Candidato pelo PSOL, Boulos defende liberdade de Lula e cita Marielle
Luís Adorno
Do UOL, em São Paulo
-
Gabriela Biló/Estadão Conteúdo
"Nós, indígenas, nem estatística a gente é", disse a líder indígena Sônia Guajajara, que foi escolhida como vice
À sombra de uma decisão do PT, o coordenador nacional do MTST (Movimento dos Trabalhadores sem Teto), Guilherme Boulos, foi lançado pelo PSOL como candidato à Presidência da República em uma convenção realizada pelo partido, em São Paulo, na tarde deste sábado (21). Como vice, Boulos terá Sônia Guajajara, a primeira indígena a compor uma chapa para a disputa presidencial. Boulos defendeu a liberdade de Lula, criticou adversários como Geraldo Alckmin (PSDB) e Jair Bolsonaro (PSL) e homenageou a vereadora morta Marielle Franco.
Veja que partidos já fizeram suas convenções:
- PDT lança Ciro Gomes
- PSC lança Paulo Rabello de Castro
- PMN rejeita candidatura de ex-apresentadora Valéria Monteiro
"Esta candidatura condena e não aceita a prisão política de Lula. Não é uma questão de candidatura do Lula ou do PT, é uma questão de democracia", discursou após ser oficializado candidato.
"Nossa candidatura é para valer. Não está em função de qualquer outra candidatura existir. Nós defendemos o direito do Lula ser candidato porque entendemos que foi vítima de condenação injusta e sofreu uma prisão política. O PT tem o seu candidato e é o Lula", disse em entrevista a jornalistas após a convenção.
Boulos relembrou a morte da vereadora Marielle Franco, que era filiada ao PSOL. Segundo ele, o crime foi uma continuação do golpe à democracia no Brasil. "Enquanto não houver essa justiça, a democracia brasileira permanecerá manchada", disse.
"[Me perguntam] Como quer ser presidente se anda do lado de sem-teto? Digo com muito orgulho que ando do lado de sem-teto, sem-terra, só não andamos ao lado dos sem vergonhas", afirmou. "Queiram eles ou não, vamos mudar a política habitacional deste país, porque trabalhador pode morar bem também e tem direito", complementou.
Boulos afirmou que a chapa lançada é fruto de uma decisão de fazer uma aliança entre partidos políticos e movimentos sociais. "Estou aqui hoje porque devo muito a esses companheiros [do MTST]", disse.
Alfinetando Ciro Gomes, Boulos rechaçou apoio do "centrão", que após flerte com o pedetista, decidiu por coligar-se com o tucano Geraldo Alckmin. "Esse centrão é a turma do Eduardo Cunha, é o partido da corrupção do Brasil, do toma lá, dá cá, balcão de negócios. Vão para a oposição porque não queremos nada com essa turma", afirmou.
No discurso, o psolista defendeu pautas de esquerda, como a descriminalização do aborto e revisão da militarização da polícia. "Nossa campanha não vai ter medo de defender o aborto neste país, que é um tema de saúde pública, porque isso é defender a vida da mulher. As mulheres estão morrendo. Principalmente as mais pobres. Olha a vitória da Argentina. O tema tem que vir à tona", declarou.
Sobre segurança pública, Boulos disse que deve "rever o modelo de segurança e de polícia. Política de guerra às drogas não atingem os verdadeiros donos dos negócios", anunciou. "Nos preocupamos muito com o papel dos militares na política brasileira. O comandante do Exército chamou pré-candidatos para sabatinar. A Força Militar está subordinada ao povo brasileiro. E assim que tem que ser. Não vamos bater continência para ninguém. Queremos trazer para debate uma ferida ainda aberta, que são os crimes ocorridos na ditadura."
Em entrevista coletiva, criticou o capitão da reserva Jair Bolsonaro e o tucano Geraldo Alckmin. "O atraso se chama Jair Bolsonaro. É o candidato da agressão às mulheres, que faz apologia ao estupro, que usa crianças para fazer apologia à violência. Ele será um candidato de atraso para a população", disse.
"O mercado representa Geraldo Alckmin. Alckmin é [Michel] Temer. Representa o mesmo projeto de retirada de direitos. O PSDB é base do governo, com ministros", declarou. "O 'centrão' não deveria ser disputado por aqueles que têm compromisso com a democracia. Deveria ser combatido por quem tem compromisso com a democracia. Em relação ao Geraldo Alckmin, tenho que dizer que eles se merecem."
Sonia Guajajara, acompanhada de indígenas e familiares, afirmou que "vivemos tempo que querem escola sem partido, mas aprovavam o veneno que vai para nossa mesa. Temos o maior número de travestis e transexuais mortos anualmente. Não vai mais caber mulheres vítimas de homicídio. Não vai mais caber violência doméstica", disse.
