Advogado da Precisa se cala sobre Covaxin, irrita CPI e vira investigado
Advogado da Precisa Medicamentos no caso Covaxin, Túlio Silveira negou ter participado das negociações da empresa para a compra da vacina indiana Covaxin pelo Ministério da Saúde e disse somente ter ajudado na defesa dos contratos, sem convencer a cúpula da CPI da Covid.
Até o começo da tarde, Silveira havia rejeitado dar esclarecimentos na maioria das perguntas formuladas pela Comissão Parlamentar de Inquérito. O advogado irritou os parlamentares pela postura irredutível e ouviu do relator do colegiado, Renan Calheiros (MDB-AL), que o seu silêncio seria "incriminador".
Diante da atitude e outras justificativas, Calheiros informou que Silveira passou para a condição de investigado pela CPI. Mais cedo, o relator anunciou que o líder do governo da Câmara, Ricardo Barros (PP-PR), também passaria a ser investigado.
A irritação dos senadores com Silveira foi tanta também que, por volta das 12h39, a sessão foi suspensa pelo presidente da CPI, Omar Aziz (PSD-AM). Silveira havia acabado de se recusar a responder mais uma pergunta de Calheiros dizendo: "Excelência, com todo o respeito, permanecerei em silêncio".
Aziz então rebateu: "Prefiro que o senhor me desrespeite e me responda, mas acabe com essa conversa de 'com todo o respeito', porque isso aí é falta de respeito. O senhor falar em respeito é uma falta de respeito para a gente. O senhor pode me desrespeitar, mas responda às perguntas. Vou suspender a sessão por 30 minutos. Vamos comer agora e depois a gente conversa. Eu vou tomar algumas providências".
Membros do grupo chegaram a sugerir a Omar Aziz que procurasse o STF (Supremo Tribunal Federal) para que a Corte delimitasse os limites de direito fundamental concedido ao depoente.
Silveira compareceu hoje à CPI protegido por um habeas corpus assinado pelo ministro Luiz Fux, que acatou parcialmente o pleito da defesa. O advogado foi autorizado a se calar nas indagações que, em tese, teriam potencial para "incriminá-lo", pois ele já é considerado personagem sob investigação no âmbito do inquérito.
Fux recusou, por outro lado, pedido para que Silveira pudesse ficar em silêncio com base nas regras da OAB (Ordem dos Advogados do Brasil), sob pena de cometimento do crime de violação do sigilo profissional. Na abertura da CPI, hoje, a defesa pediu aos parlamentares para que ponderassem este fato, o que foi imediatamente negado pelo presidente Aziz.
A sessão foi retomada às 14h, com Silveira respondendo a poucas perguntas, ora alegando o direito ao silêncio ou sigilo profissional.
Senadores reclamaram constantemente que o silêncio de Silveira estaria em desacordo com a liminar de Fux, pois o depoente optou por se calar em questionamentos teoricamente desconectados do princípio da autoincriminação. Até o começo da tarde, alheio à irritação dos congressistas, o defensor da Precisa Medicamentos se manteve firme na postura.
"Exercerei o meu direito inalienável ao silêncio, pois estou aqui na condição de investigado, haja vista as medidas cautelares que foram imputadas contra mim —meu sigilo telemático e meu sigilo telefônico foram quebrados por esta CPI; vários ofícios foram encaminhados às entidades correspondentes. Por essa razão, me encontro de fato como investigado", justificou-se.
"De outro turno, respeitarei as prerrogativas da advocacia. Fui contratado como advogado, sou advogado da Precisa Medicamentos e permanecerei em silêncio em homenagem ao direito inalienável ao sigilo cliente-advogado", completou ele, apesar de o pleito referente ao "sigilo profissional" ter sido negado pelo ministro Luiz Fux.
Antes de se calar, Silveira confirmou que atuava em favor da Precisa Medicamentos na condição de "advogado [contratado] da companhia", mas que não seria funcionário da empresa, isto é, com vínculo empregatício. Também concordou em responder indagações referentes ao seu escritório, local de trabalho, entre outros pontos.
