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Para formar democratas, Direito Eleitoral deve ser obrigatório na faculdade

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Roberta Maia Gresta e Luiz Fernando Casagrande Pereira*

Colunistas convidados

16/05/2023 04h00

O CNE (Conselho Nacional de Educação) estuda aprovar proposta que torna o Direito Eleitoral disciplina obrigatória nos cursos de graduação em Direito no Brasil.

O pedido, formulado pela Abradep (Academia Brasileira de Direito Eleitoral e Político), conta com a adesão da OAB (Ordem dos Advogados do Brasil), de inúmeras Faculdades de Direito e de quase todas as entidades relevantes da área.

Formou-se um consenso nacional em torno da proposta, é possível dizer. Importante registrar que há muito tempo se exige Direito Eleitoral nos concursos de juízes e promotores e, mais recentemente, a matéria passou a ser cobrada na primeira fase do próprio exame da OAB.

Mas, afinal, o que leva a uma mobilização tão expressiva para a aprovação da proposta que agora tramita no CNE? A resposta é que se constatou que a disciplina é fundamental para formar profissionais do Direito profundamente comprometidos com a democracia e a cidadania.

No Brasil, desde a redemocratização, apostamos no Direito Constitucional para cumprir essa tarefa. Houve, sem dúvida, há êxito na abordagem dos direitos individuais e sociais, da organização do Estado e das ações constitucionais. Futuras e futuros juristas aprendem cedo a importância da Constituição de 1988 para "construir uma sociedade livre, justa e igualitária".

Deixou-se, no entanto, em uma prateleira abaixo a importância de que juristas tenham familiaridade com os direitos políticos e saibam atuar no processo eleitoral. Muitas e muitos profissionais se formam sem qualquer contato com essas matérias. Como se escolher pessoas que exercem dois dos três Poderes da República fosse algo apenas do mundo da política, e não do Direito.

Isso tem reflexos maiores do que limitar o exercício da profissão. Difunde uma percepção de que eleições são procedimentos burocráticos, banais e, até mesmo, sem regras. Para alguns, um vale-tudo, com a possibilidade de sempre se dar um jeitinho para que no final o mais forte leve a melhor. Falta formação jurídica apropriada em Direito Eleitoral e Político, reconhecem todos.

Especialmente após o que se viu em 8 de janeiro de 2023, é essencial superar essa percepção. Dar ao Direito Eleitoral um espaço de prestígio na grade curricular das graduações em Direito sinaliza um compromisso com o processo eleitoral democrático, reconhecendo-o como única via jurídica para a escolha de parlamentares e governantes.

Na Espanha, por exemplo, coube a Pablo Lucas Verdú assegurar, em tempos sombrios da ditadura franquista, que a política não perdesse seu vínculo com o jurídico, o que fez lutando para que a cátedra de Direito Político fosse mantida na Ciência Jurídica. Com a redemocratização da Espanha e sua Constituição de 1978, Verdú contestou a preponderância do Direito Administrativo no Direito Público, insistindo em criar uma escola de Direito Constitucional que se manteve firme em analisar os fenômenos políticos sob a ótica jurídica. Hoje, há no país uma firme tradição acadêmica de estudos jurídicos sobre a participação política. É um ótimo exemplo a inspirar o debate aqui no Brasil.

Com certeza, temos como avançar no mesmo sentido, sem ter que enfrentar de novo as sombras do autoritarismo. Tornar o Direito Eleitoral disciplina obrigatória para estudantes de Direito é ensinar-lhes que não há alternativa fora da ordem jurídica democrática para se chegar ao poder. É, enfim, dar um passo importante na consolidação da democracia brasileira.

*Roberta Maia Gresta - doutora em Direito Político (UFMG), membra da Abradep.

*Luiz Fernando Casagrande Pereira - doutor em Direito das Relações Sociais (UFPR), membro da Abradep.