"Nós indígenas, nem estatística a gente é. No nosso socialismo não vai mais caber que jovens negros e negras da periferia sejam mortos e que os crimes fiquem impunes", complementou. "A gente vai trazer o campo e a cidade para enfrentar os poderosos", afirmou.
Boulos diz que integrantes de movimentos sociais são vítimas de preconceito da sociedade. "São pessoas que todo final do mês tem que escolher entre pagar o aluguel ou a comida do filho. O que dizer dessa pessoa? Ninguém ocupa porque quer. As pessoas ocupam por falta de oportunidade. O que nós vamos fazer é cumprir o estatuto das cidades e construir moradias populares."
Relação com Lula
Segundo a última pesquisa Datafolha, divulgada em junho deste ano, apenas 1% da população tinha intenção de votar em Boulos. Mas o PSOL olha para outro dado de uma pesquisa de abril deste ano. Segundo o levantamento, dois de cada três eleitores do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva devem votar em quem ele indicar, caso não dispute o pleito.
Em um cenário com Lula, o petista lidera as intenções de voto, com 30%. Em seguida, vêm Jair Bolsonaro (PSL), com 17%, Marina Silva (Rede), com 10%, e Geraldo Alckmin (PSDB) e Ciro Gomes (PDT), com 6%. Sem Lula, Bolsonaro lidera as intenções, com 19%, seguido de Marina (15%) e Ciro (11%).
A relação entre Boulos e Lula é de respeito e cordialidade, assim como a pré-candidata Manuela D'Ávila (PCdoB). Antes de ser preso, em 7 de abril deste ano, Lula subiu num palanque, em frente ao Sindicato dos Metalúrgicos do ABC, em São Bernardo (SP), e acenou aos dois, levantando os punhos de ambos.
Lula disse que os dois pertencem a uma nova geração da esquerda que "ousa" tentar ser presidente.
Com relação ao líder do MTST e agora candidato do PSOL, Lula afirmou naquela ocasião: "Ele só tem 35 anos de idade, e, quando eu fiz a greve de 1978, eu tinha 33 anos. E consegui, através da greve, chegar a criar um partido e virar presidente. Você tem futuro, meu irmão, é só não desistir", disse o ex-presidente. Boulos, por sua vez, se manteve ao lado de Lula antes e depois da prisão.
Boulos se filiou ao PSOL em março deste ano, desbancando nomes como Chico Alencar e Plínio de Arruda Sampaio Jr., que eram cotados, além de Marcelo Freixo, que, apesar de não ter expressado vontade concorrer à Presidência, era um nome bem quisto dentro do partido para a disputa.
Ao todo, 61 membros do diretório nacional do partido participaram da convenção neste sábado. Também marcaram presença parlamentares, pré-candidatos aos governos estaduais, à Câmara dos Deputados, ao Senado e às assembleias legislativas. Militantes do MTST, PCB e organizações indígenas também compareceram.
Na parte da manhã, foi debatido e votado o programa do PSOL para as eleições. À tarde, houve a homologação da coligação com o PCB e a chapa presidencial, que havia sido aprovada pela Conferência Eleitoral Nacional do PSOL, realizada em março deste ano.
A convenção ocorreu um salão de eventos de um hotel do centro de São Paulo. Enquanto integrantes de movimentos de luta por moradia gritavam apoio a Boulos, um representante do hotel afirmou que quem estivesse gritando não iria subir até o salão. Os integrantes dos movimentos passaram a gritar mais forte. No elevador, uma hóspede, que desceu no 16º dos 23 andares do hotel, arrastou sua mala de rodinhas afirmando que "só queria silêncio". Apoiadores de Boulos retrucaram: "acho que não vai rolar".
"Eu não abro mão do presidente que faz ocupação" era o grito.
Os deputados federais Ivan Valente e Chico Alencar criticaram o ato do pré-candidato Jair Bolsonaro pegar uma criança e ensiná-la a fazer um sinal de arma. "Enquanto eles agem com o ódio, nós vamos agir com amor, que é isso que o país precisa", disse Chico.
A veterana deputada Luiza Erundina discursou e disse que a candidatura de Boulos é a "única de esquerda" do país.
Opinião: Alianças de 2018 são prenúncios de escândalos
Receba notícias do UOL. É grátis!
Veja também
- PSOL vai defender alta de imposto dos mais ricos para deter déficit
- Bolsonaro deveria ser preso por defender massacre de sem-terra, diz Boulos
-
- Na Bahia, Boulos defende diversidade de candidaturas de esquerda
- 'União da esquerda no primeiro turno não está colocada', diz Boulos
- Indígena, Sônia Guajajara quer a copresidência: "Vice é mera composição"
- Guilherme Boulos rejeita rótulos