'PT se vitimiza muito mais', diz chefe da força-tarefa da Lava Jato
Chefe da força-tarefa da Operação Lava Jato no MPF (Ministério Público Federal), o procurador Deltan Dallagnol diz que não há perseguição contra um partido político durante as investigações. “No começo, pessoas diziam: ‘olhe, estão pegando mais gente do PT’. Mas isso não era verdade. O PT se vitimiza muito mais. Naquele momento, nós tínhamos três partidos políticos [envolvidos no esquema, citando PP e PMDB]”, disse o procurador na última sexta-feira (29), um dia após a Lava Jato ter recebido, no Canadá, menção honrosa no prêmio Allard, que celebra trabalhos contra a corrupção.
Deltan foi questionado por um dos espectadores do debate promovido pela University of British Columbia, em Vancouver, a respeito de violações que a operação estaria cometendo e a respeito de uma agenda política que motivaria a Lava Jato.
“Nós --procuradores, delegados, juiz-- fomos escolhidos para trabalhar neste caso antes que um político aparecesse no caso. Depois, nós tivemos políticos aparecendo”, esclareceu Deltan, que ressaltou que nenhum dos membros da Lava Jato tem filiação política. Para ele, acreditar que o grupo de trabalho da operação tem membros que se “juntaram para cometer injustiças, violar a lei contra um partido é um tipo de teoria da conspiração de quem não conhece nosso trabalho”.
O procurador pontuou que, hoje, há investigações contra 28 partidos políticos, “da oposição, da direita, da esquerda, de cima, de baixo, do lado”, gerando risos nos espectadores. “Agora temos evidências contra o senhor Temer, que é o presidente, contra Aécio Neves, que era o principal candidato da oposição na última eleição”, lembrou. “Nosso objetivo é combater a corrupção seja qual for o lado, qual for a pessoa envolvida”.
Ele explica que o PT foi um dos partidos mais implicados no início da Lava Jato pelo fato de estar no poder e indicar os diretores da Petrobras envolvidos no esquema de corrupção. “Essa operação revelou corrupção, centenas de atos de corrupção, cometidos por mais de dez anos”.
Também perguntado sobre um suposto uso de prisão preventiva para que réus confessem ou façam acordos de colaboração, Deltan diz que isso é um “absurdo”. “Mais de 70% dos delatores nunca foram presos. E mais que isso: prisões preventivas não são condição necessária para acordo de colaboração”.
Segundo o procurador, a prisão preventiva não leva a um acordo de colaboração. “Nós nunca fizemos isso [oferecer acordo após prisão]. A iniciativa de cooperar era do réu. Por precaução, nós decidimos não ir aos réus, esperamos os réus virem até nós”.
Para Deltan, há “alguns discursos que foram criados contra a Lava Jato que são repetidos, repetidos, repetidos”. “Como aquela estratégia de repetir uma mentira mil vezes até que pareça verdade”.
Vencedora
A repórter investigativa Khadija Ismayilova, do Azerbaijão, foi a vencedora do prêmio Allard. Ela também ganhou 100 mil dólares canadenses, o equivalente a cerca de R$ 256 mil. Também concorria ao prêmio a ativista de direitos humanos egípcia Azza Soliman. Impedidas de deixarem seus países por seus governos, nenhuma das duas pôde participar da cerimônia, em Vancouver, sendo representadas.
Apenas membros da equipe da força-tarefa estiveram presentes na premiação --as passagens foram pagas pela organização do prêmio. Deltan, ao agradecer, no palco, a menção honrosa, deixou uma mensagem ao público. "Você pode, outros cidadãos podem e nós, juntos, podemos, qual seja a boa causa, encarar injustiças e manter a esperança de criar um futuro melhor e um mundo melhor".
Antes do anúncio da vencedora do prêmio, a organização do evento exibiu vídeos que mostravam a atuação dos finalistas. Ao citar a Lava Jato, também foi ouvido o juiz Sergio Moro, que comanda os processos na Justiça Federal no Paraná. “Corrupção estava tão espalhada, tão sistemática, que nós tivemos que mandar uma mensagem forte: ‘pare com isso. Não vamos tolerar esse tipo de comportamento’”, disse o magistrado.
Deltan informou que o prêmio em dinheiro que coube à equipe, 10 mil dólares canadenses (cerca de R$ 25 mil), serão doados para promover ações de direitos humanos no Brasil. "Melhorar vidas é o objetivo da luta contra a corrupção." Por ser um órgão público, o MPF não pode aceitar prêmios em dinheiro.
Até hoje, a Lava Jato já conquistou oito prêmios, sendo dois em âmbito internacional.
As concorrentes da Lava Jato
Ismayilova, jornalista no Azerbaijão, escreve sobre corrupção e abuso de poder. Há três anos, ela foi sentenciada a sete anos e meio de prisão por evasão de divisas e abuso de poder, mas ganhou a liberdade no ano passado com a condição de não viajar para fora do país sem autorização oficial.
Com seu trabalho, ela revelou, em 2010, um esquema de corrupção envolvendo o presidente do Azerbaijão, Ilham Aliyev. A esposa e os filhos do presidente tinham propriedades imobiliárias nos Emirados Árabes Unidos no valor de US$ 44 milhões. Acredita-se que seu julgamento tenha sido motivado por questões políticas.
Já Soliman, uma advogada que atua em prol dos direitos humanos das mulheres no Egito, foi acusada de fazer um protesto não autorizado e de atentados à ordem pública após depor contra um policial que, durante uma manifestação, matou uma defensora dos direitos humanos das mulheres. Em resposta, ela fundou a “Coalizão de Proteção a Testemunhas e Denunciantes” que tem como objetivo a promoção do estado de direito.
Soliman está proibida pelo governo de viajar para fora do Egito. Ela também sofre o bloqueio dos serviços de sua firma de advogados e o congelamento de seu próprio patrimônio.
O prêmio Allard é entregue a cada dois anos para grupos ou pessoas que promovam “ações contra a corrupção e fomento dos direitos humanos”.
Os primeiros vencedores foram o ativista indiano Anna Hazare, em 2013, por sua atuação em busca da transparência e contra a corrupção em seu país, e os jornalistas John Gitongo e Rafael Marques de Morais, em 2015, por expor casos de corrupção em seus países, o Quênia e Angola, respectivamente. Para a premiação deste ano, houve o registro de 244 candidaturas de 70 países.
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