'Não posso aceitar uma lei da ditadura', diz preso por faixa anti-Bolsonaro
Arquidones Bites foi mais um manifestante contrário ao presidente Jair Bolsonaro (sem partido) a ser detido com base na Lei de Segurança Nacional. A detenção do professor e secretário estadual de movimentos populares do PT de Goiás ganhou repercussão nacional na última segunda-feira (31), mas repete uma situação que tem se tornado recorrente.
O professor foi detido por colocar no capô de seu carro uma faixa com os dizeres "Fora Bolsonaro genocida". O policial militar que o prendeu alegou que ele infringia a LSN (Lei de Segurança Nacional), mas Bites acabou liberado pelo delegado da Polícia Federal.
O caso se soma ao do youtuber Felipe Neto, ao do ex-candidato a prefeito de São Paulo pelo PSOL Guilherme Boulos, ao de críticos do presidente que foram intimadas após se manifestarem no Twitter e ao de Rodrigo Pilha.
Pilha, diferente dos outros, não foi liberado e está preso há mais de dois meses pela Lei Antiterrorismo por pendurar uma faixa onde se lia "Bolsonaro genocida".
O professor acredita que o uso cada vez mais recorrente de leis como a LSN e a Lei Antiterrorismo indicam que o país está passando por "um momento de arbitrariedade que não pode continuar".
Eu não sou advogado, sou professor, eu sou leigo nessa parte jurídica, mas a Constituição é a lei maior do país. Eu não posso aceitar que uma lei feita antes [de 1988] possa prevalecer. Por isso a LSN para mim é uma lei que não deveria existir mais."
Arquidones Bites
Instituída em 1983, no período da ditadura, a Lei de Segurança Nacional tem sido alvo de debates. No dia 4 de maio, a Câmara dos Deputados aprovou por 343 votos a 75 um projeto de lei que revoga a LSN e tipifica o que vem sendo chamado de "crimes contra o Estado democrático de direito".
O texto proposto pela deputada e relatora Margarete Coelho (PP-PI) é um substitutivo do pl 2.462 de 1991. Ele propõe penas para crimes contra a honra de presidentes no poder, mas também inclui assuntos como disparo de notícias falsas em tempos de eleição.
A detenção do início da semana não intimidou Bites, que perdeu seu irmão mais novo e uma sobrinha para a covid-19, mas segue fazendo duras críticas a Bolsonaro: "Ele brincou com o povo brasileiro, com uma doença tão grave".
Ele não tem culpa do vírus, mas tem de não ter providenciado a vacina e de não fazer o que ele deveria ter feito como presidente da República. Essa irresponsabilidade fez com que eu mantivesse a minha manifestação individual. Além das questões coletivas, eu fui atingido, a minha família foi atingida com isso."
Arquidones Bites
Manifestação individual
Há cerca de dois meses, Bites colocou a faixa no veículo durante uma carreata de servidores públicos em Goiânia e decidiu mantê-la por cerca de um mês, até a próxima lavagem. "Além da manifestação coletiva, nós temos as nossas manifestações individuais que nós temos que colocar para a sociedade", defendeu.
No último dia 29, resolveu colocá-la novamente para participar da manifestação nacional contra Bolsonaro e, mais uma vez, a manteve no carro. Desta vez, no entanto, foi diferente.
Na segunda-feira (31), Bites emprestou seu carro para a sua namorada ir ao salão de beleza, na cidade de Trindade, a pouco menos de 30 km de Goiânia. O veículo, com a faixa no capô, estava estacionado quando chamou a atenção de policiais militares.
Os oficiais abordaram Andreia Saraiva dentro do estabelecimento e deram o ultimato: "Você vai ter que tirar a faixa ou eu vou prender você e o carro". Ela então ligou para Bites que estava por perto e a encontrou no local.
"Eu já cheguei filmando, pensei que ia inibi-los, mas mesmo assim não inibiu muito". Os policiais repetiram a exigência, mas Bites se negou a retirar a faixa, defendendo que era seu direito se manifestar.
Professor foi detido e relata agressões
O que se seguiu foi o que Bites chamou de arbitrariedade. Ele conta que foi agredido com uma rasteira, dois chutes e socos. Uma pessoa que estava na rua, filmou a violência, seguindo pedido do próprio professor. (Veja vídeo a seguir). Ainda na segunda-feira, a reportagem do UOL procurou a PM de Goiás para comentar o caso, mas não conseguiu contato.
Dali, foi conduzido ao hospital para fazer um exame de corpo de delito, antes mesmo de passar pela delegacia. Ele conta que se sentiu constrangido por chegar algemado ao local.
Fui vereador por dois mandatos, sou sindicalista, sou conhecido na cidade. Imagine eu chegar algemado em um hospital cheio de gente. O que foi minha alternativa? Gritar para as pessoas que eu não sou bandido, que estava sendo preso pela faixa."
Arquidones Bites
Posteriormente, foi conduzido para a Superintendência da Polícia Federal, em Goiânia. Lá, o policial militar além de relatar a suposta infração da LSN, disse também que teria sido vítima de desacato, o que Bites nega:
"Não é verdade, tanto é que eu estou desafiando ele a achar qualquer vídeo de desacato, eles estavam filmando também. Em todo momento eu fui muito respeitoso", diz Bites, liberado após o delegado da PF ter entendido que não houve transgressão criminal.
O policial militar que prendeu Arquidones foi afastado das ruas e passará por investigação. O governador do estado, Ronaldo Caiado (DEM), declarou que não aceita abuso de autoridade e que "ninguém está autorizado a agir acima da lei".
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