Relator diz que Cunha mentiu sobre contas na Suíça e pede cassação
Quase seis meses após ser aberto o processo no Conselho de Ética, atrasado por manobras de deputados aliados, foi apresentado nesta quarta-feira (1º) parecer favorável à cassação do presidente afastado da Câmara, Eduardo Cunha (PMDB-RJ), acusado de quebra de decoro parlamentar por ter omitido contas na Suíça e por suspeita de recebimento de propina ligada ao esquema do petrolão.
O parecer do relator, deputado Marcos Rogério (DEM-RO), pede a cassação de Cunha por ter omitido a existência de contas na Suíça que teriam sido usadas para o recebimento de propina ligada ao esquema de corrupção na Petrobras. "O deputado Eduardo Cunha mentiu à CPI pois sempre soube e teve conhecimento de que ele era o verdadeiro proprietário do dinheiro”, diz o documento. Rogério afirma que Cunha mentiu não somente quando negou ter contas no exterior, mas também quando afirmou não ter recebido propina ligada ao esquema.
Em março de 2015, Cunha afirmou à CPI (Comissão Parlamentar de Inquérito) da Petrobras não possuir “qualquer tipo de conta” no exterior. Posteriormente, a Procuradoria-Geral da República confirmou a existência de contas na Suíça ligadas a Cunha e sua família.
O texto de Rogério, no entanto, levou em consideração, para pedir a cassação, apenas o dispositivo do Código de Ética que pune com a perda do mandato "omitir intencionalmente informação relevante". Dessa forma, o relator pede a cassação de Cunha por ele ter supostamente mentido ao dizer não possuir contas no exterior e não ter recebido "vantagens indevidas".
O relatório de Marcos Rogério, de 84 páginas, foi dividido em cinco partes: a descrição da tramitação do processo, a resposta a contestações processuais apresentadas pela defesa, duas partes voltadas a analisar os fundamentos jurídicos das acusações e a conclusão do parecer.
O parecer afirma que os investimentos em trusts do peemedebista foram usados para a prática de “fraudes” no ocultamento de bens que tiveram origem em propina.
“A lista de provas a demonstrar a prática de irregularidades graves 'cometidas durante o mandato e que afetaram a dignidade e o decoro do Parlamento é extensa e plural. Diversas destas condutas, por sua vez, foram publicadas em jornais de grande circulação nacional, noticiários de rádio e TV, causando sérios danos à respeitabilidade e credibilidade do Parlamento”, diz a conclusão do parecer.
Digo que não é fácil nem prazeroso para um parlamentar assumir um processo como esse e adotar nesse processo a conclusão que estou adotando. Investigar um colega não é tarefa fácil
Deputado Marcos Rogério (DEM-RO)
Rogério aparentou emoção ao ler o trecho final de seu voto, chegando a interromper a fala por instantes para segurar aparentemente segurar a emoção.
O presidente do Conselho de Ética, José Carlos Araújo (PR-BA), também aparentou visível emoção ao anunciar a concessão de vista e encaminhar o encerramento da sessão, chegando a falar com a voz embargada por instantes.
O relator também afirma que, ao contrário do que diz a defesa de Cunha, a lei brasileira exige que os trusts tivessem sido declarados às autoridades.
“A partir do exame dos documentos compartilhados pelo Supremo Tribunal Federal e Banco Central do Brasil, é possível concluir que, na hipótese analisada, os trusts instituídos pelo deputado Eduardo Cunha representaram, na verdade, instrumentos para tornar viável a prática de fraudes: uma escancarada tentativa de dissimular a existência de bens, sendo tudo feito de modo a criar uma blindagem jurídica para esconder os frutos do recebimento de propinas cujos valores foram relatados por testemunhas e lastreiam a denúncia já recebida do Supremo, também confirmados perante este Conselho”, diz trecho do parecer do relator.
Mais cedo, na comissão, o advogado de Cunha, Marcelo Nobre, afirmou que não há provas de que seu cliente possua contas na Suíça. Já Rogério sustenta ter identificado ao menos três contas naquele país ligadas ao deputado.
A decisão de Rogério de limitar seu parecer foi determinada por imposição de duas decisões do 1º vice-presidente da Câmara, Waldir Maranhão (PP-MA), aliado de Cunha, que determinaram a restrição das investigações à suspeita de omissão das contas Suíças e à possível mentira à CPI. A decisão de Maranhão foi baseada em precedente da própria comissão. Quando aprovou a abertura da investigação, o Conselho de Ética decidiu restringir a investigação às contas suíças, por sugestão do deputado Paulo Azi (DEM-BA). Deputados contrários a Cunha avaliaram, na época, que sem a mudança o processo seria arquivado.
Maranhão determinou que o Conselho não poderia punir Cunha pelo dispositivo do Código de Ética que prevê cassação para o recebimento de "vantagens indevidas", ou seja, propina.
Se aprovado pelo Conselho de Ética, o parecer precisa ser confirmado em votação pelo plenário da Câmara, onde é necessário o apoio de ao menos 257 dos 512 deputados (Cunha está afastado do mandato) para que seja decretada a cassação.
Após a leitura do parecer, deve ser concedido pedido de vista aos deputados, o que impede novas reuniões por dois dias. Com isso, o Conselho de Ética deve começar o debate que precede a votação do relatório na próxima terça-feira (7).
A defesa de Cunha e deputados aliados do peemedebista ainda podem recorrer à CCJ (Comissão de Constituição e Justiça) da Câmara contra o andamento do processo no conselho, antes de o parecer ser submetido ao plenário.
O deputado, réu no STF (Supremo Tribunal Federal) por suspeita de envolvimento no esquema de corrupção na Petrobras, sempre negou as acusações contra ele.
Fala de Cunha a CPI em 2015 gerou representação
À CPI da Petrobras, em março de 2015, Cunha afirmou: “Não tenho qualquer tipo de conta em qualquer lugar que não seja a conta que está declarada no meu imposto de renda; e não recebi qualquer vantagem ilícita ou qualquer vantagem com relação a qualquer natureza vinda desse processo [do petrolão]", disse.
A defesa do peemedebista afirma que ele não possui contas no exterior, mas trusts, um tipo de investimento em que os bens são administrados por terceiros e para o qual a lei brasileira não exigiria a declaração à Receita Federal. Com base nesses argumentos, Cunha afirma não ter mentido à CPI.
Já deputados que defendem sua cassação afirmam que o Código de Ética pune com a perda do mandato omitir “informação relevante” de bens, caso no qual se enquadraria a afirmação de Cunha à CPI.
O processo contra Cunha foi aberto no Conselho de Ética no dia 3 de novembro, por representação dos partidos PSOL e Rede. Eles acusavam Cunha de ter mentido à CPI e de ter recebido propina do petrolão, com base na denúncia da Procuradoria-Geral da República feita ao STF.
A Procuradoria acusa o deputado de ter recebido US$ 5 milhões em propina originada em contratos de navios-sonda da Petrobras. A denúncia levou o STF a abrir processo contra o deputado pelos crimes de corrupção passiva e lavagem de dinheiro.
Cunha nega participação no esquema. A defesa do deputado afirma que a Procuradoria não apresentou provas de que o deputado tenha de fato recebido repasses ligados à corrupção na Petrobras.
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