Viagens, articulações e 'calor humano': o que Bolsonaro perde no isolamento
Resumo da notícia
- Infectado pelo novo coronavírus, presidente está em isolamento desde 7 de julho
- Doença interrompeu sequência de descolcamentos pelo país para melhorar popularidade
- Mandatário também não pôde comparecer à entrega da reforma tributária e perdeu contato com apoiadores no Alvorada
- Reunião com auxiliares e autoriades tem sido feita por videoconferência --foram ao menos 30 em duas semanas
- Defesa da cloroquina pelo presidente, que afirma fazer uso do remédio, ganhou força durante a reclusão
Em isolamento desde 7 de julho por estar infectado com o novo coronavírus, Jair Bolsonaro (sem partido) teve que adiar viagens que faria ao Nordeste (Piauí e Bahia), não pôde comparecer à entrega da reforma tributária —costurada a várias mãos nos bastidores de Brasília—, e também perdeu contato mais próximo com apoiadores no Palácio da Alvorada.
O presidente tinha expectativa de voltar ontem (22) à rotina no Palácio do Planalto, porém o exame feito no dia anterior deu resultado positivo para covid-19. Dessa forma, sob orientação médica, ele deverá permanecer em reclusão até que um novo teste seja feito.
A ideia de Bolsonaro era se deslocar ao Piauí amanhã (24). O compromisso faria parte de uma estratégia do presidente para amenizar o impacto na sua popularidade provocada pelas crises internas no governo e repercussões negativas que se deram na esteira da pandemia do novo coronavírus.
O plano, interrompido pela infecção da covid-19, seria realizar mais viagens pelo Nordeste e tentar melhorar sua aprovação e mostrar uma agenda positiva do governo. O primeiro passo foram agendas no Pernambuco e no Ceará, no fim de junho, quando visitou obras da transposição do rio São Francisco.
Bolsonaro também pretendia inaugurar uma adutora que capta água do Rio São Francisco, na Bahia. Em sua última live, disse ainda que pretendia ir "dar uma volta no Vale da Ribeira", em São Paulo.
O projeto tem forte apelo popular e foi iniciado pelo PT, o principal adversário de Bolsonaro, durante o governo Luiz Inácio Lula da Silva (2007).
O afastamento provocado pela contaminação por covid-19 também fez o presidente acompanhar à distância as articulações políticas da reforma tributária. Coube ao chefe da pasta da Economia, o ministro Paulo Guedes, todo o protagonismo.
Na terça-feira (21), Guedes foi pessoalmente ao Congresso entregar a proposta do governo, finalizada após quase um ano de discussões, promessas e recuos.
Na ocasião, o ministro foi o principal personagem em frente às câmeras e posou ao lado dos dois chefes do Parlamento, o senador Davi Alcolumbre (DEM-AP) e o deputado federal Rodrigo Maia (DEM-RJ). Se Bolsonaro estivesse saudável, provavelmente os holofotes estariam direcionados para o presidente.
O mandatário também se limitou a conversas por telefone e por videochamada na tarefa de defender os interesses do Executivo em meio às negociações do novo Fundeb. A matéria, aprovada na Câmara na terça, aumenta os repasses da União para a educação básica. A atual complementação de 10% sobe para 23% paulatinamente até 2026.
O aval dos deputados ao projeto é considerado uma derrota do governo e uma vitória para o setor educacional, pois garantirá, se entrar em vigor, a ampliação no financiamento destinado a manutenção do ensino e valorização dos professores. A medida ainda passará pelo crivo do Senado Federal, que pode aprová-la ou alterá-la —em caso de mudança, o texto retornará à Câmara.
"Calor humano"
Bolsonaro ficou dias sem conversar com apoiadores no Palácio da Alvorada, hábito que ele mantém desde que tomou posse do cargo. A portaria da residência oficial do chefe do Executivo tornou-se, inclusive, um ponto de peregrinação para seguidores do mandatário.
Desde o início do isolamento presidencial, no entanto, o movimento vinha caindo gradativamente.
Com saudade do "calor humano", Bolsonaro passou, desde a semana passada, a cruzar o jardim do Alvorada e caminhar até a grade da portaria. Do local, ele tem a possibilidade de conversar à distância com os apoiadores. Retomado o contato, muitas pessoas voltaram a frequentar o "cercadinho".
Defesa da hidroxicloroquina
No período de isolamento, Bolsonaro participou até a noite de ontem de 30 reuniões por videoconferência. Durante a reclusão, iniciada em 7 de julho, logo após o diagnóstico, o presidente se transformou em uma espécie de garoto-propaganda da cloroquina/hidroxicloroquina.
A divulgação do medicamento ocorreu, inclusive, em eventos oficiais. Em 15 de julho, a equipe do mandatário chegou a compor cenário para que ele aparecesse no vídeo com uma caixa de hidroxicloroquina ao seu lado.
A cena foi testemunhada em uma das 30 videoconferências que constam nas agendas do presidente: a cerimônia de assinatura do marco legal saneamento básico. O evento foi exibido em rede nacional pela "TV Brasil" e pelos canais digitais do governo.
Bolsonaro também veiculou em suas redes sociais vídeos avulsos nos quais ele surgiu tomando comprimidos e defendendo o uso da substância no combate ao coronavírus. A postura é criticada por médicos e cientistas, pois não há, segundo os estudos realizados até o momento, comprovação de eficácia no tratamento contra a covid-19 —além disso, o remédio pode causar efeitos colaterais, como arritmia cardíaca.
Mesmo assim, o presidente brasileiro, na contramão de autoridades sanitárias em todo o mundo, segue defendendo remédios de forma entusiástica. A atitude tem sido frequente desde o começo da pandemia.
Do Alvorada, Bolsonaro também promoveu as tradicionais lives —transmissões ao vivo— para se comunicar com os seus apoiadores.
Em uma delas, o mandatário divulgou um outro medicamento que, assim como a hidroxicloroquina, não tem eficácia comprovada cientificamente. Trata-se do vermífugo nitazoxanida, cujo nome comercial é Annita.
No último domingo (19), Bolsonaro furou o isolamento para, em frente ao Palácio da Alvorada, interagir com apoiadores que se aglomeravam na portaria. Na ocasião, o presidente ergueu uma caixa do medicamento e a exibiu para o grupo.
"A história vai dizer quem estava certo no futuro e a quem cabe qualquer responsabilidade por parte das mortes", disse Bolsonaro. A cena foi aplaudida pelos seguidores do mandatário, que reagiram com gritos de "cloroquina! cloroquina!". Tudo foi transmitido ao vivo pelas redes sociais do governante.
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