Incêndio que já destruiu 26% da Chapada dos Veadeiros 'foi causado por ação humana', diz chefe do parque
O maior incêndio que já atingiu o Parque Nacional da Chapada dos Veadeiros, uma das mais importantes unidades de conservação do Brasil, já dura oito dias e destruiu 64 mil hectares, ou 26% de sua área total - o equivalente à metade da área do município do Rio de Janeiro. Ao menos 200 pessoas trabalham 24 horas por dia no local na tentativa de conter as chamas, ainda sem controle.
Em entrevista à BBC Brasil, o chefe do parque, Fernando Tatagiba, afirma que o início do fogo foi um ato criminoso. "Não existe a possibilidade de combustão espontânea nessa região e 100% dos incêndios na seca no Cerrado são provocados pelo homem. O local onde ele começou deixa claro que o incêndio foi uma ação humana", disse.
O chefe do parque se refere ao ponto de início das chamas, à margem da rodovia GO-239, que liga a cidade de Alto Paraíso ao vilarejo São Jorge. Além de ser um ponto estratégico para a fuga do suposto autor do incêndio, o local facilitou a propagação das chamas.
"O que mais chamou a atenção foi que o fogo começou justamente dentro do aceiro (retirada de vegetação) que fizemos para evitar que incêndios externos atingissem o parque, no momento em que o vento estava soprando na direção do parque", explica.
Segundo Tatagiba, não existe causa natural possível para as chamas, o que significa que a tragédia foi provocada.
"A única causa (natural) de incêndios no cerrado são raios. E a época de incidência deles é no período de chuvas, mas não tivemos tempestades nesse último mês ou queda de raios", afirma Tatagiba.
Oito dias de incêndio
O combate às chamas foi mais eficaz no último dia. Duas das linhas de fogo foram controladas na região do Rio das Cobras e outra linha segue para uma área que já foi atingida, próxima ao Morro da Baleia. Restam três frentes de trabalho: duas ao norte do parque e outra na região do Rio São Miguel.
Além dos 110 brigadistas e mais de 90 pessoas que auxiliam a logística do combate às chamas, ajudam no trabalho cinco aviões-tanque do ICMBio, helicópteros do Ibama, Polícia Rodoviária Federal, Corpo de Bombeiros de Goiás e Polícia Militar do Distrito Federal.
Tatagiba conta que mesmo quando não é proposital, incêndios do tipo são considerados crime, que gerou indiciamento de moradores locais por suposta participação na proliferação das chamas.
O chefe do parque diz que não tem elementos para dizer quem é o autor do incêndio atual e que a identificação será estabelecida após perícias e investigações.
O incêdio acontece após a expansão do parque, em junho deste ano, quando passou de 65 mil para 240 mil hectares. A área destruída agora já equivale, em tamanho, às antigas dimensões da unidade.
Solidariedade e recuperação
Embora o inventário de perdas não tenha sido completado, o chefe do local assegura que as dimensões da tragédia são impressionantes e que algumas áreas demorarão anos para se recuperar.
"A regeneração natural é muito heterogênea. É um mosaico com diferentes formações vegetais. Algumas espécies até convivem bem com o fogo, enquanto outras são extremamente sensíveis. A resposta de cada uma é diferente, mas é certo que algumas delas necessitarão de cuidados a longo prazo para voltar ao que eram antes", diz Fernando Tatagiba.
Por outro lado, o chefe do parque diz que a mobilização pública e nas redes sociais em torno do incêndio deixará um legado para os próximos anos. "Essa catástrofe vai deixar um saldo de organização pública que vamos usar numa ação de longo prazo. Vamos construir brigadas comunitárias com mais equipamentos de proteção, comunicação e treinamento", afirma.
A página Rede contra fogo - Chapada dos Veadeiros, no Facebook, concentra a maior parte as doações feitas pelos voluntários e ambientalistas que atuam contra o incêndio.
Além de combustíveis e alimentos para os combatentes, o dinheiro arrecadado ali é usado para comprar equipamentos modernos, como os turbosopros, que apagam as chamas com a velocidade equivalente a dez brigadistas.
O Parque Nacional da Chapada dos Veadeiros tem centenas de nascentes, cursos d'água e rochas com mais de um bilhão de anos. Segundo o ICMBio, o local é abrigo de espécies ameaçadas de extinção ou endêmicas (que só existem no local), como o cervo-do-Pantanal, lobo-guará, pato-mergulhão e a onça-pintada - maior mamífero carnívoro da América do Sul.
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