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Fachin defende proteção da democracia "contra todas as tentações autoritárias"

Foto: Marcelo Camargo/Agência Brasil
Imagem: Foto: Marcelo Camargo/Agência Brasil

Vinicius Boreki

Colaboração para o UOL, em Curitiba

23/09/2017 15h56

Uma semana após a repercussão das declarações de um general do Exército em apoio a uma eventual intervenção militar no país , o ministro do Supremo Tribunal Federal (STF) Luiz Edson Fachin defendeu, durante participação em um evento sobre direito em Curitiba, a proteção à democracia. "Proteger a democracia contra todas as tentações autoritárias é sustentar a liberdade aos direitos fundamentais”, afirmou em uma apresentação de aproximadamente 45 minutos no encerramento do V Congresso do Instituto Brasileiro de Direito Civil, encerrado neste sábado (23) na capital paranaense.

Fachin também mencionou o fato de, no STF, ter "virado regra" algo que "deveria ser exceção": o que chama de "decisões monocráticas".

No último dia 15, o general Antonio Hamilton Mourão, secretário de economia e finanças da Força, afirmou, em uma palestra em Brasília, que seus "companheiros do Alto Comando do Exército" entendem que uma "intervenção militar" poderá ser adotada se o Judiciário "não solucionar o problema político", em referência à corrupção de políticos.

Pouco afeito a declarações fora dos tribunais, o ministro se referiu ao presente como um momento "enevoado" e que apresenta "grandes desafios". 

Fachin fez uma crítica ao volume de processos que chegam ao Supremo Tribunal Federal (STF). Segundo o ministro, o grande volume interfere na capacidade do órgão de tomar decisões colegiadas, ampliando a necessidade de os ministros julgarem de maneira monocrática, incluindo questões relacionadas à Operação Lava Jato. "O que deveria ser exceção se tornou a regra", afirmou Fachin no evento, realizado na sede da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB-PR).

A argumentação do ministro acontece também na mesma semana em que o STF decidiu, por 10 votos a 1, encaminhar à Câmara dos Deputados a denúncia da Procuradoria Geral da República contra o presidente Michel Temer (PMDB). Na sexta-feira (22), Temer declarou que "só regimes de exceção aceitaram acusações sem provas" e que o "país pode estar trilhando este caminho".

“Estou muito seguro de dizer todos os dias: o tamanho do nosso país como uma árvore que floresce é maior do que as sombras que podem ter no presente”. A afirmação, além do contexto político, estava relacionada às discussões apresentadas sobre a alteração de gênero no registro civil de transexuais.

 

As funções do STF

De acordo com o ministro, entre 2 de fevereiro e 1º de setembro deste ano, o seu gabinete no STF recebeu 5.330 novos processos, sendo 101 inquéritos criminais. O volume de processos interfere na própria função prevista pelo STF e na forma de atuação dos ministros. “Estão vinculados ao nosso gabinete, nesta operação reconhecida nacionalmente e internacionalmente [a Lava Jato], 76 inquéritos, que, a partir de fevereiro, levaram a apreciar 1.224 pedidos”, afirmou.

Ainda segundo Fachin, o gabinete conta com 4.506 processos em trâmite, considerando 410 habeas corpus em curso. “De fevereiro a dezembro, estarão vinculados 110 procedimentos de colaboração premiada”, explicou. Em sua avaliação, os dados refletem a importância do STF, mas reforçam a dificuldade de se discutir em colegiado.

"O ideal seria que [o STF] opere valorizando-se a colegialidade, mas o número induz a um volume de decisões monocráticas", defendeu.

Identidade de gênero

As estimativas apresentadas pelo ministro são de que 70% dos processos chegam ao STF na instância de recursos, com o restante para se discutir sobre sua competência originária. Usando sempre como exemplo o Recurso Extraordinário 670.422, que discutiu a possibilidade de alteração de gênero no registro civil sem a necessidade de realização de procedimento cirúrgico, o ministro defendeu a necessidade de “garantir às pessoas proteção eficaz contra qualquer discriminação, seja por raça, cor e sexo”.

Conforme Fachin, não é correto condicionar a identidade de gênero à prévia realização de cirurgia. “Isso repercutiria por si em uma violação à autonomia e ao direito da integridade”, afirmou. Uma decisão nesse sentido seria uma forma de o estado interferir a tal ponto na liberdade do indivíduo que, na realidade, a estaria limitando.

Risos da plateia

Antes de se apresentar, a esposa do ministro Rosana Amara Girardi Fachin, desembargadora do Tribunal de Justiça do Paraná, ganhou um livro de direito civil em um sorteio, gerando risos na plateia.