democrata Joseph Biden e o republicano Paul Ryan, ambos membros da Igreja Católica, mas em 1960, quando foi eleito o único presidente católico dos EUA, John F. Kennedy, sua afiliação religiosa esteve muito presente e não exatamente a favor.

Esses fatores antropológicos podem desempenhar em 2012 um papel relativamente significativo nestas eleições em que a pobreza de programas é notória. Obama só promete fazer o que não fez nos quatro primeiros anos, e Romney desfazer inclusive o que não se fez. Eric Alterman, na publicação liberal "The Nation", qualificou o programa republicano de "tsunâmi de legislação regressiva", que provavelmente seria protegido pela nomeação de numerosos militantes da extrema-direita republicana, o Tea Party, para cobrir os 3.000 empregos federais que a presidência designa diretamente, assim como uma redução de impostos de US$ 10 bilhões nos próximos dez anos; o aumento das forças armadas em 100 mil efetivos; e o acréscimo de seis navios de guerra por ano para reforçar os 286 existentes, a um custo total de US$ 2 bilhões.

Os assuntos de política externa quase não preocuparam os candidatos, o que não estranha porque em uma pesquisa nacional só 4% afirmaram se interessar prioritariamente pelo mundo, mas também pode ter a ver com o recuo planetário da grande potência americana. No debate dedicado a essas questões, a Europa não deu sinais de vida; a América Latina apenas foi mencionada por Romney como "oportunidade de mercado"; e só o Oriente Médio levou a parte do leão, com ambos os candidatos competindo para ganhar o troféu de melhor amigo de Israel. 

O presidente tem como programa de fato a retirada da Ásia Central; uma solução diplomática para o conflito com o Irã; a guerra contra a Al Qaeda e substitutos na zona fronteiriça entre Afeganistão e Paquistão por meio de "drones", aparelhos voadores não tripulados que permitem poupar vidas próprias; e uma reorientação para o Pacífico, onde desponta um embrião de guerra fria com a China.

Votara naquilo que mais se parece conosco, tanto por raça como por religião, não transforma necessariamente o cidadão em racista ou xenófobo religioso. Os EUA já deram um grande passo para combater esse preconceito, tão comum ao resto do planeta, com a eleição do afro-americano Obama em 2008. E na terça-feira (6), além do que determine a situação da economia, que sempre será um fator decisivo, o eleitorado poderá ratificar aquela primeira vitória ou decantar-se por outra minoria americana. 

Tradutor: Luiz Roberto Mendes Gonçalves

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