Porém, no momento em que o relator abordou a participação do depoente nas tratativas entre a Precisa e o Ministério da Saúde para compra de vacinas, o advogado recuou e disse que exerceria o direito ao silêncio.
"Eu não participo de negociações, mas eu assisto a companhia na relação jurídica que tem de advogado. Então, eu exerço a defesa nos contratos que a companhia possui."
"Excelência, a respeito dessa questão de atuação, eu entendo que já parte para a própria questão do sigilo profissional, eu vou me manter em silêncio."
O vice-presidente da CPI, Randolfe Rodrigues (Rede-AP), questionou Túlio o motivo pelo qual, se era somente advogado da Precisa, foi apresentado como responsável por parcerias internacionais e compliance da empresa em ata de 20 de novembro de 2020 do Ministério da Saúde e como gerente de contratos da companhia em audiência pública do Senado em 23 de março de 2021.
Silveira argumentou ter havido um engano em ambas as situações. Sobre a audiência no Senado transmitido ao vivo, por exemplo, o advogado afirmou que não havia fornecido a informação de que seria gerente de contratos da Precisa. Randolfe disse, porém, que a TV Senado lhe informou que os dados são checados com quem é convidado.
Intermediária da Covaxin
A Precisa atuou como intermediária na negociação entre o governo brasileiro e o laboratório indiano Bharat Biotech para a compra de 20 milhões de doses da vacina Covaxin, ao custo de R$ 1,6 bilhão. O contrato, assinado em fevereiro e suspenso meses depois, é alvo de suspeitas investigadas pela Comissão Parlamentar de Inquérito e pelo MPF (Ministério Público Federal).
Silveira foi identificado ao colegiado como representante legal da Precisa na intermediação para a aquisição da Covaxin pelo Ministério da Saúde.
O depoente é cobrado a explicar as circunstâncias da participação da Precisa, as suspeitas de tráfico de influência dentro do Ministério da Saúde e a celeridade do acordo —que avançou à assinatura contratual em apenas três meses (entre novembro de 2020 e fevereiro de 2021).
À época, o imunizante não possuía sequer testes clínicos de fase 3 (considerada a última etapa do processo regulatório) e não havia qualquer garantia de que a importação seria autorizada pela Anvisa (Agência Nacional de Vigilância Sanitário). Mesmo assim, o governo do presidente Jair Bolsonaro (sem partido) aceitou todas as condições impostas e chegou a liberar créditos orçamentários (por meio de nota de empenho) para efetivar o negócio.
O acordo acabou não saindo do papel depois que o Ministério da Saúde não conseguiu aval para importação junto à Anvisa. Paralelamente, a Precisa não conseguiu dar andamento aos trâmites burocráticos, e os prazos de entrega foram desrespeitados. A última pá de cal veio com a denúncia dos irmãos Luis Miranda e Luis Ricardo Miranda, este último funcionário da área técnica do ministério.
O servidor relatou ao irmão, deputado federal, ter sofrido pressão interna para acelerar as tratativas de importação à revelia de inconsistências contratuais que haviam sido detectadas pelo setor do qual ele é chefe. O deputado disse então ter levado os fatos ao conhecimento de Bolsonaro, em suposto encontro ocorrido em 20 de março no Palácio da Alvorada. Até hoje, o presidente não se posicionou claramente a respeito da informação.
Segundo Miranda, no encontro de 20 de março, Bolsonaro teria sinalizado ciência de um esquema de irregularidades dentro da pasta da Saúde e dito que "isso" era "coisa do fulano" —em referência ao líder do governo e ex-ministro da Saúde, Ricardo Barros. Ele nega ter cometido qualquer crime.
A partir das informações prestadas pelos irmãos Miranda, a CPI começou a investigar não só a possibilidade de falhas contratuais e tráfico de influência em relação ao caso Covaxin, mas também a de que algum ato de corrupção possa ter ocorrido em favor da Precisa Medicamentos e de terceiros.
Para amanhã está previsto o depoimento do sócio-administrador da Precisa, Francisco Maximiano, que já teve a fala à CPI adiada por algumas vezes a contragosto da maioria dos senadores.
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