Com rotina de ministro, Terra encarna bolsonarismo e faz sombra a Pazuello
Resumo da notícia
- Deputado que previu 2.100 mortes por covid-19 é contra isolamento social e a favor da cloroquina tem sido presença constante no Planalto
- Ex-ministro participou de 15 agendas com Bolsonaro -- 4 delas reservadas
- De maio até setembro, foram 9 compromissos, mesmo número de vezes em que presidente esteve com o ministro Pazuello (Saúde)
- Emedebista levou grupo batizado "Médicos pela Vida", defensores da cloroquina, para encontrar Bolsonaro
Chama atenção nos bastidores do Palácio do Planalto a presença constante de Osmar Terra, médico e deputado federal pelo MDB gaúcho, com o presidente Jair Bolsonaro. Visto como uma espécie de "ministro informal" desde que foi demitido da pasta da Cidadania, o parlamentar incorporou o discurso bolsonarista contra o isolamento social e em defesa da cloroquina no combate ao coronavírus.
Desde que deixou o governo, em fevereiro, o emedebista participou de 15 agendas com Bolsonaro (sem partido) no Planalto, das quais 4 foram encontros reservados entre os dois. De maio até setembro, foram nove compromissos, mesmo número de vezes em que o presidente esteve com Eduardo Pazuello, general que foi efetivado no comando do Ministério da Saúde após quatro meses como interino na função.
Durante a pandemia e as trocas de ministros, o nome do emedebista figurou mais de uma vez entre os cotados para liderar a pasta —principalmente após as quedas de Luiz Henrique Mandetta e Nelson Teich. Sem cargo oficial, coube ao congressista atuar nos bastidores e promover diálogo com os médicos "na ponta da linha" —termo frequentemente usado por Bolsonaro.
Em pelo menos três oportunidades, Terra intermediou conversas entre Bolsonaro e médicos para debater políticas de saúde e ações de enfrentamento ao coronavírus.
O parlamentar não só reuniu e deu papel político a um grupo de profissionais de saúde defensores da cloroquina, batizado "Médicos pela Vida", como os levou para encontrar Bolsonaro em Brasília. A agenda ocorreu em 8 de setembro.
Duas semanas antes, o deputado já havia ajudado a conceber o criticado evento "Brasil vencendo a covid". Com a presença do "Médicos pela Vida", a solenidade serviu para que fosse montado no Palácio do Planalto um palanque em apologia ao uso da cloroquina e da hidroxicloroquina —medicamentos que não têm eficiência comprovada no tratamento da covid-19.
Naquele dia, o país passou a marca de 115 mil mortes em decorrência da pandemia —hoje já são mais de 140 mil. Pazuello não participou do evento porque estava em viagem oficial ao Ceará.
Conselheiro
Interlocutores do presidente dizem que a relação de confiança entre Bolsonaro e Osmar Terra aumentou durante a pandemia pelo fato de o deputado, mesmo depois de ter sido demitido, ter sido um de seus principais aliados na defesa da cloroquina e na crítica a governadores e prefeitos pela adoção de medidas restritivas —como o isolamento social e, em alguns casos, o "lockdown" (interrupção total das atividades).
Após ter voltado a cogitar nomear o médico como ministro da Saúde, Bolsonaro teria sido convencido pela ala militar do Planalto a manter Pazuello no cargo. O general não tem formação em saúde, mas é visto internamente como um bom "gestor", com especialidade em logística.
Mesmo sem sentar na cadeira de ministro, Terra tem atuado como conselheiro do presidente quando o assunto é a covid-19 e já protagonizou declarações polêmicas desde o início da pandemia. Em abril, por exemplo, ele afirmou que o coronavírus mataria menos no Brasil do que a gripe no Rio Grande do Sul.
Em um áudio compartilhado entre apoiadores do presidente, em março, o deputado fez também projeções que não se confirmaram. "No Brasil a gente está estimando que possa chegar a 30 mil, 40 mil casos. E o número de mortos deve ficar em mil e poucos, 2.000", afirmou. Na ocasião, ele também fez uma previsão matemática. "Todas as epidemias duram em torno de 13 semanas e depois regridem, desaparecem".
A reportagem não conseguiu entrar em contato com o deputado Osmar Terra. Já o Ministério da Saúde e o Planalto foram procurados por meio de demandas enviadas às assessorias de comunicação, mas não se manifestaram até a publicação deste texto.
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