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Senado dá vantagem a Flávio Bolsonaro na corrida contra a cassação

Senador Flávio Bolsonaro (Republicanos-RJ) no plenário do Senado - DIDA SAMPAIO/ESTADÃO CONTEÚDO
Senador Flávio Bolsonaro (Republicanos-RJ) no plenário do Senado Imagem: DIDA SAMPAIO/ESTADÃO CONTEÚDO

Hanrrikson de Andrade

Do UOL, em Brasília

22/08/2020 04h00

Três motivos fazem Flávio Bolsonaro (Republicanos-RJ) largar em vantagem na disputa para barrar o pedido de cassação dentro do Conselho de Ética do Senado. O principal: as acusações são baseadas em fatos anteriores à posse do mandato, em janeiro de 2019.

Além disso, segundo apurou o UOL, contará em favor de Flávio a concorrência com assuntos que constam entre as prioridades do Congresso Nacional, como as reformas tributária e administrativa, e a falta de vontade política da maioria dos senadores em atacar o filho do presidente neste momento.

A briga no Conselho de Ética deve ganhar novos capítulos quando a Casa restabelecer os trabalhos presenciais, paralisados em razão da pandemia do coronavírus. Ainda não há previsão de retomada.

A maioria dos colegas, exceto os da oposição, argumenta nas conversas pelos corredores do Congresso que o teor das acusações que deram origem a dois pedidos de cassação é baseado em fatos ocorridos antes de o filho do presidente virar senador.

A primeira representação foi protocolada em fevereiro pelo PSOL, PT e Rede Sustentabilidade e se refere ao "caso Queiroz", escândalo que tem como pivô o policial militar aposentado Fabrício Queiroz, ex-assessor de Flávio quando este era deputado estadual no Rio.

queiroz e flávio - Reprodução/Instagram - Reprodução/Instagram
Flávio Bolsonaro posa ao lado de seu ex-assessor, Fabrício Queiroz
Imagem: Reprodução/Instagram

O pleito se sustenta na acusação de que Queiroz recolhia parte dos salários de funcionários lotados no gabinete na Alerj (Assembleia Legislativa do RJ), esquema conhecido como "rachadinha". De acordo com a apuração do Ministério Público fluminense e da Polícia Federal, os indícios criminosos teriam ocorrido entre 2007 e 2018.

Já o segundo pedido de cassação, feito em maio pelos mesmos partidos, surgiu na esteira das declarações do primeiro suplente de Flávio, Paulo Marinho (PSDB-RJ). O tucano afirmou à colunista Mônica Bergamo, da Folha de S.Paulo, que o primogênito de Jair Bolsonaro teria tido acesso ilegal a informações de uma operação da PF no âmbito da Lava Jato que estava prestes a ocorrer no Rio, em outubro de 2018.

Um dos congressistas ouvidos pela reportagem diz que a cassação ou não de Flávio Bolsonaro "não está em questão", e sim o quanto um eventual processo de investigação dentro do Conselho de Ética do Senado pode "fazer o governo sangrar". Segundo ele, trata-se de uma guerra "política", e não "técnica".

Flávio também tem a seu favor o parecer da advocacia-geral do Senado acerca dos fatos apontados pelos oposicionistas. Os técnicos da Casa recomendaram que o assunto seja arquivado —os dois pedidos foram apensados e devem tramitar em uma única representação tão logo o Congresso retome os trabalhos.

A avaliação da advocacia-geral do Senado é a de que os argumentos apresentados não têm conexão com o mandato de Flávio Bolsonaro. O documento ainda não foi analisado pelo presidente do Conselho de Ética, Jayme Campos (DEM-MT), que tem prerrogativa para decidir se aceita a abertura de uma investigação ou enterra de vez o intento.

Conselho de Ética

O presidente do Conselho de Ética do Senado, Jayme Campos (DEM-MT), descartou qualquer possibilidade de discutir a situação de Flávio Bolsonaro antes da retomada do expediente presencial na Casa. "Obviamente que, antes disso, eu não vou me manifestar de forma mais contundente. Eu ainda não li o parecer da advocacia-geral. (...) Se os fatos não me convencerem, eu tenho prerrogativa para divergir e arquivar o pedido. Mas não podemos, em hipótese alguma, trabalhar de forma abstrata".

"Tudo isso só vai acontecer quando o Senado voltar de forma presencial. Um assunto como esse não pode ser tratado de forma remota, por reunião virtual."

Campos preferiu não emitir opinião direta sobre o tema, mas disse considerar que há, de fato, uma possibilidade de politização do pleito. "Talvez seja mais político do que técnico", disse ele, reforçando a ponderação: "Não vou fazer essa afirmativa antes de receber o parecer. Primeiro tenho que receber".

Membro do Conselho de Ética, o veterano Otto Alencar (PSD), que é aliado do PT na Bahia, concordou com a análise do colega quanto à necessidade de que a cassação seja debatida presencialmente. "Não vejo como fazer isso pelo sistema remoto."

Alencar declarou ainda que, segundo leitura preliminar dos fatos, o pedido da oposição não deve prosperar no conselho. "Me parece que essa questão envolvendo o Flávio não atinge o mandato dele. Ele não cometeu nenhum crime que pudesse levar à cassação do mandato. Se estão acusando, são fatos que se deram no ambiente da Alerj. Dentro do próprio mandato dele [como senador], não há fatos. Mas essa é uma visão preliminar."

O parlamentar do PSD disse que ainda gostaria de ler o teor das acusações para, dessa forma, formar uma opinião concreta. "Fiz uma leitura muito rápida disso. Preciso me aprofundar no tema."

Outras prioridades

Flávio também é favorecido pela a concorrência com temas que devem figurar entre as grandes prioridades do Senado no período pós-pandemia.

As principais são as reformas tributária e administrativa, que interessam tanto ao governo, sobretudo o ministro da Economia, Paulo Guedes, quanto aos presidentes das duas Casas do Parlamento, deputado Rodrigo Maia (DEM-RJ) e senador Davi Alcolumbre (DEM-AP).

Os congressistas devem acelerar os debates sobre as reformas assim que a comissão mista puder realizar reuniões presenciais.

O grupo, que reúne deputados e senadores, foi instalado formalmente em fevereiro, mas o avanço da pandemia e a espera pelo projeto do governo paralisaram os trabalhos. O texto do governo que diz respeito a mudanças no sistema tributário só foi entregue em julho.