Cenários para candidatura de Lula geram perspectiva de disputa jurídica em 2018
A situação jurídica do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva, pré-candidato do PT ao Planalto, pode fazer com que a eleição de 2018 torne-se uma nova batalha nos tribunais envolvendo o petista. Já condenado em um dos sete processos em que é réu, Lula pode se tornar “ficha suja” caso o TRF (Tribunal Regional Federal) da 4ª região, a segunda instância das ações da Operação Lava Jato, confirme a sentença --a única até o momento-- proferida em julho pelo juiz Sergio Moro relativa ao processo do tríplex.
Nesse caso, em teoria, o ex-presidente não poderia disputar o pleito na tentativa de voltar à Presidência da República para um terceiro mandato. Segundo a Lei da Ficha Limpa, sancionada por Lula em 2010, são impedidos de disputar uma eleição as pessoas condenadas em decisão de órgão judicial colegiado, que é o caso da Oitava Turma do TRF-4.
A questão é que recursos em tribunais superiores, como o STJ (Superior Tribunal de Justiça), o STF (Supremo Tribunal Federal) e o TSE (Tribunal Superior Eleitoral), podem permitir que Lula dispute a eleição. E, se a decisão do TRF-4 não for unânime, é possível um recurso inclusive na própria segunda instância, em forma de embargos infringentes, o que prolongaria ainda mais indefinições sobre o caso.
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Uma das explicações que justificariam a presença de Lula, de acordo com especialistas em direito eleitoral ouvidos pelo UOL, é que, se condenado também pela segunda instância, o petista ainda teria possibilidade de ser absolvido no STJ e no STF. Nesse cenário, os recursos visariam evitar um prejuízo ao petista, que poderia ficar impedido de disputar o pleito, mas, posteriormente, ser inocentado pelas instâncias superiores.
Decisões do TSE têm apontado que recursos não suspenderiam a inelegibilidade. "Mas a orientação não é firme. No mínimo, o tema autorizaria boa controvérsia no julgamento do registro", escreveu Luiz Fernando Casagrande Pereira em um parecer que tem sido utilizado por petistas para defender a presença de Lula na eleição mesmo com confirmação da condenação.
Não haver certeza se o líder em todas as pesquisas de intenção de voto poderá estar ou não na disputa traz “um cenário muito instável para a próxima eleição”, avalia a professora Karina Kufa, coordenadora do curso de pós-graduação do curso direito eleitoral do IDP (Instituto de Direito Público) de São Paulo, que salienta: “o erro não está em permitir ter recursos”. “Quantos mais recursos, mais segurança. Vai ser uma briga jurídica muito intensa”, acredita.
Mas o que deixa o cenário eleitoral mais instável é não saber o período em que a decisão da Oitava Turma do TRF-4 irá sair. “Quanto mais perto de 15 de agosto, mais enrolada vai ser a questão jurídica”, comenta Daniel Falcão, professor da USP (Universidade de São Paulo) e do IDP, em referência ao final do prazo para o registro de candidaturas no TSE. “Estamos tratando de processo penal, eleitoral, direito eleitoral, direito penal. Por isso está essa confusão toda.” Após a publicação da reportagem, o TRF-4 marcou o julgamento da apelação de Lula para 24 de janeiro.
A expectativa é que o julgamento do TRF-4 aconteça no primeiro semestre, ou seja, até o fim de junho. Sem uma decisão da turma até o registro da candidatura, a questão de Lula poderá ser alvo de uma AIRC (Ação de Impugnação de Registro de Candidatura). Mas os especialistas não acreditam que uma resposta da Justiça Eleitoral seja rápida. “O Judiciário não consegue definir em 45 dias [a questão da impugnação]. Se a gente antecipasse o registro de Ficha Limpa, não teria essa situação [de indefinição]”, sugere Kufa.
Para o presidente do TRF-4, o desembargador Calos Eduardo Thompson Flores, é importante julgar a apelação de Lula antes do primeiro turno da eleição. "É um interesse da própria nação e dos réus envolvidos”, disse Flores no começo de novembro. Não é ele, porém, que marca a data, mas o desembargador Leandro Paulsen, um dos três membros da Oitava Turma.
Nessa situação, os recursos, porém, não seriam apenas os da defesa de Lula a favor de sua candidatura. Também haveria ações das candidaturas concorrentes contra a presença de Lula no pleito, sem contar uma possível manifestação do MPE (Ministério Público Eleitoral) contra ou pró-Lula.
“Aí é uma instabilidade muito grande, [ter essa situação] com um candidato com potencial de ir ao segundo turno. É um confronto jurídico muito relevante”, avalia Silvio Salata, presidente da Comissão de Direito Eleitoral da OAB (Ordem dos Advogados do Brasil) em São Paulo.
Os cenários mais simples para Lula são dois. O melhor para Lula: a Oitava Turma absolve Lula e ele disputa a eleição. E o menos provável de ocorrer: os desembargadores não julgam a apelação de Lula até o primeiro turno do pleito. Nesse caso, não haveria uma decisão de turma, em segunda instância, que impediria Lula de concorrer ao Planalto.
“As demais derivam de uma situação jurídica que nós não temos bola de cristal para prever”, pontua Salata. Seu colega, Falcão, concorda: “gera um desconforto”. “No fundo, você não sabe se aquela pessoa está disputando. Se houver a condenação, vai ser uma chuva de ação de impugnação contra a candidatura dele”, complementa.
E se Lula perder ação de impugnação, AIRC, mas tiver sido eleito, “ele não é empossado e se marcam novas eleições”, explica Kufa. “Em sendo anulada a eleição anterior, será marcada uma outra, sem o candidato, no período entre 20 e 40 dias.”
A forte possibilidade de Lula estar presente na disputa mesmo com uma confirmação da condenação em segunda instância faz com que seus prováveis adversários não pensem em um cenário sem um petista. No último sábado (9), ao assumir a presidência do PSDB, o pré-candidato tucano, o governador paulista, Geraldo Alckmin, disse que “Lula será condenado nas urnas pela maior recessão de nossa história”. “As urnas os condenarão pelos milhões de empregos perdidos, pelas empresas fechadas, pelos sonhos desfeitos."
O próprio ex-presidente não se vê fora da disputa. Na semana passada, em sua terceira caravana pelo país, ele disse: "não fiquem com essa bobagem de que o 'Lula não vai ser candidato'. Vou ser candidato e vou ganhar as eleições".
O ministro do STF (Supremo Tribunal Federal) Luiz Fux, que estará no comando do TSE (Tribunal Superior Eleitoral) entre fevereiro e agosto do ano que vem, não se mostra favorável a uma candidatura de Lula com base em uma interpretação da Constituição.
“Ela estabelece que, quando o presidente tem contra si uma denúncia recebida, ele tem que ser afastado do cargo. Ora, se o presidente é afastado, não tem muito sentido que um candidato que já tem uma denúncia recebida concorra ao cargo. Ele se elege, assume e depois é afastado?”, pontuou em entrevista ao jornal “Folha de S.Paulo”. “Eu não estou concluindo, mas são perguntas que vão se colocar”.
Durante o período eleitoral, porém, o TSE será comandado pela também ministra Rosa Weber, que não se manifestou a respeito e não tem o hábito de conceder entrevistas.
Em entrevista ao UOL em outubro, a advogada Valeska Teixeira Martins disse que Lula ficar fora da eleição será uma “ruptura de Estado de Direito”. Na visão dela, o ex-presidente responde a processos por motivos políticos. “Efetivamente, retirá-lo das eleições de 2018 por conta dessa perseguição política seria mais um escândalo jurídico internacional”.
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