"Não é confronto", diz Moro antes de depoimento de Lula
Em aparição pública dois dias antes de interrogar o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva em processo da Operação Lava Jato, o juiz Sergio Moro disse na noite desta segunda (8) em Curitiba que um processo não é "um confronto, uma guerra" e que não há necessidade de que as pessoas saiam às ruas "para enfrentar uma situação de risco".
"É melhor que seja um jogo de torcida única", disse o magistrado, fazendo uma analogia do processo com o futebol. No sábado, o juiz já havia divulgado um vídeo em que pedia para os simpatizantes da Operação Lava Jato não viajarem a Curitiba para o depoimento.
Lula deve prestar depoimento a partir das 14h de quarta (10), na condição de réu, sob a acusação de ter recebido propina da OAS, no âmbito do esquema de corrupção em contratos da Petrobras. Segundo a denúncia, Lula teria recebido da empreiteira um tríplex no Guarujá (SP), além do pagamento do armazenamento de bens recebidos durante sua passagem pela Presidência da República (2003-2010).
A defesa de Lula nega as acusações e, nesta segunda, pediu no Tribunal Regional Federal da 4ª Região, em Porto Alegre, a imediata suspensão do processo criminal. Segundo os advogados, não houve tempo suficiente para analisar o conteúdo de uma "supermídia" com 5,42 gigabytes com documentos que a Petrobras anexou aos autos --estima-se que o arquivo tenha 100 mil páginas.
Depoimento é algo banal, diz Moro
Em seu discurso nesta segunda-feira, Moro não citou explicitamente o processo de Lula, nem a mobilização de militantes pró-Lula e pró-Lava Jato em torno do depoimento do ex-presidente em Curitiba, mas o contexto de suas declarações ficou claro em seu discurso.
"Não sei se estão a par, mas na quarta tem um interrogatório", disse Moro no começo de sua fala, provocando risadas da plateia, na referência mais direta que fez ao processo de Lula em seu discurso.
O juiz buscou minimizar o impacto do depoimento de Lula, ressaltando que o depoimento de um réu é "um ato natural do processo penal". "Me preocupa esse clima de confronto em relação a algo que pode ser extremamente banal", afirmou.
Moro inclusive fez menção à expectativa gerada pelo primeiro depoimento de Marcelo Odebrecht, ex-presidente do grupo Odebrecht. Segundo o juiz, o interrogatório foi "algo absolutamente banal" que "não entrou nos anais dos grandes momentos judiciais da História da Humanidade".
Recebido em pé pela plateia, o juiz Sergio Moro foi ovacionado diversas vezes durante o evento.
Nada "conclusivo"
O juiz lembrou que o interrogatório do réu é a fase em que o acusado tem chance de falar no processo, ou mesmo de ficar em silêncio. "Nada de conclusivo vai sair dessa data. Ainda há uma fase de instrução complementar e de alegações finais", disse.
Durante sua fala, Moro chegou a ser interrompido por um integrante da plateia, que o questionou em voz alta sobre sua gravata vermelha. "Vermelho de fraternidade", respondeu o magistrado, para aplausos e risadas da plateia.
Transição turbulenta
Moro discursou na abertura do 1º Congresso do Pacto pelo Brasil, promovido pelo Observatório Social do Brasil, organização que promove o monitoramento e o controle da gestão pública. O tema do evento, que vai até quinta (11), é “Calamidades x Eficiência da Gestão Pública”.
Em sua palestra propriamente dita, Moro falou sobre a corrupção sistêmica no Brasil, citando exemplos descobertos na investigação do esquema criminoso na Petrobras. O juiz defendeu que haja mais atenção sobre outros casos de corrupção que não a Lava Jato.
Moro ainda falou que um juiz nunca vai tomar decisões de acordo com a opinião pública, mas disse que "o apoio popular é importante para evitar a obstrução da justiça por pessoas poderosas"
O magistrado se manifestou a favor da criação de políticas públicas para reduzir a prática do crime de corrupção, como a redução de cargos comissionados. Segundo ele, os governos no Brasil estão, em geral, “em débito” no tema, “porque muito pouco foi feito em relação a isso desde que foi revelada a sistematicidade da corrupção no Brasil”.
No fim, Moro disse que a transição entre um cenário de corrupção sistêmica para um de menor corrupção e efetiva responsabilização “não se faz sem alguma turbulência”. O juiz encerrou sua fala convocando o apoio da “cidadania mobilizada” para que as instituições sejam fortes o suficiente para resistir a esquemas de corrupção.
*Colaborou Flávio Costa, em Curitiba
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