Topo

Com críticas a decisão de Fux, STF confirma ordem de prisão a André do Rap

Felipe Amorim, Alex Tajra e Lucas Borges Teixeira

Do UOL, em Brasília e em São Paulo

15/10/2020 14h56Atualizada em 15/10/2020 20h44

Em julgamento na tarde de hoje, o STF (Supremo Tribunal Federal) decidiu, por 9 votos a 1, manter a ordem de prisão contra André de Oliveira Macedo, o André do Rap, condenado por tráfico de drogas e apontado como um dos chefes do PCC (Primeiro Comando da Capital).

A maioria dos ministros votou para referendar a decisão do presidente do STF, Luiz Fux, que revogou a liminar do ministro Marco Aurélio Mello pela libertação de André do Rap e determinou a volta à cadeia do traficante condenado em segunda instância. Fux, porém, recebeu críticas dos colegas, que o acusaram de extrapolar os poderes de presidente da corte.

Considerado um dos maiores traficantes internacionais do país, André do Rap está foragido e não se entregou às autoridades após a ordem de soltura ser revogada por Fux.

Votaram a favor da prisão os ministros Luiz Fux, que disse que André do Rap debochou da Justiça, Alexandre de Moraes, Edson Fachin, Luís Roberto Barroso, Rosa Weber, Dias Toffoli, Cármen Lúcia, Ricardo Lewandowski e Gilmar Mendes. Com a aposentadoria de Celso de Mello, apenas dez ministros participaram do julgamento, iniciado na sessão de ontem.

O ministro Marco Aurélio, último a votar, foi contrário à decisão de Fux, com o argumento de que o presidente da corte não teria poderes para revogar a decisão de um ministro.

"Vossa excelência é um coordenador de iguais, devendo ser algodão entre cristais. Não pode atuar de forma trepidante, não pode ser em relação a seus iguais um censor, levando ao descrédito o próprio Judiciário", disse Marco Aurélio durante a sessão de hoje.

No final da sessão houve bate-boca, e Marco Aurélio acusou Fux de ter uma postura de "censor e autoritário".

Em defesa ante as críticas, Fux afirmou ter adotado a decisão por se tratar de um caso "excepcionalíssimo" e disse que seria prejudicial ao STF se ele não tivesse determinado a prisão do traficante.

"No caso específico, para mim, representaria autofagia não defender a imagem da corte do Supremo Tribunal Federal depois que lhe bateram à porta para anunciar que um traficante deste nível pudesse ser solto", disse Fux.

Além da liberdade de André do Rap, o STF também analisou a aplicação da regra do Código de Processo Penal (CPP) que fixa prazo de 90 dias para que as prisões preventivas sejam reavaliadas, sob pena de tornar a prisão ilegal. O dispositivo foi inserido no CPP no final do ano passado pelo projeto de lei do pacote anticrime.

Os ministros decidiram que o fim do prazo de 90 dias não implica na revogação automática da prisão preventiva. Foi este o argumento utilizado por Marco Aurélio para libertar André do Rap.

É esperado que o entendimento do STF sirva de parâmetro para situações semelhantes analisadas no Judiciário.

Presidente da corte sob questionamento

Nos votos, uma parte dos ministros questionou o poder do presidente do STF de cassar decisões de colegas da corte, mas apesar da oposição, a maioria dos ministros decidiu apoiar a decisão de Fux no caso em julgamento.

O ministro Ricardo Lewandowski divergiu da decisão de Fux por questões processuais e disse entender que o presidente do STF não teria o poder de revogar a decisão de Marco Aurélio. Mas, apesar de ressalvar essa posição, Lewandowski votou favoravelmente à ordem de prisão de André do Rap, com o argumento de que, por ter fugido, ele descumpriu os requisitos da decisão que o pôs em liberdade.

Gilmar Mendes também defendeu que o presidente da corte não possui esse poder, mas no caso concreto votou a favor da decisão de Fux. "Há um caso típico aqui de incompetência [ausência de atribuição] absoluta da presidência", disse Gilmar Mendes.

A ministra Cármen Lúcia afirmou que o presidente não tem o poder de revogar decisões de colegas e que, quando ela era presidente, negou seguimento a ações do tipo. No entanto, ela disse que iria fazer uma exceção ao próprio entendimento para apoiar a decisão de Fux devido às características específicas do caso em julgamento.

"A grande questão é que entre os ministros do Supremo não há hierarquia, e foi a compreensão de que não dispunha dessa competência que me levou, quando do exercício da presidência, a entender pelo não cabimento da suspensão de liminar", disse Cármen Lúcia.

O ministro Edson Fachin afirmou que a revogação de decisões de ministros pelo presidente do STF deve ser uma exceção, possível apenas para preservar a posição majoritária do tribunal, o que o ministro diz ter ocorrido nesse caso.

Entenda o caso

No último sábado, André deixou a penitenciária 2 de Presidente Venceslau, no interior de São Paulo, beneficiado pela decisão de Marco Aurélio que revogou a prisão preventiva do traficante a pedido da defesa do acusado.

A decisão de Marco Aurélio foi revogada por Fux ainda no sábado, sob o argumento de que a libertação poderia "violar gravemente a ordem pública". Segundo Fux, essa possibilidade autoriza o presidente do STF a rever decisões individuais de colegas da corte.

Os advogados de André do Rap dizem ter orientado seu cliente a cumprir a ordem do STF e se entregar às autoridades. Eles afirmam que a inocência de André será demonstrada no processo.

Sobre a decisão do STF, os defensores dizem que Marco Aurélio seguiu a legislação ao determinar a soltura de André. "A todos cabe cumprir a lei, independentemente de quem seja o beneficiado ou alcançado", afirmam, em nota, os advogados Anderson Domingues e Áureo Tupinambá.