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Em meio a polêmica na Alerj, STF divulga resumo da decisão de julgamento sobre parlamentares

Em 11 de outubro, o plenário do STF julgou se é necessário aval do Congresso para a aplicação de medidas cautelares contra parlamentares - Pedro Ladeira/Folhapress
Em 11 de outubro, o plenário do STF julgou se é necessário aval do Congresso para a aplicação de medidas cautelares contra parlamentares Imagem: Pedro Ladeira/Folhapress

Gustavo Maia

Do UOL, em Brasília

17/11/2017 22h25Atualizada em 17/11/2017 22h27

Em meio à disputa judicial deflagrada por conta da votação da Alerj (Assembleia Legislativa do Estado do Rio de Janeiro) que revogou a prisão e o afastamento de três deputados estaduais de seus mandatos, o STF (Supremo Tribunal Federal) divulgou nesta sexta-feira (17) a ementa (resumo do que foi decidido) do controverso julgamento realizado há mais de um mês, cujo resultado foi usado para reverter medidas cautelares contra os parlamentares.

Como antecipado pelo UOL em reportagem publicada também nesta sexta, o texto delimita aos "parlamentares federais" --deputados federais e senadores-- os efeitos do julgamento de 11 de outubro e não há menção a deputados estaduais ou vereadores. Na ocasião, os ministros da Corte decidiram, por 6 votos a 5, que a aplicação de sanções previstas no Código de Processo Penal devem ser encaminhada à Câmara ou ao Senado sempre que impossibilitarem "direta ou indiretamente" o exercício regular do mandato.

Desde então, o resultado já foi usado, por analogia, para revogar decisões judiciais contra deputados estaduais do Mato Grosso e do Rio Grande do NorteHoje, foi a vez de a Alerj evocar o julgamento para justificar a revogação da prisão do presidente da Casa, Jorge Picciani, de Paulo Melo e de Edson Albertassi, todos do PMDB. Eles foram presos e afastados de suas funções públicas por ordem do TRF-2 (Tribunal Regional Federal da 2ª Região), nesta quinta (16).

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Os parlamentares deliberaram sobre a decisão da segunda instância da Justiça fluminense depois que os desembargadores entenderam que deveriam submeter as decisões ao crivo dos deputados por conta do resultado do julgamento do STF. Mas o ato do TRF-2 acabou extrapolando o alcance do que foi decidido pela mais alta Corte do país no mês passado. E, por isso, será questionado no Judiciário pelo PSL (Partido Social Liberal).

A redação do acórdão (decisão por escrito) do julgamento coube ao ministro Alexandre de Moraes, que foi designado para a função por ter proferido o primeiro voto divergente do relator do caso, Edson Fachin. O texto também contém o termo "congressistas", válido apenas para os 594 integrantes do Congresso Nacional --513 deputados federais e 81 senadores. A íntegra do voto de Moraes foi divulgada na noite desta sexta (17).

Ambos os textos foram liberados do gabinete do ministro no último dia 10, mas o acórdão está sob revisão dos outros 10 integrantes da Corte. Nesta etapa, ainda podem ocorrer eventuais alterações na redação final, que não devem alcançar questões substanciais do julgamento.

aécio picciani - Gustavo Miranda/ Agência O Globo - Gustavo Miranda/ Agência O Globo
Julgamento do Supremo que beneficiou Aécio foi usado na Alerj
Imagem: Gustavo Miranda/ Agência O Globo

Por isso, a íntegra do resultado ainda não foi publicada. Apesar de estar dentro do prazo habitual da Corte, a ausência abriu espaço para a incerteza jurídica, dando margem a interpretações mais abrangentes da Adin (Ação Direta de Inconstitucionalidade) apreciada pelo Supremo.

Colocar a análise da Adin na pauta do Supremo foi a solução institucional encontrada para diminuir a temperatura da crise aberta entre o STF e o Senado depois que a 1ª Turma da Corte afastou o senador Aécio Neves (PSDB-MG) do exercício do mandato e determinou o seu recolhimento noturno –entre outras sanções.

Dias depois, a maioria dos senadores decidiu rejeitar o afastamento do tucano e anular as medidas cautelares impostas contra ele.

Repercussões

Ouvido pelo UOL nesta quinta, o ministro do STF Marco Aurélio Mello, que votou pela necessidade do aval do Congresso, foi categórico ao dizer que "o que foi decidido pelo STF foi só pelo ângulo da Constituição Federal", que diz respeito "unicamente" à situação dos congressistas.

Não sei como surgiu essa ideia de que nossa decisão abrangeria deputados estaduais, e quem sabe até vereadores. Eu fiquei pasmo."
Marco Aurélio Mello, ministro do Supremo

Presidente da AMB (Associação dos Magistrados Brasileiros), o juiz Jaime de Oliveira compartilha desse entendimento. “O que está acontecendo em vários Estados, no Mato Grosso e no Rio Grande do Norte, em que assembleias expediram alvarás de soltura, é uma completa aberração”, declarou, ponderando em seguida que as decisões já estão sendo questionadas judicialmente.

No último dia 8, o TRF-1 (Tribunal Regional Federal da 1ª Região), sediado em Brasília, começou a analisar a validade da decisão da Assembleia Legislativa do Mato Grosso que mandou soltar o deputado estadual Gilmar Fabris (PSD), preso em setembro por determinação do STF, mas o julgamento foi interrompido após um pedido de vista –e não tem data para ser retomado.

Oliveira defendeu que o Supremo publique o acórdão rapidamente porque a situação está se repetindo e, para ele, traz "um desprestígio muito grande para o Poder Judiciário". "São prisões que têm sido decretadas e mantidas pelos tribunais superiores, e agora praticamente está se criando uma blindagem para tudo quanto é político", afirmou o juiz.

Já o professor de direito constitucional Rubens Beçak, da USP (Universidade de São Paulo), aponta que, sendo o Brasil um país federalista, existe um “princípio de repetição obrigatória” nas instâncias menores da Federação daquilo que é determinado na área federal.

Não me causa estranheza que as assembleias legislativas estejam cumprindo, mesmo que o acórdão não tenha saído [...] Nesse caso que fala de conflito de competência da Corte Constitucional, eu acho muito difícil que não seja repetido nas instâncias menores”, argumentou Beçak, que, no entanto, considerou a decisão do STF dúbia. “Foi um absurdo, um desastre, e por isso ficou nesse limbo.”

Para Marco Aurélio Mello, não cabe o princípio da reprodução obrigatória porque a regra é "excepcionalíssima", assim como a que garante ao presidente da República, durante o mandato, não responder por atos anteriores. “Indaga-se: governadores e prefeitos também estão alcançados por essa regra?”, questionou, retoricamente.

"Você tem cláusulas na Constituição Federal que são exclusivas, não são de repetição obrigatória. E se transportarem para a Constituição do Estado ou para a Lei Orgânica do município, se houver questionamento, vamos decidir”, explicou o ministro, reconhecendo que o tema fatalmente deverá cair no Supremo Tribunal Federal.

A Adin julgada em outubro foi protocolada em maio do ano passado por três partidos e pedia que o eventual afastamento de parlamentares por decisão judicial fosse submetido em até 24 horas ao Congresso Nacional, que teria o poder de confirmar ou revogar a medida, como já ocorre nos casos de prisão em flagrante de membros do Legislativo.

A ação foi apresentada dias depois de o Supremo afastar o ex-deputado federal Eduardo Cunha (PMDB-RJ) do mandato e, consequentemente, da Presidência da Câmara, por PP, PSC e Solidariedade, que apoiavam o peemedebista. Cunha foi cassado e está preso há mais de um ano.