Para o NYT, 'Jair Bolsonaro é a face do populismo no fórum de Davos'
O presidente dos EUA, Donald Trump, é o maior ausente neste ano na reunião do Fórum Econômico Mundial. Mas o novo líder brasileiro, Jair Bolsonaro, cujo apelido em seu país é "o Trump dos trópicos", chegou na terça-feira (22) para assumir o manto populista.
Assim como fez Trump quando chegou a Davos no ano passado, Bolsonaro tentou aparar as arestas da mensagem rebelde que o projetou à Presidência no ano passado. Ele vendeu o Brasil ao público abastado reunido nesta estação de esqui nos Alpes como um bom lugar para fazer negócios, um país comprometido com o fim da corrupção e a revisão de regras.
Mas Bolsonaro também disse que o Brasil expurgará a ideologia de esquerda de sua política e sua sociedade e não pediu desculpas por enfatizar o crescimento econômico, algo que segundo seus críticos virá ao custo de desproteger o meio ambiente.
"Nós representamos um ponto de inflexão aos olhos da população brasileira. Um ponto de inflexão em que o viés ideológico não terá mais lugar", disse Bolsonaro em um breve discurso à sala lotada, que foi recebido com aplausos formais. "Nosso lema é: Deus acima de tudo."
O pronunciamento inicial de Bolsonaro definiu o tom da reunião de Davos, sem os habituais líderes americano e europeus, que lutam com forças políticas da América Latina à Europa que são marcadamente contrárias ao mote desta conferência, de cooperação global e uma ordem mundial liberal.
Com seus instintos nacionalistas, o estilo de homem-forte e um histórico de declarações rudes sobre mulheres, gays e grupos indígenas, Bolsonaro é de muitas maneiras a antítese do "homem de Davos", termo que já foi usado para descrever o tipo de pessoa que participa da conferência anual.
Ex-oficial do Exército, 63 anos idade, sua vitória simbolizou a frustração dos brasileiros com a elite governante corrupta. Bolsonaro agiu rapidamente desde que tomou o poder para afrouxar as restrições à posse de armas, conter os direitos de gays e lésbicas e colocar grupos da sociedade civil sob controle mais rígido.
Em novembro, a pedido de Bolsonaro, o Brasil retirou sua promessa de sediar a cúpula global da ONU em 2019 sobre mudança climática. Durante a campanha eleitoral, muita gente temeu que ele saísse do acordo climático de Paris, o que ainda não fez.
Na terça, Bolsonaro insistiu que o Brasil "trabalharia em harmonia com o mundo, em sincronia com o mundo" para reduzir as emissões de carbono, mas não mencionou o acordo. "Os que nos criticam têm muito a aprender conosco", acrescentou.
Bolsonaro e Trump cultivaram-se assiduamente, e os paralelos entre eles são às vezes marcantes. Bolsonaro gabou-se de vencer "apesar de ter sido atacado injustamente o tempo todo", repetindo o aviltamento da mídia denunciado por Trump.
Embora estivesse falando em uma sala aquecida no hotel, Bolsonaro usava um casaco de inverno longo. Trump também os prefere, e recentemente foi fotografado usando um desses na Sala de Jantar de Estado, posando com uma mesa de fast food oferecida ao time de futebol da Universidade Clemson.
Depois que Bolsonaro assumiu o cargo, Trump tuitou: "Parabéns ao presidente Jair Bolsonaro, que acaba de fazer um ótimo discurso de posse. Os EUA estão com você!"
Bolsonaro respondeu rapidamente: "Juntos, sob a proteção de Deus, traremos prosperidade e progresso à nossa população!"
Trump, cuja presença dominou a reunião em Davos no ano passado, cancelou sua visita neste ano por causa da paralisação do governo. Ele cancelou a viagem do resto da delegação americana alguns dias depois, ao negar a Nancy Pelosi, presidente da Câmara, e a outros legisladores o direito de usar um avião militar para voar ao Afeganistão e a Bruxelas.
Os que queriam saber do governo Trump tiveram de se contentar com uma aparição em vídeo do secretário de Estado, Mike Pompeo, que falou da varanda do Departamento de Estado, com o Memorial a Lincoln sobre seu ombro esquerdo.
Pompeo apresentou um resumo fiel da política externa de Trump, "a América primeiro", com palavras duras para o Irã e a China. Ele disse à plateia que o tipo de disrupção de Trump era uma resposta saudável aos eleitores que tinham evitado políticos mais tradicionais, e refletia rebeliões políticas no Reino Unido, na França, na Itália e no Brasil.
A primeira-ministra do Reino Unido, Theresa May, que está enfrentando o caos pela saída do Reino Unido da União Europeia, e o presidente Emmanuel Macron, da França, que enfrenta uma onda de inquietação dos manifestantes de "Coletes Amarelos", faltaram ao encontro neste ano.
Pompeo disse que os críticos do governo Trump não estão preparados para enfrentar o desafio de reformar as instituições internacionais como a ONU. "Mas o presidente Trump está", disse ele.
Perguntado sobre se os EUA estão isolados, Pompeo afirmou: "Não acho que estejamos nem um pouco isolados".
Mas os sinais de uma ordem mundial em mutação ficaram claros nas ruas cobertas de neve de Davos. Enquanto baluartes do Vale do Silício como Facebook e Salesforce ainda montam pavilhões reluzentes para promover sua presença, o maior outdoor pertencia à Arábia Saudita, que ocupou a lateral de um hotel para incentivar os visitantes a investir no reino.
A conferência de investidores da Arábia Saudita, conhecida como Davos no Deserto, foi alvo de uma onda de cancelamentos em outubro, depois que relatos da inteligência ligaram o patrono da conferência, príncipe Mohammed bin Salman, ao assassinato do jornalista saudita Jamal Khashoggi.
Nas ruas havia anúncios do Fórum Econômico Internacional de São Petersburgo, a resposta do presidente russo, Vladimir Putin, a Davos. Embora poucas autoridades chinesas tenham comparecido aqui, as sessões dedicadas à economia chinesa, como a Iniciativa Cinturão e Estrada, atraíram os maiores públicos.
Os EUA mantiveram um perfil discreto neste ano, mas continuaram projetando uma longa sombra sobre a reunião. Analistas econômicos citaram a guerra comercial de Trump com a China como culpada por cortar suas previsões de crescimento econômico global.
E analistas de política externa disseram que o estilo instável de Trump continua sendo a maior fonte de risco no mundo.
"Se você contesta o sistema internacional, precisa de alguma coisa para pôr no lugar", disse Karin von Hippel, ex-autoridade do Departamento de Estado que hoje é diretora-geral do Instituto Real de Serviços Unidos, em Londres. "Não parece haver um plano."
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