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Deputado critica ex-reitor que contraiu covid-19: 'Moral de cuecas'

Hygino Vasconcellos

Colaboração para o UOL, em Chapecó (SC)

14/01/2021 18h02

O deputado federal Bibo Nunes (PSL-RS) afirmou que o ex-reitor da UFPel (Universidade Federal de Pelotas) e professor Pedro Hallal "prega moral de cuecas" por defender o isolamento social e ter contraído a covid-19. O comentário foi feito ao vivo na última segunda-feira (11) em um programa da Rádio Guaíba, ligada ao Grupo Record, com sede em Porto Alegre.

A afirmação do parlamentar ocorreu após o ex-reitor não responder como contraiu a doença, o que foi questionado pelo apresentador Júlio Ribeiro. "Essa é uma informação de cunho pessoal, que não é de interesse coletivo, muito menos seu. Mas muitas pessoas infelizmente perderam a vida, 200 mil pessoas perderam a vida, e infelizmente pela falta de uma política de enfrentamento. Se o Brasil ouvisse a ciência e tivesse uma política de enfrentamento da covid, teríamos muito menos mortes", disse Hallal.

Na sequência, Ribeiro afirmou que não havia como avaliar se o professor "seguiu a política de enfrentamento se foi infectado pela covid". O apresentador dispensou a participação do ex-reitor e, minutos depois, comparou a situação do professor com as solicitações feitas pela divulgação do resultado para a covid do presidente da República, Jair Bolsonaro (sem partido).

"Eu só fiquei curioso que a ala ideológica que o professor representa queria ver o teste de covid do presidente, queria saber tudo sobre a saúde do presidente, mas a dele é de foro íntimo", salientou o apresentador, sendo interrompido pelo político:

"É aquela velha história de pregar moral de cueca. Se ele não conseguiu se salvar, vai salvar quem?", disse o parlamentar.

Logo após, o apresentador voltou a falar e disse que o professor foi um dos "arautos do (movimento) fique em casa (para evitar a propagação do vírus)" e, mesmo assim, pegou a doença. Novamente, o político interrompeu. "Aí ele não pode falar o que ele fez, o que ele seguiu, que exemplo ele dá?"

Ribeiro tentou se justificar e explicou que questionou o professor "por curiosidade", acrescentando que "estamos todos perdidos". No começo do programa, Ribeiro ressaltou a proximidade pessoal com o parlamentar: "meu amigo de 30 anos, Bibo Nunes".

Procurado pelo UOL, o ex-reitor da UFPel reafirma que a informação é de cunho pessoal, mas explicou à reportagem que contraiu a doença de um familiar em sua própria casa.

"Não tenho obrigação de responder. Achei que no momento não era melhor entrar no mérito, e, se eu falasse, não iriam me deixar contar toda a história", diz. Em seguida, o professor explicou que a sua mulher foi a primeira pessoa a se infectar e que inicialmente não apresentou sintomas. "Dois dias depois, ela perdeu olfato e paladar, e eu passei a apresentar os sintomas também", conta.

Hallal critica a postura do apresentador e da própria rádio. "Não me deixaram sequer falar, jornalisticamente foi uma vergonha, eu nunca ataquei a mídia, acho que atacar a mídia é anti-democrático, mas foi uma postura triste (do apresentador), muito ruim para a rádio", explica o ex-reitor, que afirmou ter pedido para participar do programa como direito de resposta.

Defendido pelo ex-reitor, o isolamento social é uma das recomendações feitas pela OMS (Organização Mundial de Saúde) e por diversas autoridades mundiais para evitar a propagação do novo coronavírus.

Mudança da reitoria como pano de fundo

Os comentários sobre a maneira como Hallal contraiu a covid ocorreram nos minutos finais do programa - trecho que inclusive foi compartilhado por Bolsonaro em seu Twitter.

Entretanto, a maior parte do tempo de participação do ex-reitor serviu para o político criticar as manifestações do pesquisador sobre a sucessão no comando da universidade.

Como ocorreu em outras federais, Bolsonaro desconsiderou a opção da comunidade por Paulo Roberto Ferreira Júnior, que foi quem mais recebeu votos para reitor, e escolheu Isabela Fernandes Andrade. Porém, em 6 de janeiro, a professora decidiu chamar Paulo Roberto para participar da gestão. No site da universidade, Isabela consta como reitora e Ferreira como "assessor da reitoria (reitor eleito)".

No dia seguinte, Hallal fez uma manifestação em um evento interno da federal e disse que a universidade iria ter a "primeira dupla de reitores da história". "O reitor eleito e a reitora nomeada vão trabalhar lado a lado, tomando junto todas as decisões sobre o futuro da UFPel. Nas formaturas, os estudantes terão a presença dos dois, nas reuniões com entidades, com prefeitos, a UFPel também será representada por uma dupla de reitores."

Na mesma oportunidade, o pesquisador criticou Bolsonaro. "O presidente jamais terá sossego aqui na UFPel, será marcado como um ato de resistência histórica. Aqui não. O senhor (Bolsonaro) não manda absolutamente nada na UFPel, saiba disso hoje como eu disse inúmeras vezes. O senhor não manda nada na Universidade Federal de Pelotas, quem manda na UFPel é a nossa comunidade, o senhor é desprezível."

Em 8 de janeiro, Nunes publicou um vídeo, criticou a "dupla de reitores" da UFPel e disse que estava ocorrendo "desobediência civil". Além disso, chamou Hallal de "desequilibrado mental e emocionado" e que estava "incentivando o desrespeito à lei". "Esse rei de araque aí de Pelotas diz que manda, que faz o que quer", complementou o político.

O parlamentar disse que Hallal queria ser "reitor na marra" e que iria ser pró-reitor de gestão na universidade. Porém, o nome de Hallal não consta mais na relação da gestão da universidade.

"Esse cidadão não pode estar à frente de nada", afirmou Nunes, visivelmente irritado. Na sequência, ela alegou que se arrependeu de ter indicado Isabela e a chamou de "panaca", antes de classificar o ex-reitor de "esquerdopata", "anarquista", patife, "déspota tupiniquim" e "fora da lei".

O ex-reitor soube da manifestação do deputado e, no mesmo dia, também fez um vídeo. Nele, chama o político de "deputadozinho que ninguém conhece" e diz que "nunca tinha ouvido falar" dele. Na sequência, observou que a nova reitora se recusou a receber o parlamentar "de tão insignificante que ele é".

Ex-reitor acredita que UFPel não terá dois reitores

Na última segunda-feira, as declarações de Hallal feitas em 6 de janeiro foram reprisadas. O ex-reitor foi questionado pelo apresentador se confirmava o que tinha dito, Hallal classificou como "críticas normais" e solicitou que as declarações de Nunes também fossem veiculadas, o que não foi atendido.

No programa, o ex-reitor esclareceu que não haverá dois reitores na UFPel. "Não existe possibilidade legal de nomear dois reitores. Quem conhece a universidade, sabe que só tem um CD1 (código do cargo), que é atribuído ao reitor, o que nós estamos fazendo é uma decisão política, de tratar um assessor ou pró-reitor, que é o cargo que o professor Paulo vai ocupar com status de reitor. E não tem nenhuma ilegalidade nisso. É importante que isso fique claro", complementou.

Nunes prometeu que pedirá o afastamento do professor do cargo com base no estatuto do servidor público, além de ameaçar processá-lo.