Queiroz solto ou F. Bolsonaro réu: o que está em jogo em 'HC da rachadinha'
Resumo da notícia
- Decisão do STF restringe foro privilegiado a políticos no exercício do mandato
- Mas especialistas preveem anulação de decisões se Flávio foi investigado quando deputado
- HC pede anulação do processo e cita que Flávio era deputado na época
- MP-RJ rebate citando restrição do foro do STF
Três desembargadores da 3ª Câmara Criminal do TJ-RJ (Tribunal de Justiça do Rio) vão julgar hoje à tarde um habeas corpus que pode até colocar em liberdade Fabrício Queiroz, ex-assessor de Flávio Bolsonaro (Republicanos-RJ) preso por suspeita de ser o operador financeiro de um suposto esquema de rachadinha na Alerj (Assembleia Legislativa do Rio). O UOL ouviu cinco juristas sobre possíveis cenários do julgamento.
A decisão do HC tem potencial para ser um divisor de águas no caso: se a tese de Flávio for vitoriosa, decisões judiciais —como mandados de prisão e quebras de sigilo fiscal— podem ser anuladas e as investigações passam às mãos de procuradores do Ministério Público; por outro lado, se o recurso for negado, o filho de Jair Bolsonaro pode ser denunciado nos próximos dias por promotores do MP pelos crimes de peculato, lavagem de dinheiro, ocultação de patrimônio e organização criminosa.
No HC, Luciana Pires, advogada de Flávio, pede a anulação da investigação. Ela argumenta que o juízo competente para o caso seria o Órgão Especial do TJ, já que o político era deputado estadual à época da suposta rachadinha, prática que consiste na devolução de parte dos salários por funcionários comissionados. Hoje, a investigação tramita na 27ª Vara Criminal do Rio, órgão da primeira instância do Judiciário fluminense, que tem à frente o juiz Flávio Itabaiana.
O caso está gerando discussão no meio jurídico. No centro do debate, está a decisão do STF (Supremo Tribunal Federal) de 2018 que restringiu o foro privilegiado a políticos que estejam no exercício do mandato quando cometeram os supostos crimes em investigação.
Nesse caso, Flávio Bolsonaro não teria mais direito ao foro. Entretanto, especialistas dizem que, mesmo não sendo mais deputado estadual, se Flávio começou a ser investigado quando ainda ocupava o cargo na Alerj e o direito ao foro —o Órgão Especial do TJ— não foi respeitado, as decisões do juiz Flávio Itabaiana podem ser anuladas.
Como o processo corre sob sigilo, não está disponível a data exata em que a apuração começou tampouco se ela foi iniciada em foro privilegiado.
Procurada, a advogada Luciana Pires disse que não se manifestaria sobe o habeas corpus.
O que dizem especialistas sobre possíveis cenários
Se o HC for negado, Flávio Bolsonaro pode até mesmo ter o pedido de prisão preventiva solicitado pelo MP-RJ, segundo avalia o criminalista Wallace Martins, da Anacrim (Associação Nacional da Advocacia Criminal).
Flávio Bolsonaro ostentaria a condição de réu em um processo criminal. Isso seria como gasolina para o país, porque não sabemos como Jair Bolsonaro reagiria
Wallace Martins, criminalista
Por outro lado, se houver concessão do HC, ele diz que Queiroz pode ser colocado em liberdade. "Se a primeira instância não tem competência para julgar, também não terá competência para prender", defende. Ele pondera que a apresentação de denúncia perante o Órgão Especial levaria mais tempo para acontecer.
O advogado Antônio Carlos de Almeida Castro, o Kakay, explica que a investigação precisaria ter sido supervisionada pelo Órgão Especial do TJ-RJ, caso tenha sido aberta quando Flávio era deputado estadual.
"A discussão sobre o início da apuração pode ser abordada pela defesa. E poderá levar a uma nulidade", argumenta. Para Kakay, essa questão processual pode, sim, ter efeitos em todos os outros atos tomados na investigação, incluindo a prisão de Queiroz.
A eventual discussão das nulidades vai depender da profundidade de cada medida cautelar autorizada pela Justiça
Fernando Augusto Fernandes, advogado
O advogado Thiago Bottino, professor da FGV Direito Rio, diz que o foro privilegiado vem sendo alterado constantemente pelo STF nos últimos anos. "Quando há diferentes interpretações, é possível saber que o tema ainda é controverso", analisa.
Se a suspeita de envolvimento do Flávio Bolsonaro no esquema de rachadinha surgiu enquanto ele era deputado, só quem poderia ter avançado na investigação era o Órgão Especial. Se o nome dele surgiu quando já tinha deixado o cargo, a competência é do juiz de primeiro grau
Thiago Bottino, advogado
O criminalista Roberto Podval disse que a data do início da investigação e o foro na qual ela foi iniciada podem ser decisivos para a nulidade. Para ele, porém, caso o argumento da defesa de Flávio prospere, será necessário discutir ponto a ponto o que da apuração será revisto.
"Existe um grande debate jurídico sobre esse tipo de anulação por incompetência do foro. Em tese, todos os atos da investigação, como quebras de sigilo ou prisões preventivas, poderiam ser anuladas", explica.
O que diz o MP-RJ
No recurso, a defesa de Flávio Bolsonaro contesta a competência da 27ª Vara Criminal para determinar medidas cautelares no caso da rachadinha. Em abril de 2019, a Justiça determinou a quebra dos sigilos bancário e fiscal de mais de cem pessoas e empresas.
O Gaec (Grupo de Atuação Especializada no Combate à Corrupção) do MP-RJ rebate, citando a mesma decisão de maio de 2018 do STF, que restringiu o foro privilegiado após o fim do mandato.
O órgão sustenta que, mesmo com novo cargo eletivo —como é o caso de Flávio, hoje senador—, a competência passa a ser do primeiro grau de jurisdição. "O término de um determinado mandato acarreta, por si só, a cessação do foro por prerrogativa de função em relação ao ato praticado nesse intervalo", diz o MP-RJ, por meio de nota.
ID: {{comments.info.id}}
URL: {{comments.info.url}}
Ocorreu um erro ao carregar os comentários.
Por favor, tente novamente mais tarde.
{{comments.total}} Comentário
{{comments.total}} Comentários
Seja o primeiro a comentar
Essa discussão está encerrada
Não é possivel enviar novos comentários.
Essa área é exclusiva para você, assinante, ler e comentar.
Só assinantes do UOL podem comentar
Ainda não é assinante? Assine já.
Se você já é assinante do UOL, faça seu login.
O autor da mensagem, e não o UOL, é o responsável pelo comentário. Reserve um tempo para ler as Regras de Uso para comentários.