Delegado da PF sobre Salles: 'atuação claríssima' em favor de madeireiros
O ex-superintendente da Polícia Federal no Amazonas, delegado Alexandre Saraiva afirmou na noite de hoje que a atuação do ministro do Meio Ambiente, Ricardo Salles, em favor de madeireiros é "claríssima e inédita" no Brasil.
Saraiva foi retirado da superintendência pelo governo após enviar, em meados de abril, uma notícia-crime ao STF (Supremo Tribunal Federal) contra Salles e o senador Telmário Mota (Pros-RR).
"Sim [foi a primeira vez que um ministro me pressionou em favor de madeireiros]. E isso, eu posso dizer com tranquilidade porque foi gerado um vídeo por ele mesmo em que ele confessava o que estava fazendo. Então, a atuação dele é claríssima e inédita. Isso aí, fora de dúvida. Isso [a pressão de ministro] nunca aconteceu [comigo]", disse o delegado, durante entrevista ao programa "Roda Viva", da TV Cultura.
Na época da notícia-crime, Saraiva —que apontou os crimes de obstrução de investigação ambiental, advocacia administrativa e organização criminosa— disse que Salles e o senador estavam dificultando ações de fiscalização contra madeireiros.
O delegado apontou que Salles integra uma "organização criminosa orquestrada por madeireiros alvos da Operação Handroanthus com o objetivo de obter, direta ou indiretamente, vantagem de qualquer natureza".
Operação e desenrolar
A Operação Handroanthus foi realizada no fim de dezembro de 2020 e se tornou a maior da história ao apreender mais de 131 mil metros cúbicos de madeira — equivalente a 43,7 mil toras — na divisa do Pará com o Amazonas.
Em abril, antes do envio da notícia-crime, falando à Folha de S.Paulo, Salles disse que a Polícia Federal não poderia fazer uma "demonização" do setor madeireiro, sob o risco de aumentar o desmatamento ilegal.
"O que me parece é que as informações [dos empresários afetados pela operação] são bastante coerentes de não haver a propagada ilegalidade", afirmou o ministro do Meio Ambiente.
Antes, Saraiva, também em entrevista para a Folha de S.Paulo, afirmou que toda a madeira apreendida na operação era fruto de ação criminosa e fez críticas ao ministro Salles.
"As empresas têm mais de duas dezenas de autuações no Ibama (Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis). É uma organização criminosa", declarou.
Ao enviar a notícia-crime, Saraiva citou entrevistas de Salles com falas contra a operação e disse que a postura do ministro demonstra "predileção injustificada a pouco mais de uma dezena de investigados".
Após a repercussão da notícia-crime enviada, Saraiva disse, em entrevista à GloboNews, que Salles promove a defesa de infratores e que o ministro tentou interferir nos trabalhos da PF por meio do Ibama.
Já no fim do mês, com Saraiva já fora da superintendência, em entrevista para a RedeTV!, Salles acusou Saraiva de estar "querendo aparecer com essa situação toda". "Eu estou sempre ao lado da lei", afirmou o ministro.
Operação contra Salles
Salles foi alvo da Operação Akuanduba, deflagrada pela PF, que apura crimes contra a administração pública praticados por agentes públicos e empresários do ramo madeireiro.
"As investigações foram iniciadas em janeiro deste ano a partir de informações obtidas junto a autoridades estrangeiras noticiando possível desvio de conduta de servidores públicos brasileiros no processo de exportação de madeira", disse, na época, a PF.
O ministro Alexandre Moraes, do STF, ao autorizar a realização da operação, determinou o afastamento do presidente do Ibama, Eduardo Bim, do cargo, além de outros nove agentes públicos do instituto e do Ministério do Meio Ambiente.
Participação ao lado de Bolsonaro em live
Em novembro do ano passado, Saraiva participou de uma transmissão ao vivo realizada ao lado presidente Jair Bolsonaro (sem partido). Na ocasião, Bolsonaro fez menção a governo de países europeus que queriam rastrear a origem de produtos brasileiros. Saraiva concordou com as críticas de Bolsonaro.
Durante o "Roda Viva", o delegado foi questionado pelos jornalistas se considerava um erro ter participado dessa transmissão.
"Eu acho que foi um grande acerto. uma grande oportunidade de divulgar o que está acontecendo, informar a alguém que toma as decisões. E foi muito produtivo. O que eu falei lá, eu sustento. Eu digo sempre: 'a verdade é fácil de ser sustentada'. Quem tem a verdade, não precisa ter boa memória".
"O que eu disse [na live]: 'que é uma hipocrisia muito grande de países europeus'. Sempre foi consenso que o mercado consumidor tem um impacto enorme na demanda por madeira legal", completou.
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